Carnaval faz movimentar, e muito, a economia da cidade
Jorge Melo, com Hélio Euclides e Elisângela Leite
A marchinha “Me dá um dinheiro aí”, sucesso do carnaval de 1959, na voz de Moacyr Franco, está mais atual que nunca. A falta de dinheiro é o grande tema do carnaval de 2018 no Rio de Janeiro. Todas as grandes escolas, com exceção da Unidos de Vila Isabel, cortaram orçamentos e vão realizar um carnaval “mais econômico”. O enredo da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, por exemplo, é “Com Dinheiro ou Sem dinheiro eu Brinco”. A sinopse do enredo diz, entre outras coisas, que “mesmo ‘com o bolso furado’, que ‘o sapato aperte’, que a ‘corda esteja no pescoço’, em qualquer esquina que junte gente irmanada, em qualquer batuque de mesa de bar, em qualquer palma de mão, em qualquer ‘Iaiá, Iaiá’, em qualquer pé descalço que sambe, vive o carnaval e a liberdade de minha gente”.
Carnaval de sustento
Mais que samba no pé e bloco na rua, o Carnaval é um evento que movimenta a economia da cidade do Rio de Janeiro. Muita gente espera ansiosamente pelo Rei Momo: do gerente do hotel cinco estrelas ao ambulante que vende cerveja na rua, com a sua caixa de isopor. Não existem números oficiais sobre a potência econômica do carnaval carioca. O levantamento mais recente é de 2011. Foi feito por Luís Carlos Prestes Filho e indicou que o carnaval carioca gera 250 mil empregos, diretos e indiretos. Mas, com a crise, esse número pode diminuir um pouco, mas continua alto. O Grêmio Recreativo Escola de Samba Boca de Siri, da Maré, é um exemplo dos tempos difíceis. Segundo o carnavalesco Eduardo Pinho, “o projeto de carnaval foi mudado em função da falta de dinheiro e a opção foi reaproveitar peças antigas. A equipe foi reduzida. No ateliê da Escola estão trabalhando quatro pessoas e três no barracão. “Em tempos normais, teríamos pelo menos o dobro, mas vamos fazer um carnaval criativo.” Cada trabalhador do ateliê ou barracão ganha de1.000 a 1.500 reais por mês, num período que varia de três a quatro meses. Jorge Luiz Albuquerque Carneiro, diretor de carnaval da Boca de Siri, também reclama: “até os diretores da Escola estão ajudando no barracão, para cobrir a mão de obra que não podemos pagar e dar conta do prazo”. Segundo Jorge, esse ano tem menos gente trabalhando no carnaval. “No nosso grupo todas as escolas vivem a mesma situação, imagine, são 14 escolas, quantos empregos a menos?”
O comércio da Maré no Carnaval
Com crise ou sem crise, na Maré, o carnaval costuma ser bom para o comércio, principalmente para quem vende fantasias, as infantis são as que mais saem. Máscaras e adereços também são muito procurados. As lojas que investem no carnaval são muitas, difícil saber quantas. E de diferentes ramos de comércio, de loja de brinquedos e utilidades domésticas a lojas de roupas. A Beatriz Modas, da Vila do Pinheiro, é um bom exemplo: o proprietário, Sérgio Baroni, ao contrário da maioria dos comerciantes da cidade, está otimista com o carnaval: “espero vender pelo menos 20% a mais que o movimento normal”. Sérgio, que é comerciante na Maré há mais de 20 anos, tem outra loja na mesma rua, especializada em Moda Feminina, que já está vendendo camisetas e shorts com motivos carnavalescos “O diferencial é a qualidade, eu prefiro ter um lucro menor, mas oferecer um produto bom a um preço acessível ao meu cliente, isso faz ele voltar.” Baroni vai contratar dois funcionários temporários para as duas semanas que antecedem o Carnaval e já investiu num estoque de fantasias, para adultos e crianças; máscaras, acessórios e também bermudas e camisetas. “Estou me baseando no movimento do Natal, que foi muito bom, quase 30% a mais que nos meses normais”.
Rogéria Alves da Silva, dona do já tradicional Armarinho da Rogéria, na Vila do Pinheiro, não é tão otimista quanto Baroni “No Natal eu vendi 20% a menos que em 2016 e o Natal é sempre uma base para o carnaval, mas mesmo assim investi; não gosto quando o cliente chega e não encontra um artigo que ele sabe que eu vendo”.
Em Ramos, o carnaval promete
O carnaval oferece oportunidades para empreendedores de todos os tamanhos. Lauro Luís, de 37 anos, mais conhecido como Magrinho do Pastel está animado com as possibilidades do carnaval de 2018. Funcionário de uma grande rede de farmácias e trabalhando à noite, há cinco anos completa a renda vendendo pastéis. Até o ano passado era ambulante e vendeu uma média de 200 pastéis em cada dia de carnaval, no Piscinão de Ramos. Ele conta: “a minha expectativa é boa, não estou vendo essa crise toda”. Esse ano Magrinho conseguiu montar uma barraca e espera vender, em média, 400 pastéis a cada dia de carnaval. “Meu pastel é bom e barato, vou vender também uns salgadinhos e refrigerantes”. Com a expansão do negócio, no carnaval, ele vai contar com o apoio da mulher, Eloá Firmino, que cuida da fritura; e de um ajudante. “Assim eu posso circular com o isopor e aumentar as vendas; eu acho que esse carnaval vai ser muito bom”.
Os números da folia
A Riotur espera, esse ano, um milhão e 500 mil turistas, 400 mil a mais que no ano passado; e 3,5 bilhões de reais injetados na economia carioca. Mas nem tudo é confete e serpentina no carnaval carioca. Em agosto de 2017, o prefeito Marcelo Crivella anunciou um corte de 50% na subvenção de 26 milhões que a Prefeitura dava às escolas de samba do Grupo Especial. Em outubro, fiscais da Delegacia Regional do Trabalho interditaram os barracões das escolas do Grupo Especial, na cidade do Samba, na Gamboa, onde são confeccionadas alegorias, adereços e parte das fantasias. Segundo os fiscais, as condições de trabalho e instalações eram precárias. As escolas reclamaram, mas fizeram os ajustes. No entanto, só na terceira semana de novembro os primeiros barracões foram liberados. Com os barracões interditados os trabalhadores temporários ficaram parados e não foram feitas contratações. Essa foi a primeira baixa no número de empregos gerados pelo carnaval carioca.
Um carnaval sem ensaios técnicos
Uma das consequências do corte do subsídio da Prefeitura às escolas foi a suspensão dos ensaios técnicos das escolas do Grupo Especial, que eram custeados pela LIESA. A decisão desagradou os sambistas. Os ensaios técnicos funcionam como um uma prévia do desfile, com todos os componentes, bateria completa e coreografias, faltando apenas as fantasias e os carros alegóricos. Além do mais, os ensaios no Sambódromo são abertos ao público, que gratuitamente pode sentir o clima da sua Escola e do samba-enredo. Muitas afirmam até que, no ensaio técnico, os componentes estão mais relaxados, se divertem e acabam por fazer um desfile até melhor que o oficial. A suspensão dos ensaios técnicos foi outra baixa no número de empregos temporários oferecidos durante o carnaval.
Blocos e Carnaval de Rua
O carnaval carioca não é apenas escola de samba. Fora do Sambódromo existe um mundo de blocos, bailes e eventos que também contribuem para fazer a alegria do folião e o dinheiro girar. Nos últimos 20 anos, os blocos foram, aos poucos, retomando uma antiga tradição da cidade, o Carnaval de Rua. Nos tempos antigos, esses blocos eram chamados de Blocos de Sujo; mas nos dias de hoje, de sujos não têm nada. Em pouco tempo viraram uma febre. Segundo a Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro, os blocos vão atrair mais de seis milhões de pessoas para as ruas da cidade. Mas não existem dados sobre quanto dinheiro esses foliões movimentam. O certo é que cada bloco funciona como uma pequena empresa, com administração, pessoal de apoio, músicos contratados e até equipe de segurança. No Rio de Janeiro, existem 464 blocos oficiais e mais um número desconhecido de blocos independentes ou não oficiais. Oportunidade não falta para os ambulantes!