Estudo analisa o impacto da ‘guerra às drogas’ no desempenho escolar das crianças cariocas da rede municipal
Alunos de 5º ano do ensino fundamental que vivenciaram 6 ou mais operações policiais neste mesmo ano tiveram uma redução no aprendizado esperado de, aproximadamente, 64% em língua portuguesa e, em matemática, perderam todo o aprendizado que deveriam absorver no ano letivo
Por Redação, 07/02/2022 às 10h05.
Chamando atenção para o início do ano letivo no município, no próximo dia 7 de fevereiro, o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) lança a pesquisa inédita “Tiros no Futuro: Impactos da guerra às drogas na rede municipal de Educação do Rio de Janeiro”, com foco nos efeitos da guerra às drogas nos resultados escolares dos estudantes do ensino fundamental da rede pública carioca, a partir da relação entre confrontos da polícia com grupos que controlam o varejo das drogas em áreas pobres da cidade, principalmente nas favelas.
“Tiros no Futuro” trata-se da segunda etapa do projeto “Drogas: Quanto Custa Proibir”, cujo objetivo é incorporar ao debate público uma reflexão sobre os impactos econômicos e orçamentários da legislação proibicionista em quatro áreas específicas: Segurança e Justiça, Educação, Saúde, e Território. A primeira fase foi lançada em março de 2021 com o relatório “Um Tiro no Pé: Impactos da proibição das drogas no orçamento do sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro e São Paulo”, que apresentou o custo de R$5,2 bilhões para manter a política proibicionista em um ano nos dois estados.
“A consequência da guerra às drogas na vida de uma pessoa é incalculável. Nosso propósito com este projeto é mostrar que, além do custo orçamentário para o Estado, há o efeito individual na vida do cidadão, o quanto sua capacidade futura de geração de renda e sua mobilidade social podem ser comprometidas como consequência dessa opção política racista e classista operada pelo Estado. Esse prejuízo afeta o futuro do indivíduo e a sociedade como um todo. E todos perdemos nessa guerra”, afirma a socióloga Julita Lemgruber, coordenadora do CESeC.
Por meio de convênio firmado com a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro (SME/RJ), a pesquisa avaliou os dados das 1.577 unidades de ensino da rede pública carioca, com um total de 641.534 alunos matriculados em 2019, ano de referência para os levantamentos apontados por anteceder a pandemia da Covid-19, que alterou a dinâmica escolar do país. Importante destacar que o estudo foca nos dados da cidade do Rio de Janeiro, devido ao cenário único em território nacional: a frequência de operações policiais, tiroteios e disparos de armas de fogo no cotidiano de certos territórios, inclusive próximos a unidades de ensino.
Com a intersecção das informações sobre operações policiais que interferiram na rotina das escolas – como suspensão das aulas ou fechamento da unidade – levantadas junto à SME/RJ e os dados da plataforma interativa Fogo Cruzado, que registra ocorrências de violência armada na região metropolitana do Rio, foi possível georreferenciar e comparar 32 escolas com pelo menos seis operações policiais em 2019 e 37 que não experienciaram essas ocorrências neste ano. Foi considerada a similaridade entre os dois grupos em: indicador de complexidade da gestão; perfil socioeconômico das famílias; proporção de pais com alta escolaridade; proporção de alunos não-brancos e proporção de educandos do sexo masculino. A única diferença entre ambos os grupos foi a exposição a eventos violentos, como as operações policiais.
Em 2019, o Fogo Cruzado registrou 4.346 tiroteios na cidade do Rio de Janeiro, que resultaram em 569 mortos e 658 feridos. A partir destes dados, foi possível identificar 1.154 (74%) unidades da rede municipal de ensino fundamental do Rio que foram afetadas por pelo menos um tiroteio com a presença de agentes de segurança pública. O estudo aponta que, em média, as 30 escolas do 5º ano do primeiro ciclo do fundamental mais expostas à violência registraram 19 tiroteios com presença do Estado neste período.
Número de escolas afetadas por tiroteios com a presença de agentes de segurança, segundo o Fogo Cruzado e os relatos de diretores – 2019
Fogo Cruzado | Relatos de diretores | |||
Quantidade de tiroteios/operações policiais | Número de escolas afetadas | % | Número de escolas afetadas | % |
1 a 5 | 463 | 40,1 | 205 | 61,7 |
6 a 10 | 200 | 17,3 | 68 | 20,5 |
11 a 15 | 145 | 12,6 | 30 | 9,0 |
16 a 20 | 114 | 9,9 | 13 | 4,0 |
21 ou mais | 232 | 20,1 | 16 | 4,8 |
Total | 1.154 | 100,0 | 332 | 100,0 |
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do Fogo Cruzado e da SME/RJ
Além disso, apenas cinco escolas do primeiro ciclo do ensino fundamental concentram 20 ou mais operações policiais no seu entorno. E quanto mais expostas a violência, mais negro é o perfil dos alunos (77%). Ou seja, é a estrutura do racismo que legitima o terror e sua intensidade nos bairros mais pobres, nas favelas e em suas proximidades.
O relatório também analisa a proficiência dos alunos nos dois grupos de escolas, levando em conta o aprendizado em língua portuguesa e matemática. Usando dados da SME/RJ e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o material revela que estudantes do 5º ano de instituições com entorno violento, que registraram 6 ou mais ocorrências de operações policiais, têm uma redução média de 7,2 pontos no desempenho em língua portuguesa e 9,2 em matemática. Considerando o ganho médio anual de proficiência esperado, a exposição à violência resulta em uma perda de 64% do aprendizado esperado em língua portuguesa e, em matemática, a perda é de todo o aprendizado que o aluno deveria adquirir nessa etapa de ensino.
As ocorrências apresentadas em “Tiros no Futuro” dizem respeito apenas aos alunos do 5º ano do ensino fundamental público municipal em 2019, composto por 65,2% de educandos negros, devido a: menos lacunas no histórico escolar da criança e menor índice de abandono nos anos iniciais de aprendizagem.
Nesse sentido, quando colocadas as médias de reprovação e abandono das unidades de ensino em comparação, conclui-se que: A exposição frequente a tiroteios com a presença de agentes de segurança pode gerar um aumento de 2,09% na taxa de reprovação e de 46,4% na probabilidade de ao menos um de seus alunos ter abandonado a escola.
Os custos da guerra às drogas para o futuro das crianças de hoje
O material traz os custos monetários médios para os impactos da exposição a eventos violentos no entorno das escolas na renda futura dessas pessoas. O trabalhador da cidade do Rio de Janeiro pode deixar de ganhar R$24.698,00 em decorrência da redução de aprendizado em português e matemática causada pela exposição à violência. Este valor seria equivalente a um “imposto” de 4% a ser pago pelo indivíduo sobre os rendimentos de toda a sua vida produtiva.
“Tiros no Futuro” ainda apresenta a implicação dessa perda financeira para um indivíduo em posição de vulnerabilidade social: deixar de ganhar R$24 mil em 2019 significa deixar de adquirir 48 cestas básicas ou 337 botijões de gás. É também deixar de pagar 6.098 passagens de ônibus no município do Rio de Janeiro, o que possibilitaria o deslocamento com duas viagens diárias de segunda a sexta-feira por cerca de 13 anos de trabalho.
É importante ressaltar que esse número é baseado apenas nos resultados da proficiência acadêmica. “Por exemplo, esse jovem, ao concorrer a uma vaga no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), já está em desvantagem em relação aos outros alunos também do ensino público, pelo fato de ter sua aprendizagem comprometida pela guerra às drogas desde sua infância. Essa diferença se perpetua pela vida produtiva do cidadão, reduzindo sua oportunidade de geração de renda. Estamos falando da manutenção da desigualdade e estagnação de mobilidade social como reflexos diretos da ação do Estado”, pondera Julita Lemgruber.
“Tiros no Futuro” demonstra que a sequela da guerra às drogas na educação é apenas uma das faces da política de drogas, que expõe determinado setor da população – de maioria negra e pobre – a um cenário bélico cujos únicos resultados têm sido desperdício de dinheiro público, que poderia ser investido em políticas de promoção à vida.
Metodologia
A estratégia para mensurar os efeitos da violência decorrentes da guerra às drogas sobre o desempenho acadêmico consistiu, inicialmente, no emprego de modelos de regressão multinível com a utilização de algumas variáveis de controle e a comparação de dois grupos de estudantes do ensino fundamental – um exposto e outro não – a episódios de disparos de arma de fogo com participação de agentes de segurança e operações policiais no entorno da escola.
As análises estimam as consequências dessa violência na proficiência na Prova Brasil 2019 e na reprovação e no abandono dos alunos cursando 5º e 9º anos do ensino fundamental da rede pública municipal da cidade do Rio de Janeiro. Com base nos resultados obtidos, estimou-se adicionalmente o impacto dessa violência em termos de perda econômica futura para as crianças de hoje, considerando-se o rendimento do trabalho que seria obtido ao longo da vida produtiva, dos 16 aos 65 anos de idade.
Para mais informações sobre o projeto “Drogas: Quanto Custa Proibir”, clique aqui.
Sobre o CESeC
Fundado em 2000, o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) desenvolve pesquisas e outros projetos nas áreas de segurança pública, justiça e política de drogas, tendo como compromisso a promoção dos direitos humanos e a luta contra o racismo no sistema de justiça criminal brasileiro.
Falta de manutenção e fiscalização aumento risco de incêndios
Em 2021, duas ocorrências envolvendo fogo ocorridas no intervalo de 2 meses em equipamentos públicos de educação na Maré acenderam o alerta para cuidados essenciais
Por Hélio Euclides, em 04/02/2022 às 12h31. Editado por Tamyres Matos
A situação dos prédios públicos demanda vigilância constante, seja no Rio de Janeiro ou especificamente no Conjunto de Favelas da Maré. Em setembro de 2021, o fogo tomou conta da Creche Municipal Pescador Albano Rosa, na Vila dos Pinheiros. Os profissionais da educação foram rápidos e evacuaram o espaço a tempo, sem que ninguém ficasse ferido. Logo depois, em novembro, foi a vez da cozinha da Escola Municipal IV Centenário, na Baixa do Sapateiro. Ambos prédios de responsabilidade da Prefeitura do Rio, ambos equipamentos que atendem crianças.
Rafael Lima, presidente do coletivo Maré Solidária e bombeiro civil, defende que, assim como nos centros comerciais, o território mareense deveria ter uma equipe voltada especificamente aos riscos de incêndios nos prédios públicos, o que possibilitaria também uma fiscalização mais rigorosa. “É preciso que a população se mobilize e faça requerimento de uma brigada civil, pois a Maré merece pelo número de unidades escolares existentes”, conclui. A Maré conta com 50 escolas públicas, sendo 46 municipais e quatro estaduais, que oferecem da creche ao ensino médio.
Em junho de 2020, a Escola Municipal Clotilde Guimarães, que funciona na Avenida Brasil, também teve parte da biblioteca e do almoxarifado queimados. Para Gustavo Aveiro Lins, professor, doutor em meio ambiente, biólogo, engenheiro ambiental e de segurança do Trabalho, não necessariamente uma equipe solucionaria o problema de incêndios nas escolas da Maré. “Existe uma norma do Corpo de Bombeiros que determina brigada privada de incêndio na edificação. Logicamente dependendo da atividade e área construída. É preciso estudar cada incêndio, os motivos são diversos e específicos para cada caso”, avalia.

Gustavo explica que é comum que esses prédios não atendam às normas do Corpo de Bombeiros no que se refere ao projeto de combate a incêndio. Ele acredita que a população, em caso de dúvida, pode solicitar o Certificado de Aprovação da edificação. Esse documento comprova que a edificação cumpriu as exigências impostas pela legislação. “Caso não tenha, denuncie no Corpo de Bombeiros mais próximo ou na Diretoria Geral de Serviços Técnicos (DGST). Acho importante destacar que a segurança é obrigação de todos, os gestores da edificação devem se adequar às exigências e os usuários devem cobrar e ter uma postura segura”, finaliza.
A Secretaria Municipal de Educação informou que no caso da Creche Pescador Albano Rosa foi feita a sondagem no terreno e que o contrato está sendo ajustado para retomada com previsão de conclusão ainda neste ano. Já na EM IV Centenário as obras de preservação e reparo estão em andamento. Na Escola Clotilde Guimarães, a recuperação do telhado e das salas planejadas pela direção está prevista para começar em fevereiro. Por fim, a secretaria garantiu em nota que segue acompanhando as condições de cada unidade escolar e realizando as intervenções necessárias para garantir a boa conservação das mesmas.

Falta de reparos pode ter consequências graves
O estado de alerta e a preocupação com a falta de manutenção e fiscalização adequadas, além da precariedade dos investimentos, vale para o Rio de Janeiro inteiro. Em dezembro do ano passado, um relatório do Corpo de Bombeiros apontou que 19 dos 21 hospitais públicos que funcionam na Região Metropolitana do Rio não estavam preparados para enfrentar incêndios. De acordo com o RJ2, que teve acesso ao documento por meio da Lei de Acesso à Informação, entre as unidades irregulares, estava o próprio hospital dos Bombeiros.
A falta de cuidados e do cumprimento de requisitos mínimos de segurança colocam em risco a vida das pessoas e a preservação de bens essenciais. Em maio de 2021, uma ala do Hospital Federal de Ipanema com pacientes em recuperação após contaminação por covid-19 pegou fogo. Eles foram transferidos às pressas e não houve feridos. Em outubro de 2020, as consequências alcançaram a gravidade extrema: um incêndio provocou a morte de 16 pacientes do Hospital Federal de Bonsucesso. Em 2018, o fogo destruiu parte do Hospital Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca. Três pacientes morreram quando foram transferidos de unidade.
Em um episódio que marcou para sempre a história do Rio e do Brasil, o Museu Nacional, que fica na Quinta da Boa Vista, teve grande parte dos seus 20 milhões de artigos destruídos, após um curto-circuito em ar-condicionado. Em setembro de 2018, à época do incêndio, o local não tinha laudo de vistoria do Corpo de Bombeiros, sofria com má conservação dos equipamentos elétricos e falha no sistema de proteção contra incêndio. A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) segue na luta para alcançar a verba necessária para a restauração do Palácio de São Cristóvão, cuja reabertura está prevista para 2026. Mas muitas das perdas são irreparáveis.

Cuidados caseiros para evitar tragédias
Os cuidados com uma casa ou apartamento vão mais além do que escolher bons tijolos e a qualidade do cimento. A parte elétrica é de suma importância. Uma falha pode ocasionar um incêndio. Por isso, ao adquirir um imóvel, é preciso perguntar ao antigo proprietário se já foi trocada a fiação e quanto tempo tem as instalações. O segundo passo é não usar fio ou material de má qualidade. Sem esquecer de chamar um profissional habilitado para realizar a reforma.
Almir Júnior, morador da Vila dos Pinheiros, é eletricista desde 1988 e sabe bem o que é necessário para evitar aborrecimentos futuros. “É necessário fazer inspeções nas instalações verificando disjuntores e eliminar emendas. Nas tomadas de uso geral, normalmente se usa o fio de 2.5 mm. O micro-ondas, pode ser ligado o fio 2.5mm, mas precisa ter um disjuntor só para ele. O ar condicionado também deve ter um circuito independente. Já a fiação do chuveiro comum de 4kw, deve-se usar fios de 6.0mm”, explica.

“Os grandes vilões de uma casa são os benjamins e extensões. Deve-se procurar colocar tomadas duplas. Outro mal são os adaptadores para tomadas de 10 amperes que são as de pinos mais finos, mas que deveriam ser ligados em tomadas de padrão 20A. Se a fiação não foi feita para suportar a carga vai derreter a tomada e terá risco”, destaca. O eletricista ainda lembra atenção com as crianças, para não colocarem a tomada de ferros de passar roupas na tomada e esquecer ligados próximo de panos. Também ressalta que fogões elétricos a base de resistências só podem ser ligados em potência adequada, por isso é importante ler as recomendações da embalagem.
Gilmar Junior, presidente da Associação de Moradores da Nova Holanda, orienta que moradores troquem a rede elétrica antiga para evitar curto no ar-condicionado. “Se acontecer um incêndio na casa, deve sair de casa, pedir ajuda dos vizinhos mais próximos e ligar para o Corpo dos Bombeiros”, resume.
Testes e vacinas – a luta da Maré contra a covid-19
Por Jorge Melo (*) em 03/02/2022 às 17h
Em janeiro, 40% dos testes de covid-19 realizados nas sete unidades de saúde que ficam na Maré (Clínicas da Família e Centros Municipais de Saúde) tiveram resultado positivo. Foram 22.084 pessoas testadas sendo que 8883 delas, estavam com covid-19.
Testes por unidades de Saúde:
1.574 testes com resultado positivo na CF Adib Jatene – Vila dos Pinheiros
1.513 testes com resultado positivo na CF Augusto Boal -Baixa do Sapateiro/Morro do Timbau
1.211 testes com resultado positivo na CF Diniz Batista – Parque União
1.072 t testes com resultado positivo na CF Jeremias Moraes da Silva – Nova Holanda
925 p testes com resultado positivo na CMS Américo Veloso – Praia de Ramos
344 testes com resultado positivo na CMS João Cândido – Marcílio Dias
2.194 testes com resultado positivo na CMS Vila do João
Total: 8883 testes com resultado positivo. Foram realizados 22.084 testes
Vacinação e tendência de queda
A segunda semana epidemiológica, termo usado pela Coordenação Geral de Atenção Primária (CAP 3.1), responsável pela Maré, de 9 a 15 de janeiro, concentrou 52,6% dos casos positivos. O que aponta para uma tendência de queda, segundo os técnicos. Na segunda quinzena do mês, o número de testes positivos girou em torno de 25%. Mesmo assim, a Maré se mantém sem óbitos desde outubro de 2021.
Leonardo Bastos, estatístico e pesquisador-associado do Programa de Computação Científica da Fiocruz, destaca a importância do esforço de testagem em massa que está sendo realizado no Rio de Janeiro e, particularmente, na Maré, como uma das principais ferramentas de combate à expansão do vírus, “a testagem é muito importante e deve ser acompanhada de medidas adequadas para cuidar da pessoa infectada e proteger seus contatos.”
Por conta do projeto Conexão Saúde – De Olho na Covid, parceria entre a Fiocruz, Prefeitura do Rio de Janeiro e Redes da Maré, foi aberto mais um posto de testagem, na quarta-feira, dois de fevereiro. O posto vai funcionar no CIEP Gustavo Capanema, na Vila dos Pinheiros, com capacidade para testar 400 pessoas por dia. Segundo Hermano Castro, pesquisador da Fiocruz e um dos coordenadores do Conexão Saúde – De Olho na Covid, “Nesse momento da pandemia, com a nova variante Ômicron a testagem passa a ser a melhor forma de conhecer a transmissão do vírus e garantir medidas sanitárias de distanciamento e quarentenas capazes de diminuir a velocidade da contaminação.” Segundo Castro com o novo posto de testagem na Maré será possível atender diariamente 1200 pessoas.
A proteção nos casos de infecção
A cidade do Rio de Janeiro tem 87,7% da população com a primeira dose; 82,4% com a segunda dose. E 35,4% com a dose de reforço. Segundo Leonardo Bastos, “A vacinação certamente evitou muitas internações e óbitos. Se não houvesse vacina e uma boa cobertura vacinal, com essa onda da Ômicron estaríamos lidando com um desastre sem proporções. Ainda segundo Bastos, a Ômicron deixou bem claro o importante papel da dose de reforço. “a taxa de hospitalização de não vacinados ou pessoas com esquema vacinal incompleto é bem maior que a taxa de hospitalização de pessoas com esquema completo e com dose de reforço.”
Leonardo Bastos, no entanto, faz um alerta, lembrando que é essencial manter os cuidados básicos de proteção: o uso de máscara, a higienização das mãos com álcool gel ou lavando com água e sabão; e o distanciamento social, “a vacinação está nos protegendo contra a hospitalização e óbitos mas, mas não nos protege da infecção e, em muitos casos, nem da doença, quando há o aparecimento de sintomas. E para os vacinados, por pior que a gente fique, dificilmente vamos precisar de um tratamento mais sério, com o uso de oxigênio ou precisar de UTI.”
Vacinação infantil
No dia 31 a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro suspendeu a vacinação de crianças de sete anos ou mais por falta de doses. Até o fechamento desta reportagem não havia informações oficiais sobre a retomada. A Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS) aguarda novas remessas de imunizantes do Ministério da Saúde. No momento, estão disponíveis apenas doses para crianças com comorbidades, entre 5 e 11 anos. De acordo com a SMS, devem chegar 100 mil doses da CoronaVac nos próximos dias.
De acordo com Leonardo Bastos, “as crianças quando comparadas com os adultos e idosos praticamente não evoluem para casos graves. No entanto, mesmo numa proporção bem menor algumas crianças infectadas evoluem para quadros mais graves. E se comparamos no grupo das crianças com covid é a principal causa de hospitalização e óbitos entre as doenças que podem ser evitáveis por vacina, logo a vacinação chegando para as crianças esperamos que esse quadro mude de forma significativa.”
(*) Essa matéria teve a participação de estudantes universitários vinculados ao projeto de extensão Laboratório Conexão UFRJ, uma parceria entre o Maré de Notícias e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Fundo do poço
Por Alexandre dos Santos em 02/02/22 às 14h.
Moïse Kabagambe foi assassinado com requintes de crueldade e covardia no quiosque onde trabalhava. Foi torturado e deixado amarrado chão porque seus assassinos têm certeza (ou a impressão) de que o crime pode passar impune. Afinal, Moïse era preto, pobre e imigrante vindo de um continente que só aparece nos noticiários como sinônimo de tudo o que há de negativo: pobreza, corrupção, fome, golpes de Estado, violência, terrorismo etc.
Esse crime revela muito do que estamos nos tornando. A morte de Moïse, executada sem aparente remorso, mostra como chegamos ao fundo do poço. E como sempre damos um jeito de descer mais um degrau na nossa própria desumanização.
O filósofo Thomas Hobbes defendeu, no século XVIII, que são as leis, as regras sociais, o respeito à vida (mesmo que imposto pelo Estado) que impedem que nos exterminemos. Ele chamou essa situação limite e hipotética de “estado de natureza”, onde, sem qualquer regra social o homem seria “o lobo do próprio homem”, afundando na própria violência e insensatez.
Estamos nos esforçando pra chegar lá. Insensíveis e mergulhados numa espiral de violência. Uma violência racista que vem de longe. Desde as argumentações religiosas do século XV para justificar a escravização até as argumentações iluministas e de que os povos do continente africano seriam pagãos, sem história, incivilizados e sem intelecto porque estavam em um estágio inferior no desenvolvimento da humanidade (“comprovado” pelo darwinismo social). “Metade demônio, metade criança”, como escreveu Rudyard Kipling em “O Fardo do Homem Branco”, reflexo de toda a arrogância da branquitude europeia neocolonial. Pura construção da narrativa e da imagem da pessoa negra como inferior, como lembra a doutora Rosane Borges (@_rosaneborges ).
O assassinato de Moïse – e de todas as pessoas negras – escancara a presença dessas imagens do passado alimentando o racismo de hoje. É o “racismo estrutural” que o doutor Silvio Almeida (@silviolual ) tanto discute.
A morte de Moïse – e todas as mortes violentas nesse Brasil racista e xenófobo – é a morte da nossa humanidade.
Alexandre dos Santos é jornalista e professor de História do Continente Africano no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio.
Mais um polo de testagem é inaugurado na Maré
O Ciep Gustavo Capanema, na Vila dos Pinheiros, recebe testagem em massa contra Covid. A iniciativa é da Fiocruz, da Redes da Maré, do projeto Conexão Saúde – De Olho na Covid e da Prefeitura do Rio.
Aline Câmera (Agência Fiocruz de Notícias) em 02/02/22 ás 10h. Editado por Daniele Moura.
Quase dois anos após o início da pandemia de Covid-19, a rápida disseminação da variante Ômicron trouxe novos desafios para o Sistema Único de Saúde (SUS). Ao contrário dos primeiros meses da emergência sanitária, quando havia elevada taxa de mortalidade e o mundo presenciou uma corrida por respiradores mecânicos e leitos para tratamento dos casos de alta complexidade, atualmente os esforços se concentram na atenção primária. Na maior parte das vezes, a nova variante tem gerado casos de Covid-19 sem necessidade de hospitalização.
Diante deste novo cenário, a testagem se apresenta como um direito básico da população, além de ferramenta essencial para a vigilância e controle da epidemia. Por isso, a Fiocruz uniu esforços com a Prefeitura do Rio de Janeiro e o projeto Conexão Saúde – De Olho na Covid em mais uma iniciativa inovadora de enfrentamento da pandemia com a abertura de polos itinerantes de testagem em Manguinhos e na Maré, com atendimento para os sintomáticos sendo garantidos por telemedicina, de forma a facilitar o acesso à assistência e reduzir a demanda da população na rede de atenção primária de saúde.
De acordo com os coordenadores do projeto de testagem, o aumento do número de casos se apresenta como um problema de proporções gravíssimas, pois pode produzir um colapso principalmente a atenção primária, diferentemente do que ocorreu nas primeiras ondas da Covid-19, quando o sistema hospitalar foi o mais atingido. É de fundamental importância o desenvolvimento de estratégias de proteção ao sistema em sua base, que se encontra numa etapa de reorganização diante dos impactos produzidos.
Além de apoiar a estratégia da gestão municipal, as plataformas digitais incorporadas ao projeto permitirão ampliar o acesso à saúde, gerando o desenvolvimento de respostas rápidas e eficazes às demandas da população local e aliviando a procura nas unidades de pronto atendimento (UPAs), clínicas da família e outras emergências.
“Com a chegada da Ômicron e o aumento do número de casos de covid-19, a Secretaria Municipal de Saúde ampliou sua capacidade de testagem em 48 vezes. Isso foi e está sendo possível graças a parcerias como essa que estamos fazendo com a Fiocruz, para a abertura de mais centros de atendimento e testagem. Neste momento da pandemia, é importante que as pessoas com sintomas sejam testadas e mantenham o isolamento, para evitar transmitir a doença para outros”, diz o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz.
O serviço, já em funcionamento em Manguinhos, acontece de segunda à sexta-feira, das 8h às 16h, e aos sábados, das 8h às 12h, no Centro Comunitário de Defesa da Cidadania (Rua Leopoldo Bulhões, Nº 952 – CCDC) em caráter permanente e, na Escola Estadual Compositor Luiz Carlos da Vila (Avenida Dom Helder Câmara, 1184, Benfica), de forma itinerante até o próximo sábado (29), com o apoio do Governo do Estado do Rio de Janeiro.
O novo polo de testagem da Maré fica no Ciep Gustavo Capanema, na Via A1, S/N, Vila os Pinheiros e funciona a partir de hoje das 8h às 16h de segunda a sexta, e das 8h às 12h aos sábados. Não é necessário realizar agendamento prévio, apenas levar o documento de identificação. A testagem é gratuita.
Com capacidade diária é para testar 400 pessoas. A iniciativa possibilitará a implementação de um modelo de processamento de informações robusto, subsidiando o monitoramento da situação epidemiológica em tempo real e a execução de mapas de riscos dentro das respectivas comunidades. “Nesse momento da pandemia, com a nova variante Ômicron, a testagem passa a ser a melhor forma de conhecer a transmissão do vírus, garantir medidas sanitárias, distanciamento social e quarentena capazes de diminuir a velocidade da contaminação. Aliada à testagem, o avanço da vacinação nas crianças pode nos ajudar a vencer a pandemia”, destaca Hermano Castro, um dos pesquisadores da Fiocruz envolvidos na coordenação da iniciativa.
O projeto reforça a importância das tecnologias sociais no território, contando com apoio das lideranças comunitárias, fundamental para a melhor comunicação sobre o impacto da pandemia nas populações de periferias e favelas. “Os polos de testagem podem ser a diferença entre a vida e morte de muitas pessoas. A ideia que prevalece no Conselho Comunitário de Manguinhos e na Redes da Maré é que o projeto assuma uma perspectiva efetivamente participativa, ampliando assim seu alcance e resultados”, enfatiza André Lima, do Conselho Comunitário de Manguinhos.
As bases do projeto
Os territórios de Maré e Manguinhos, que juntos somam cerca de 180 mil moradores, sediam diversas ações de mobilização social que vêm sendo implementadas desde junho do ano passado por meio do projeto Conexão Saúde – De Olho na Covid. Além da Fiocruz, SAS Brasil, Redes da Maré, Dados do Bem, Conselho Comunitário de Manguinhos e União Rio integram a iniciativa. A partir desta experiência, que hoje é referência no combate à pandemia em favelas, já foram realizados mais de 44 mil testes diagnósticos (entre sorologia e PCR) na Maré e 6.528 em Manguinhos; 1.552 consultas de telessaúde; e, na Maré, o apoio para o isolamento domiciliar de 1.383 mil famílias com pessoas que testaram positivo para Covid – além de múltiplas ações de comunicação territorial.
O impacto foi sentido antes de completar o seu primeiro ano de implantação, com uma redução significativa da mortalidade. Apenas na Maré, a queda da letalidade, em novembro de 2021, chegou a 87%. Esse legado ganhou um importante aliado meses depois. Em julho, a Fiocruz iniciou um estudo para mapear o impacto da vacinação da Covid-19 em sua população. Além da efetividade da vacina propriamente dita, outros aspectos da doença seguem em andamento como a dinâmica de transmissão do vírus no território e a vigilância genômica de suas variantes.

• Endereço permanente na Maré:
CIEP Ministro Gustavo Capanema
Via A1 s/nº, na Vila dos Pinheiros, de segunda a sexta-feira, das 8h às 16h, e aos sábados, das 8h às 12h;
Galpão Ritma
Rua Teixeira Ribeiro, 521, Nova Holanda, de segunda a sexta-feira, das 9h às 16h
• Endereço permanente em Manguinhos:
Centro Comunitário de Defesa da Cidadania
(Rua Leopoldo Bulhões, Nº 952 – CCDC), de segunda a sexta-feira, das 8h às 16h, e aos sábados, das 8h às 12h.
Os moradores que testarem positivo poderão também marcar o atendimento médico online do SAS Brasil pelo número (21) 99271-0554, de segunda a sexta (das 8h às 19h30), e no sábado (8h às 14h).