Dois lados da mesma moeda

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Leilah Landim

Convidamos duas pessoas com atuações diferentes para responderem as mesmas perguntas. A primeira a responder é Leilah Landim. Doutorado e pós-doutorado em Antropologia Social. Professora na Escola de Serviço Social, onde vem trabalhando mais recentemente com a temática de grupos e organizações em áreas periféricas à cidade do Rio de Janeiro – como a Baixada Fluminense – com ênfase nas mobilizações de reação à violência do Estado, como a reação a situações de chacina.

1) Historicamente, que importância teve a organização da sociedade civil em movimentos sociais?

Os movimentos sociais são diversificados em suas formas de organização, sujeitos, ideários, objetivos e rituais públicos. Estamos falando aqui de ações coletivas no campo das transformações participativas e democráticas contra as desigualdades, pela justiça social, que contemplem interesses das classes populares, nas bases da sociedade. Isso inclui questões culturais e de identidade, como o racismo, o gênero, a etnia e outros.

2) Quais as conquistas desses movimentos?

Mobilizações deixam rastros. As transformações sociais são lentas e contraditórias. Por exemplo, nada será como antes após as manifestações contra o impeachment, contra as catracas, contra a violência e pela paz na Maré. Creio ser evidente que houve conquistas significativas em áreas, por exemplo, como direitos das mulheres, dos LGBTs, das políticas relacionadas à questão racial e de ideias e atitudes na sociedade em relação a esses segmentos e seus interesses, nos últimos trinta anos.

3) Como é a relação entre o Estado e os movimentos sociais hoje em dia? Viramos um País intolerante? Como sair dessa condição?

A sociedade brasileira, de feitio historicamente autoritário, hierárquico e patrimonialista, com mais de 400 anos de mão de obra escrava e industrialização tardia, não foi propícia ao surgimento de amplos movimentos sociais ou da construção de uma sociedade civil forte e organizada. No entanto, não faltaram ao longo do tempo revoltas e reações à dominação e à exploração. A história das lutas de escravos e negros, desde os quilombos até o movimento abolicionista, é um exemplo disso. Nesse caso, como em tantos outros e já chegando aos tempos atuais, a estratégia das forças dominantes sempre é a de ilegitimar, criminalizar ou, simplesmente, abafar e não dar visibilidade aos movimentos sociais e suas conquistas. O pior é que, em grande medida, essa dominação é interiorizada por gente que há algum momento participa de movimentos sociais. Faz-se uma forte mobilização; consegue-se um resultado; e há depoimentos de participantes de que isso se deve a um político tal, a um juiz tal… A afirmação de suas conquistas, mesmo que parciais e ambíguas, deveria ser uma direção afirmada pelos movimentos.

Convidamos duas pessoas com atuações diferentes para responderem às mesmas perguntas

 

Anna Carolina Costa

Quem responde aqui é Anna Carolina Costa, militante socialista e feminista, organizada pelo #MAIS, professora de História da Rede estadual do Rio de Janeiro. Tenho 37 anos e me incorporei às causas sociais quando era estudante secundarista, do Colégio Pedro II. Sou mãe e, desde que meus meninos nasceram, o feminismo e a luta pela superação da sociedade capitalista ganharam novos significados pra mim! Carrego meus filhos pras ruas, pra aprendermos, juntos, que lutar é uma condição fundamental àqueles que não se conformam com a barbárie do capital.

1) Historicamente, que importância teve a organização da sociedade civil em movimentos sociais?

O fim da escravidão aqui no Brasil foi fruto de muita luta social dos negros e negras que, aquilombados, encorajavam seu povo a serem protagonistas de sua própria história. Em nosso País, não há um direito social ou político que não tenha sido fruto de mobilizações e lutas sociais dos trabalhadores e trabalhadoras.

2) Quais as conquistas desses movimentos?

A campanha pelas Diretas já, lá atrás, quando vivíamos o fim da ditadura militar. Lembrar deste momento histórico é bom, porque exigir a realização de eleições gerais e diretas por meio de uma grande greve geral no País, é também uma das principais pautas dos movimentos sociais no Brasil hoje!

3) Como é a relação entre o Estado e os movimentos sociais hoje em dia? Viramos um País intolerante? Como sair dessa condição?

Na história brasileira há um traço fundamental e que permanece, que é a existência de um Estado autoritário, repressor. Os movimentos sociais são criminalizados no Brasil. Se tornou uma prática, lamentável, absurda, inadmissível, que as manifestações de rua invariavelmente tenham presos políticos. Eu vejo a polarização ideológica e política que, hoje, são características do cenário brasileiro, como parte de um crescente conservadorismo no cenário mundial. Então, entendo que a resposta a essa intolerância é a organização destes setores oprimidos para combater, com lutas sociais, este modelo de sociedade hipócrita, moralista, que está apodrecida. Eu acho fundamental que os movimentos sociais tenham independência política de qualquer governo ou de qualquer instituição.

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