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“A gente quer comida, diversão e lazer”

Uma das praças abandonadas pelo poder público na Maré fica na Vila dos Pinheiros; em vez de crianças, lixo - Foto: Matheus Affonso

Campos de futebol, praças e parquinhos sofrem com falta de manutenção na Maré

Maré de Notícias #126 – julho de 2021

Por Hélio Euclides

A Constituição Cidadã de 1988, em seu artigo 6º, assegura o direito ao lazer para todos os cidadãos brasileiros, enquanto o artigo 217º menciona que o poder público incentivará o lazer como forma de promoção social. Porém, andando por praças nas favelas, é comum ver balanços sem as cadeirinhas, escorregas sem degraus e gangorras com madeiras quebradas. São brinquedos que ficam ao relento, expostos ao  sol e à chuva e, por isso, precisam de manutenção constante – algo que não ocorre em todas as áreas da cidade.

Dandaiana de Freitas mora em frente ao parquinho da ciclovia do Conjuntos Pinheiros, na Maré, alvo de promessas de uma grande obra de recuperação. É nessa pracinha que ela leva sua filha de quatro anos para brincar. “Pena que está abandonada. A última vez que o lugar recebeu brinquedos novos foi há mais de quatro anos. Desde então, há bastante lixo espalhado, brinquedos quebrados, lâmpadas queimadas e muitos espaços inutilizados”, desabafa. 

Ela e o marido botaram a mão na massa para melhorar as condições do parquinho. Onde não tinha mais balanço, utilizaram cordas novas e pneu para fazer um novo. “É um ambiente muito bom para as crianças brincarem porque é espaçoso e fechado. Mas a Prefeitura não manda nem limpar. Na minha opinião, é preciso reconstruir mesmo. Dá para colocar mais brinquedos e fazer uma jardinagem. Tudo bem elaborado”, conta. Dandaiana e outros frequentadores varrem o lugar para diminuir a quantidade de folhas e de lixo.

Apesar da degradação, o ambiente reúne famílias e acabou virando um lugar onde as mães se encontram e se tornam amigas. Dandaiana conheceu no local Gracinete Souza, moradora da Vila do João, que também tem uma filha de quatro anos. A pequena brinca no espaço desde quando tinha seis meses de vida. “Todas as crianças adoram o parquinho, porque é um bom espaço, dá para correr e aprender a andar de bicicleta, skate e patinete. Hoje o que vejo é balanço, gangorra e escorrega quebrados. Nossas crianças merecem uma praça decente, com mais brinquedos”, reivindica.

Outra coisa de que Gracinete reclama é a presença de lixo. Ela cortou o dedo em um dos mutirões de limpeza do espaço. “Nunca vi uma boa limpeza. Deveria ter lixeiras no local. Em meio a pandemia, eu e mais duas mães varremos a área. O grande perigo é que tem muitas garrafas quebradas. Nós precisamos de uma área de lazer limpa para os pequenos poderem curtir a infância”.

 Há 23 anos, a Escolinha do Mário funciona no campo de futebol localizado na ciclovia do Conjunto Pinheiros. São 250 crianças, de cinco a 12 anos, que se encontram nas tardes das terças e quintas e nas manhãs de sábados para aprenderem futebol. “Eu colocaria o dobro de crianças se o campo estivesse melhor. É preciso reformar alambrado, baliza, além de melhorar a coleta de lixo e a limpeza do valão, para diminuir o cheiro ruim. No campo de barro colocamos areia nos buracos para amenizar os desníveis”, denuncia Mário Alves, professor e treinador de futebol.

Favelas diferentes, problemas semelhantes

Do outro lado da Maré, em Marcílio Dias, os dois parquinhos da favela estão com brinquedos quebrados. As áreas precisam ser revitalizadas, tanto na praça da entrada da comunidade quanto na que fica próximo ao campo de futebol, que está com o alambrado caindo. Adriane Gerônimo, moradora de Marcílio Dias, tem uma filha que utiliza os brinquedos das praças na favela. Para ela, as pracinhas seriam melhores se a Prefeitura fizesse sempre manutenção e os moradores conservassem o espaço. 

Muitos moradores têm no futebol a única atividade de lazer na favela. E é no campo onde estão muitos dos problemas de manutenção, como os postes dos refletores, que estão rachados e com ferros expostos, podendo causar acidentes sérios. “Faz oito anos que foram colocados, sem reforma. O alambrado eu fiz remendo, mas já não adianta, a ferrugem tomou conta”, revela José Carlos, responsável pela administração do campo de futebol local. Para amenizar a situação, ele construiu os vestiários sem a ajuda dos órgãos competentes. Mesmo com todo o esforço, quando chove fica impossível jogar, pois falta o nivelamento e não há drenagem adequada. 

A situação precária dos balanços que ficam amarrados para não machucarem as crianças – Foto: Matheus Affonso

Preservar e ampliar o lazer no território

Carlos Alberto, mais conhecido como Carlinhos, gerente executivo local da 30ª Região Administrativa, avalia que há poucas áreas de lazer na Maré. “Falta balanço, gangorra, escorrega, pois lazer não é só campo de futebol. Como pode em Rubens Vaz não ter uma praça, ou no Parque União ter apenas um pequeno espaço de lazer? A Maré precisa também de mais academia para idosos”. 

Entre campos de futebol, quadras, praças e parquinhos, são 41 equipamentos de lazer na Maré. ”Seja na Zona Sul ou aqui na Maré, as áreas de lazer se deterioram, mas não se pode dizer que o povo destrói: é o uso. O problema é que lá se reforma de um dia para o outro e aqui, não”, conclui. O gerente deve buscar parcerias com instituições e associações de moradores para achar soluções, como aconteceu em Bento Ribeiro Dantas. O local, que era ponto de descarte de lixo, se transformou em uma pracinha com brinquedos por meio de uma parceria com uma empresa de contêineres. Isso pode acontecer na revitalização do Parque Ecológico, obra que Carlinhos afirma ser prioridade.

Lazer é direito de todos

Segundo a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb), há sempre planejamento e execução de serviços de revitalização e reparo em brinquedos e mobiliário urbano nas praças e espaços de lazer da cidade. Em relação especificamente à Maré, este ano a companhia fez a revitalização na Praça da Rua Sargento Silva Nunes, na Nova Holanda, no campo de futebol que fica na Rua Celso de Maia Fonseca, no Conjunto Esperança, e no campo de futebol localizado na Via B-Nove, na Vila dos Pinheiros. Pelo cronograma, acontecerão algumas intervenções da Comlurb em outros espaços de lazer na Maré, mas não foi divulgado o prazo para que isso aconteça. A empresa também ressalta que os garis comunitários realizam regularmente a limpeza em todas as praças da região.

A Secretaria Municipal de Esportes e Lazer esclareceu que não tem o mapeamento dos equipamentos esportivos da Maré, mas garantiu saber que existem diversos projetos em muitas das comunidades da Maré. A Secretaria Municipal de Urbanismo e Cartografia do Instituto Pereira Passos informou não ter um mapeamento específico sobre os equipamentos de lazer da Maré.

A Secretaria Especial da Juventude Carioca (JUVRio) declarou que mantém projetos como o Favela Inova, o Fala Juventude e o curso “Promover para Prevenir”; além disso, deve divulgar em breve um novo programa. A Secretaria Municipal de Cultura informou que há mais de R$ 54 milhões no orçamento para projetos culturais, sendo que os patrocínios acima de R$ 500 mil terão, pela primeira vez, que reservar 20% de vagas para projetos do subúrbio. 

Em Marcílio Dias a praça foi tomada por carros. Moradores utilizam o espaço para estacionar veículos, impedindo o uso – Foto: Matheus Affonso
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