João Alberto Silveira foi espancado ao lado da esposa em mercado
Por Edu Carvalho e Andressa Cabral Botelho, em 20/11/2020, às 18h10
Editado por Andressa Cabral Botelho
Em mais um 20 de novembro, data símbolo da luta por justiça e busca de direitos, negros e negras se uniram para protestar contra mais uma morte brutal. João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos, foi assassinado por um segurança e um policial militar em uma filial da rede de supermercados Carrefour, em Passo D’Areia, Porto Alegre. Se o feriado desta sexta-feira é um dia de refletir sobre o racismo e as suas consequências e de relembrar a morte de Zumbi dos Palmares, tivemos uma amostra grátis de como o racismo opera.
Ele estava acompanhado de sua mulher, Milena Borges Alves, quando espancado. Milena tentou ajudar o marido, mas foi impedida pelos seguranças. “Eu estava pagando no caixa, daí ele desceu na minha frente, quando eu cheguei lá embaixo ele já estava imobilizado. Ele pediu ‘Milena, me ajuda’, quando eu fui, os seguranças me empurraram”, contou.
O Carrefour rompeu o contrato com a empresa de segurança do estabelecimento e não abrirá o estabelecimento nesta sexta-feira (20), em respeito à família. Em nota publicada no Instagram, a rede de supermercados lamenta a morte de João Alberto e informa que “que adotará as medidas cabíveis para responsabilizar os envolvidos neste ato criminoso”.
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, se manifestou sobre o ocorrido nas redes sociais: “Infelizmente, nesta data em que deveríamos celebrar políticas públicas e avanços na luta por igualdade racial, deparamos com cenas que nos deixam indignados pelo excesso de violência que levou à morte de um cidadão negro”. Em vídeo, o governador anunciou a abertura da Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância (DPCI), a primeira do estado, que acontecerá em dezembro. O anúncio foi feito junto à chefe de polícia, delegada Nadine Anflor, e do comandante-geral da Brigada Militar, coronel Rodrigo Mohr Picon, prestando solidariedade à família de João Alberto.
Coletivos organizaram manifestações pelo Brasil em diversos estabelecimentos da rede e instituições ligadas à luta por direitos humanos prestaram solidariedade ao caso. Em nota, a Anistia Internacional “repudia o racismo e a violência empregados pelos dois autores do homicídio, um deles, policial militar”.
“O Dia da Consciência Negra é um dia de luta e hoje estamos em luto, novamente por mais um crime bárbaro contra uma pessoa negra”, disse Jurema Werneck, diretora da organização no Brasil.
Para o Geledés – Instituto da Mulher Negra, “A morte de João Alberto Silveira Freitas, por seguranças do Carrefour do bairro de Passo d’Areia, na Zona Norte da capital gaúcha, escancara mais uma vez, a prática de extermínio contra a população negra no Brasil.”
Já Hamilton Mourão, vice-presidente da República, disse que o caso é “lamentável”, além de desconhecer que exista racismo no país. “Para mim, no Brasil não existe racismo. Isso é uma coisa que querem importar aqui para o Brasil. Isso não existe aqui”.
De acordo com 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, mais de 74% das vítimas de mortes violentas no país são negras; negros são 79,1% dos mortos pela polícia.
Prática comum
Este não é o primeiro caso de pessoas negras abordadas violentamente por seguranças. A prática é bastante comum com pessoas negras, mas não deveria, de forma alguma, ser naturalizada. Cinco em cada 10 pessoas negras já foram seguidas por seguranças de lojas, como aponta a pesquisa As Faces do Racismo, feita em 2020 pelo Instituto Locomotiva a pedido da Central Única das Favelas (CUFA).
Recentemente, em agosto de 2020, Matheus Fernandes, de 18 anos, foi perseguido e agredido por dois seguranças no Ilha Plaza Shopping, na Zona Norte do Rio, após tentar trocar um relógio comprado por ele em uma loja do shopping. Ele foi confundido com um ladrão, levado para a escada de emergência e espancado.
Em 2019 dois casos vieram a público. O primeiro foi em fevereiro de 2019, quando Pedro Henrique Gonzaga (19) foi morto por um segurança no Supermercado Extra da Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Já em julho, um adolescente negro de 17 anos foi chicoteado, torturado e ameaçado de morte após tentar furtar duas barras de chocolate no Supermercado Ricoy do bairro Vila Joaniza, Zona Sul de São Paulo. Na época, os próprios seguranças filmaram e colocaram o vídeo na internet. Em 2009, Januário Alves de Santana (hoje com 50 anos) foi acusado de roubar o seu próprio carro – um Ford EcoSport – no estacionamento do supermercado Carrefour, dessa vez na cidade de Osasco. O vigia da Universidade de São Paulo (USP) foi torturado, enforcado e teve dentes e parte do maxilar quebrados pelos seguranças do estabelecimento.