1º Dossiê de violências LGBTI+ em Favelas traz dados para orientar políticas públicas
“Nada se encerra por aqui” declara Gilmara Cunha, fundadora do Conexão G, no evento de lançamento do 1º Dossiê do Observatório de Violências LGBTI+ em Favelas. O evento aconteceu na tarde da última quinta-feira (25) no Observatório de Favelas. A apresentação dos dados evidenciou a importância das políticas públicas e a atenção para as singularidades desses corpos. De acordo com os dados, as travestis e os homens trans são mais impactados pela violência.
O dossiê é resultado de dois anos de pesquisa realizado pelo Conexão G, em parceria com o DataLabe. As entrevistas foram feitas por pessoas LGBTQIAPN+ que também participaram da etapa de testes dos formulários. Ao todo foram entrevistadas 1705 pessoas de favelas distintas, sendo a maioria aqui da Maré e do Morro do Adeus, no CPX do Alemão.
O acesso de homens trans a serviços de saúde foi um ponto de destaque no dossiê. Yuri Cantizano, homem trans foi o responsável pela apresentação dos dados relacionados ao tema. Ele aponta que dos entrevistados, 37,46% dizem que raramente vão ao médico. Entre os motivos, a principal queixa: falta de hormonização trans masculina. Segundo a pesquisa, os homens trans criam suas próprias redes de apoio por onde trocam informações sobre o acesso ao atendimento. ”A gente é invisibilizado dentro da comunidade e das pautas. Para o sistema a gente não existe”, conclui Cantizano.
Racismo nas abordagens policiais
Em relação à segurança pública, 57,58% das pessoas entrevistadas disseram que já foram abordadas pela polícia antes dos 18 anos, e 48% já sofreram violência em abordagens policiais.
Pessoas negras são maioria nas abordagens não só em operações policiais. 52,85% dizem já terem sido abordadas enquanto entre pessoas brancas foram 30,86%. Para mostrar mais que a raça é uma influência nas escolhas para a abordagem, a pesquisa mostra ainda que quando se fala em violência nas abordagens os casos ainda são maioria com pessoas negras. 36,76% já sofreram algum tipo de violência contra 17,94% de pessoas brancas que também responderam a mesma pergunta.
/Já leu essas?
- A necessidade de capacitação para atendimento à pesoas LGBTQIAPN+ na Maré
- ‘Uma travesti do meu porte’ diz Kastelanny, que supera transfobia com arte
- Banheiros sem gênero: Desafios e avanços para pessoas trans em espaços comuns
Leilane Reis, representante do Instituto Raça e Igualdade, ressaltou a importância dos dados e o papel fundamental dos relatórios: “Esses relatórios são fundamentais porque a gente pega eles e ajuda na construção de políticas públicas” pontua.
Outros dados:
A pesquisa foi dividida em eixos temáticos. Educação, empregabilidade e moradia também são apontados nos dados. Tamires Ribeiro, coordenadora do projeto Observatório de Violências LGBTI+ mostra preocupação com dois números: 7,98% das pessoas marcaram que moram em casas feitas por maioria de lona/plástico e 31,40% das pessoas negras que responderam morar sozinhas, sendo dessas 13,26% mulheres trans e travestis. Para Tamires é como se elas estivessem dizendo “eu tenho que me virar”.
O desemprego é maior entre as pessoas trans e travestis. 40,5% estão trabalhando informalmente, 23,5% estão desempregadas e somente 14,2% trabalham formalmente. O texto do relatório aponta que devido a dificuldade de inserção no mercado de trabalho elas acabam procurando outras alternativas mais precárias. 65% das mulheres trans e travestis participantes da pesquisa dizem que já trabalharam como profissionais do sexo e desse número 68% são mulheres negras. “Dado que reafirma racismo e transfobia como correspondentes na produção de violências.” aponta o documento.
Gilmara conta que “existe uma política antigênero e cada dia que passa dentro do congresso federal, de trinta, 4 projetos são antitrans. Então é preciso que cada vez mais surjam dados como esses para que a gente pense numa política que de fato atinja nossa população” acrescenta.