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‘Se eu fosse criminosa não estaria aqui falando’ Quem são os moradores da construção em demolição pela SEOP?

Revolta, medo, tristeza, insegurança, cansaço. São essas as palavras que moradores do Conjunto de Favelas da Maré têm usado para descrever os últimos dias, marcados por uma operação da Secretaria de Ordem Pública (SEOP), apoiada pelas Polícias Civil e Militar. A ação, que visa demolir moradias na área conhecida como Cão Feroz, no Parque União, teve início na terça-feira (13). Desde a última segunda-feira (19), porém, os moradores enfrentam operações consecutivas, sem previsão de término.

A maioria das pessoas que assistem a demolição são mulheres que moram no local. Em vídeos que circulam nas redes sociais, é possível ver um grande número de pessoas protestando pelo direito à moradia, alegando serem moradores das residências que a SEOP afirma estarem – em sua maioria – vazias. 

Ana Beatriz, 20 anos, mora no local há três anos. Ela conta que não recebeu nenhum aviso prévio da demolição, até agora. “Eu penso em continuar na minha casa, não vou sair até porque eu não tenho para onde ir. Meu filhos são pequenos ainda. […] Não tá tendo aula, eu tenho que levar ela [a filha pequena] no posto e não tá tendo [atendimento].

Greice Kelly dos Santos, de 23 anos, é mãe de três crianças, entre elas um bebê de 1 mês. Ela e o irmão desde o começo denunciam situações de abuso por parte dos agentes. “Eles não tratam a gente na educação, não deixam nossos direitos básicos. Ontem a delegada falou que ia me levar presa porque eu não queria sair de casa, ela falou que era maus tratos as crianças, como assim eu vou tratar mal meus filhos? A gente tá aqui, minhas filhas sem poder estudar, quatro dias sem ir para a escola.” O irmão dela foi conduzido a delegacia, ele tem apenas 17 anos e estava questionando os policiais o motivo pelo qual não podia entrar em casa. “Não estão deixando a gente falar. Estão levando a gente preso por falar. Estão chamando a gente de traficante e não somos, se fosse criminoso eu não estaria aqui falando!” finaliza.

Na última quarta-feira (21) uma casa foi demolida sem a presença da dona do imóvel. Um morador presenciou e contou o constrangimento que sente “está sendo perturbador, eles querem tirar a força, ameaçar que vai dar tiro, cheguei até presenciar um policial falando que ia levar a geladeira para casa ou dar para um familiar”. Outra mulher que está grávida,  apesar de ver a demolição embaixo da sua casa acontecer, se recusava a sair na tentativa de impedir a ação da secretaria. O andar térreo, onde era o espaço de uma loja, foi demolido nesta manhã.

Um bairro inteiro afetado

Embora o foco da ação seja uma região definida, a rotina da maioria dos moradores da Maré acaba impactada, em especial quem vive e circula pelo Parque Maré, Nova Holanda, Rubens Vaz e Parque União. As unidades de saúde estão com funcionamento afetado parcial ou totalmente, gerando cancelamento de mais de 200 atendimentos.

Com relação às escolas, por volta das 8h de hoje, a Secretaria Municipal da Educação informou que 31 escolas estavam “avaliando as condições para funcionamento” e 15 estavam abertas, embora registrando atraso para o início das aulas. Em nova nota, às 11h30, a pasta informou que as 46 escolas da rede municipal estavam funcionando.

A Clínica da Família (CF) Jeremias Moraes da Silva interrompeu o funcionamento nesta quinta-feira (22). E a CF Diniz Batista dos Santos mantém o atendimento à população. Porém, sem atividades externas realizadas no território, como as visitas domiciliares.

O que dizem os órgãos públicos

Desde a última terça-feira (13), com o início das operações, a equipe do Maré de Notícias tem questionado a Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS) sobre qual auxílio tem sido oferecido para os moradores. Depois de três tentativas a secretaria respondeu que neste tipo de situação, o atendimento inicial é realizado pela equipe técnica do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), que é responsável pela “porta de entrada” nas ações da SMAS.

Segundo o órgão, “No dia da ação, a equipe técnica da Coordenadoria Média Complexidade, em caso de adesão à oferta de acolhimento, entra em contato com a Central de Recepção de Adultos e Famílias Tom Jobim ou com a Central de Recepção de Idosos Pastor Carlos Portela (ambos localizados na Ilha do Governador) para que haja a regulação da vaga.” E complementa informando “que até o dia de hoje, não houve solicitações de acolhimento relacionadas à ação”. Vale ressaltar que a secretaria informou que oferta o “acolhimento institucional provisório.”

Questionamos a Defesa Civil se houve acionamento para acompanhar a demolição dos edifícios, mas até o fechamento desta matéria não tivemos retorno.

O Maré de Direitos, projeto do eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça, da Redes da Maré, acolhe situações de violações de direitos no WhatsApp (21) 99924-6462 e também nos equipamentos da organização.

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