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O que você precisa saber sobre a vacinação no Brasil

Projeto Conexão Saúde. Foto: Douglas Lopes.

Após primeiro ano da pandemia, cenário para imunização é de incertezas

Por Edu Carvalho e Thaís Cavalcante em 11/03/2021 às 15h. Editado por Edu Carvalho

Com o início tardio de um plano para combater a pandemia do novo coronavírus, o Brasil desponta como um dos países que mais negligenciaram a campanha de imunização e os protocolos de saúde. Ao longo dos últimos meses, representantes políticos deslegitimaram não só o vírus, como a única solução possível para frear a disseminação e o contágio deste inimigo invisível: a vacina. Na figura do presidente da república Jair Bolsonaro (sem partido) e com aval do Ministério da Saúde e do encarregado da Pasta Eduardo Pazuello, o incentivo para o uso de medicamentos com ineficácia comprovada, apostando em atitudes que confundem a população.

O retrato da crise cada vez mais agravada é a capital amazonense, que em seu pior momento, vê o sistema público de saúde colapsar pela falta de leitos e de oxigênio. E mais: uma nova cepa, já presente em 91% das amostras de vírus sequenciadas no Amazonas, e que pode ter sabotado a imunidade coletiva de Covid-19 que existia na cidade.

Entre mandos e desmandos, já contabilizamos mais de onze milhões de casos confirmados e 270 mil mortes desde o começo da pandemia. Um dia antes de completar um ano de pandemia, o Brasil registrou a maior médica diária de mortes: 2.349.

Com liberação emergencial para duas vacinas, como está o panorama em relação ao processo de vacinação no país? Como têm se organizado o governo em relação às doses? O Maré de Notícias Online traz nesta matéria especial algumas das informações mais importantes para você saber nesse momento sobre o assunto.

Apesar da ‘guerra’, temos vacinas

Em meio a politização acerca das vacinas pelo governo federal, a vacinação contra o coronavírus começou no Brasil em 17 de janeiro, no mesmo dia em que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, aprovou o uso emergencial da CoronaVac e da vacina de Oxford. A campanha de imunização foi iniciada com seis milhões de doses da CoronaVac, distribuídas proporcionalmente para os 26 estados e o Distrito Federal.

Durante reunião realizada no dia 8/3, com a presença do Ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, do governador do Piauí e representante do Fórum Nacional de Governadores, Wellington Dias, e do Secretário de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, Carlos Alberto Chaves, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) anunciou o início da produção em larga escala da vacina Covid-19.

A previsão de entrega é de 3,8 milhões de doses para o mês de março, com funcionamento da produção e os esforços que vem sendo realizados para a importação de vacinas prontas e junto à Anvisa para a aceleração de entrega dos lotes produzidos.

A primeira linha em funcionamento hoje está produzindo cerca de 300 mil doses por dia e a expectativa é chegar até o final de março, com as duas linhas em funcionamento, com uma produção de cerca de um milhão de doses por dia.

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, declarou ontem, 10, que o sistema de saúde brasileiro “não colapsou, nem vai colapsar”. A fala foi proferida no mesmo dia em que o país perdeu 2.349 vidas para a covid-19, o maior número de mortes em 24h desde o início da pandemia.

Pazuello também afirmou que o Brasil receberia, neste mês, de 22 a 25 milhões de doses de vacinas, “podendo chegar a 38 milhões”. A quantidade é menor do que a última previsão divulgada pelo Ministério da Saúde no inicio de março, quando se estava previsto para se chegar 30 milhões de doses. Essa é a quinta redução de doses a serem entregues.

Até o momento, o Brasil aplicou 9 milhões de doses de vacina – o equivalente a 11,7% da população em grupos prioritários. Só 3,1 milhões de pessoas receberam ambas as doses de algum imunizante.

A vacina CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório Sinovac BiotechImagem: Aloisio Mauricio/ESTADÃO CONTEÚDO

Demora na compra de doses por ‘’frustração’’

Nós já poderíamos ter começado a vacinação antes de janeiro. Em comunicado, a farmacêutica Pfizer disse ter apresentado em agosto de 2020, uma carta de intenção ao governo brasileiro para venda das vacinas. Na primeira proposta para aquisição de imunizantes, a entrega das doses estava prevista para dezembro. 

O Ministério da Saúde informou que o número de doses contra a covid-19 oferecidas pela farmacêutica seria insuficiente para atender a demanda do país. A previsão inicial do laboratório, segundo a Pasta, incluía dois primeiros lotes de 500 mil doses e um terceiro lote de 1 milhão de doses, totalizando dois milhões de doses.

“Para o Brasil, causaria frustração em todos os brasileiros, pois teríamos, com poucas doses, que escolher, num país continental com mais de 212 milhões de habitantes, quem seriam os eleitos a receberem a vacina”, destacou o ministério, por meio de nota. O governo brasileiro cita ainda cláusulas abusivas estabelecidas pela farmacêutica.

Mas na última semana as coisas mudaram e houve anúncio da compra de 14 milhões de doses da vacina produzida pela farmacêutica, com previsão de entrega ao país em maio e junho. O imunizante da Pfizer é, até o momento, o único que possui o registro definitivo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e já vem sendo aplicado em diversos países do mundo.

Hoje, 11/3, o chefe da Saúde garantiu ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que assinaria o contrato firmar acordo com o laboratório. A estimativa seria trazer 100 milhões de doses da vacina.

Dose da vacina da Pfizer/BioNTech.
Reprodução: AFP

Para todo mal, há cura

Até o balanço de ontem, 10, feito às 22h, foram vacinadas mais de 328.77 milhões de pessoas no mundo, de acordo com o panorama divulgado pela Our World Data. No Brasil, o total de é de 9.013.639 pessoas, segundo dados divulgados pelas secretarias estaduais de saúde até as 20h. A informação é resultado de uma nova parceria do consórcio de veículos de imprensa, formado por G1, O Globo, Extra, O Estadão de S.Paulo, Folha de S.Paulo e UOL.

A população vacinada no Município do Rio de Janeiro está sendo contabilizada em tempo real pelo portal online Vacinômetro que hoje, 11/3, registrava 723.402 mil pessoas vacinadas. Outros estados do país também aderiram ao portal, que informa o número e não expõe nenhum dado sobre onde, quanto ou quem está neste mapeamento.

Para Geraldo Fonseca, aposentado e morador da Nova Holanda, na Maré, tomar vacina será como um presente de aniversário. Exatamente uma semana depois de completar seus 75 anos, ele será vacinado. “Eu fico muito grato por isso. Se vacinar é como uma segurança de vida, eu gostaria que todo mundo pensasse assim. é para o bem da gente. Sem isso, é como se a gente estivesse sem os chinelos, que fica fácil machucar os pés”, admite.

O conjunto de favelas continua sendo líder em número de casos de covid-19, se considerarmos os territórios populares do Rio de Janeiro. São mais de 3 mil casos, segundo o Painel Unificador das Favelas. Para Geraldo (pai da repórter Thais Cavalcanti), a vacina e o isolamento social são formas de melhorar esse cenário. “A gente deve se prevenir e resguardar. Muitas coisas ruins estão acontecendo no meio do mundo e quem trabalha quer mais é saúde”.

No Plano de Vacinação carioca também há orientações para que a população prefira o horário da tarde para se vacinar, leve a caderneta de vacinação se tiver, dê preferência para a unidade de saúde que frequenta e é necessário guardar o comprovante da primeira dose para tomar a segunda. 

Primeira idosa vacinada na Maré

Estados preparam informações sobre quando devem vacinar
Em Recife, o sistema utilizado para organização é o site Conecta Recife, que também tem aplicativo no Google Play e App Store. Nele, o cidadão pode fazer o agendamento nos postos de vacinação específicos. 

Reprodução: governo estadual de Recife


Já o estado de São Paulo criou o site #VacinaJá, onde a população pode preencher os dados pessoais e aguardar o momento exato em que o grupo que lhe cabe será chamado.

Interface do site Vacina Já, desenvolvido pelo governo de São Paulo para acelerar vacinação no Estado. Divulgação

Aposta do governo brasileiro para monitorar vacinação é o ConecteSUS

Uma caderneta digital, disponível no seu celular, pode ajudar a identificar quando deve se vacinar pela primeira vez e a voltar ao posto para uma segunda dose. Para isso, a aposta do governo federal e do Ministério da Saúde é o Conecte SUS. Ele registra toda a trajetória de quem busca atendimento nas unidades do Sistema Único de Saúde e disponibiliza, entre outras ferramentas, a Carteira Nacional Digital de Vacinação.

A ferramenta já está disponível gratuitamente nas lojas de aplicativos – Google Play e App Stores. Depois de baixar, basta informar o número do Cartão Nacional de Saúde – também chamado de Cartão SUS – ou do CPF. Se você já tiver cadastro nos sites do governo federal, com o CPF, provavelmente poderá usar a mesma senha. Se não tiver, é só preencher o formulário. 

Até o momento, não há no site, tampouco no aplicativo, nenhuma atualização sobre as vacinas contra o coronavírus.

Reprodução: Ministério da Saúde

Pelo mundo, a organização frente às campanhas de vacinação acontece de maneira ordenada. Em Portugal, que começou a vacinar no final de dezembro, o governo envia avisos, por SMS. “COVID19: Vacinação começa Aguarde contacto do SNS”, diz a mensagem, citando o Serviço Nacional de Saúde. No Reino Unido, primeira nação a iniciar a imunização, os alertas são disparados por e-mail de que. As vacinas utilizadas tanto em Portugal quanto no Reino Unido são as das farmacêuticas Pfizer e BioNtech

Quais são as diferenças entre as vacinas CoronaVac e Oxford?

No Brasil, temos duas vacinas sendo possibilitadas à população: a CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês SinoVac em parceria com o Instituto Butantan do Brasil, e a vacina Oxford/AstraZeneca, com compartilhamento através da Fundação Oswaldo Cruz. 

A segunda dose da CoronaVac precisa ser tomada num intervalo de 14 a 28 dias; e a segunda dose da vacina de Oxford, em 12 semanas. Com o número ainda bem reduzido de vacinas no Brasil, os médicos alertam sobre a importância de garantir a aplicação da segunda dose no prazo certo para uma imunização completa.

Ontem, o governador João Doria (PSDB) disse que a vacina CoronaVac é eficaz contra as três variantes do coronavírus – a britânica (B.1.1.7), a brasileira (B.1.1.28) e a sul-africana (B.1.351) – em circulação no Brasil.

De acordo com Doria, a eficácia da vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan e pelo laboratório chinês Sinovac foi verificada em um estudo preliminar feito em parceria com a Universidade de São Paulo (USP).

Como neste momento a primeira fase da campanha as vacinas são aplicadas in loco, o controle das datas para receber a segunda dose é mais fácil de administrar, mas isso deve mudar quando tivermos disponíveis um maior número de doses e mais grupos puderem ser imunizados. Será necessário que o próprio indivíduo procure serviço, no posto de vacinação mais próximo. Caso atrase ou esqueça de voltar, essa dose será aplicada do mesmo jeito, porque está contabilizada no cálculo.

Glaucia Paula é técnica de laboratório e foi vacinada contra a covid-19.
Foto: Arquivo pessoal.

Tomar vacina, um ato pela saúde do outro

Glaucia Paula, técnica de laboratório em duas unidades de saúde e nascida no Parque União, foi vacinada na semana em que a CoronaVac chegou à cidade do Rio de Janeiro. “No momento da vacina eu senti alívio e esperança. Alívio, pois mesmo tendo contraído a doença em maio e ficado bem e sem sequelas, ainda temo pelos meus familiares que são do grupo de risco”.

Seu dia a dia de trabalho era uma realidade vivida em todo o país. “Há um desgaste emocional muito grande em estar à frente na assistência. Desde o início da pandemia, os plantões foram caóticos: no início, pela falta de equipamentos de proteção individual, depois a questão da higienização e da paramentação, que exigem cuidado e fazem com que os processos fiquem mais lentos. Também foi exaustivo lidar com o afastamento de colegas contaminados”, afirma.

A notícia de que foi uma das escolhidas para ser vacinada chegou em uma lista por e-mail e, priorizaram aqueles que tivessem um contato mais direto com o paciente. É o caso de Glaucia, que faz coletas de sangue também em pacientes no CTI COVID-19. A organização foi feita pela equipe de enfermagem e durou cerca de 15 minutos, sem aglomeração. Nem todos do laboratório foram vacinados, mas foi prometido que, conforme mais doses forem adquiridas, todos serão beneficiados.

No e-mail, além do nome dos beneficiados, ela conta que também foi informada qual era a vacina e que seria imunizada com a primeira dose e em breve, com a segunda. “Pediram para que levássemos o cartão de vacinação do adulto e o crachá da instituição. Na hora da vacinação, passamos por uma avaliação sobre o estado de saúde e fomos orientados sobre a importância de levar o cartão ou comprovante de vacinação para segunda dose, pois é necessário para a conferência do lote”.  

Sobre o movimento anti-vacina, ela reforça que tomar vacina é um ato sanitário e um pacto social, não uma atitude individual – é pelo bem de toda a população. “A saúde é movida por dados científicos, por trás dessa vacinação existem profissionais muito qualificados e gabaritados que pesquisaram e estudaram para que hoje tenhamos esperança”.

De acordo com informativo publicado pela Associação Médica Brasileira e a Sociedade Brasileira de Infectologia, a vacinação e o tratamento farmacológico preventivo, as fake news continuam como uma grande inimiga neste período em que a vacinação chega aos estados brasileiros. “A desinformação dos negacionistas que são contra as vacinas e contra as medidas preventivas cientificamente comprovadas só pioram a devastadora situação da pandemia em nosso país. As principais sociedades médicas e organismos internacionais de saúde pública não recomendam o tratamento preventivo, inclusive a ANVISA”.

Além de alertar e apresentar a situação atual, as entidades também mostraram orgulho e apreço pela ciência. “Parabenizamos todos os pesquisadores que participam dos estudos clínicos das vacinas contra COVID-19, o Instituto Butantan e a Fiocruz, instituições públicas que orgulham os brasileiros”.

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