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Pandemia e educação: o que esperar da retomada em 2022

Foto: Matheus Affonso

De acordo com estudo sobre os impactos da epidemia global para os estudantes, 5,1 milhões de crianças e adolescentes perderam o vínculo escolar em 2020

Por Gracilene Firmino

O vírus da covid-19 não diferencia nem privilegia quais seres humanos ele vai infectar, mas as consequências de sua ação produziram um impacto sentido com muito mais intensidade pelos mais pobres. Se para muitos a educação chegou pela internet, para milhares ela foi a grande ausência nesses quase dois anos de pandemia — nas escolas fechadas, nos dispositivos antigos e sem memória suficiente, na internet instável. 

Andréia Martins, membro da direção que acompanha o Eixo Educação na Redes da Maré, relembra que apenas 36,7% dos domicílios da Maré têm internet: “Mesmo entre as famílias que tinham rede, os pacotes de dados eram, na maioria das vezes, insuficientes para chegar até o fim do mês. Professores relataram ter que adaptar as atividades, já que vídeos e participação em aplicativos de reuniões requerem uma qualidade melhor da internet.”.

Segundo Andréia, o ensino remoto aprofundou as desigualdades. “Desde o início da pandemia, as dificuldades para a continuidade do processo educativo de estudantes pobres, moradores de favelas e periferias, têm sido enormes. Muitas famílias só dispõem de um celular, que é utilizado pelo adulto ao longo do dia, só estando disponível para o aluno estudar à noite.” 

Não apenas os estudantes sofreram com a adaptação. “As dificuldades atingiram tanto as famílias quanto os profissionais de educação, que lutaram para manter o vínculo do aluno com a escola e a continuidade do processo educativo”, afirma.

Para especialistas, o ensino remoto aprofundou as desigualdades sociais por conta do limitado acesso à internet e a dispositivos – Foto: Matheus Affonso

Ano de incertezas

Andréia conta que, mesmo com dificuldades, estudantes da Maré chegaram a frequentar as aulas presenciais. “Os anos da pandemia foram de muitas incertezas quanto ao retorno, anunciado inúmeras vezes e depois, cancelado por conta da dificuldade de controle da doença. A volta foi gradativa e algumas escolas da rede municipal na Maré conseguiram retornar no formato híbrido em março de 2021. O momento tem sido de adaptação, de cuidados sanitários redobrados, de busca ativa de estudantes que não retornaram à sala de aula. Nesse processo, vale ressaltar que as escolas da Maré não têm muitas fragilidades em relação à infraestrutura dos prédios.”

Os professores tiveram papel fundamental na luta por manter as aulas e o vínculo com os alunos. Viviane Couto, que é professora da rede pública de ensino e dá aulas na Escola Municipal Olimpíadas Rio 2016, na Maré, fala sobre as dificuldades. “Foi bem difícil retornar ao presencial. O protocolo é muito bonito no papel, mas no dia a dia sofremos para dar conta de tudo, o pedagógico, a burocracia e a saúde de todos”, conta. 

A educadora fala das particularidades da escola em que leciona. “Quando retornamos ao presencial, as aulas transcorreram normalmente, com conteúdos, projetos, avaliações individuais, integradas, e avaliações externas. Além disso, promovemos uma rigorosa busca ativa por estudantes que se afastaram. Não havia nenhuma orientação de aprovação automática, o que nos pegou de surpresa. Mas nossa escola fez um trabalho sério durante todo o ano. Reprovar nunca é uma meta; o problema é sempre a falta de diálogo”, diz Viviane.

O aviso na entrada de uma das escolas da Maré mostra aos estudantes os cuidados sanitários a seguir – Foto: Matheus Affonso

O que diz a Prefeitura

Atualmente, 16.491 alunos são atendidos em 45 escolas da Prefeitura no conjunto de favelas da Maré. Em nota, a Secretaria Municipal de Educação (SME) informou que pretende implementar uma série de projetos. Além disso, “os alunos que acompanharam as aulas de forma virtual ou presencial em 2021 não serão reprovados por nota, somente por frequência. No entanto, essa não é uma aprovação automática. O Rio optou por um modelo de priorização curricular, que é uma forma de retomar no ano seguinte habilidades que não foram trabalhadas o suficiente e são necessárias para o seguimento do aprendizado. Essa medida é aplicada em situações de emergência e é aprovada pela Unesco.”

A Prefeitura anunciou ainda projetos como o Carioca I e II e o Travessia, além do reforço escolar que deve acontecer no contraturno escolar (período oposto ao que o aluno frequenta a escola). Serão cinco horas semanais de reforço para 75 mil alunos com defasagem na aprendizagem, com o apoio de professores e estagiários em aulas presenciais ou remotas, e planos individualizados elaborados pelo professor a partir das avaliações diagnósticas.

Já os projetos Carioca I e II são estratégias de correção de fluxo de aprendizado que buscam atender estudantes que apresentam defasagem em idade/ano escolar. “Para 2022, serão abertas vagas para atender também alunos do Carioca I, que são aqueles do 6° e 7° anos. O Carioca I é voltado para estudantes entre 13 a 15 anos e o Carioca II, para jovens entre 14 e 16 anos”, diz a nota.

Quanto ao Projeto Travessia, ele é “uma estratégia que visa atender estudantes que chegaram ao 6º ano do Ensino Fundamental ainda com dificuldades de aprendizagem do primeiro ciclo. O projeto oferecerá material elaborado exclusivamente para esses alunos que apresentaram baixo desempenho nas avaliações de leitura e escrita”.

ANO LETIVO DE 2022
1º Bimestre 20222º Bimestre 20223º Bimestre 20224º Bimestre 2022
Equivalente ao 1º semestre do ano de 2021Equivalente ao 2º semestre do ano de 2021Equivalente ao 1º semestre do ano de 2022Equivalente ao 2º semestre do ano de 2022

A previsão é de que as aulas nas escolas do município retornem, a princípio de forma presencial, no dia 7 de fevereiro.      

Bora pra escola!

A evasão escolar tem preocupado as organizações sociais e as autoridades de educação. Segundo o estudo Cenário da Exclusão Escolar no Brasil – um Alerta sobre os Impactos da Pandemia da Covid-19 na Educação, em 2020, 5,1 milhões de crianças e adolescentes perderam o vínculo escolar. Os motivos podem ser muitos, desde a necessidade de trabalho, para que os jovens consigam ajudar a família, quanto por medo de reprovação, por não se sentirem capacitados ou até mesmo por não terem quem leve uma criança pequena para as aulas.  

Nesse cenário, de recuperação após o avanço da vacinação, foi lançada a campanha “Bora pra Escola!”, pelo Centro de Referências em Educação Integral. O objetivo é mobilizar estudantes que abandonaram a escola durante a pandemia a voltarem para a escola. Mais de 30 organizações sociais de todo o Brasil se uniram nessa mobilização.

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