Evento que rememorou Machados de Assis e Lima Barreto aconteceu na Ladeira do Livramento, no Morro da Providência
Por Alessandra Holanda e Maria Clara Paiva (*)
Literatura, ancestralidade, histórias de luta e resistência marcaram a Festa Literária das Periferias, a Flup 23, neste fim de semana. O evento que homenageou Machado de Assis e Lima Barreto aconteceu na Ladeira do Livramento, no Morro da Providência, onde nasceu Machado. A data escolhida foi cheia de simbolismos por ser o dia do nascimento de Lima Barreto, dia da suposta abolição da escravatura e, na Umbanda, dia dos Pretos e Pretas Velhas. ( de 11/5 a 13/5).
A programação teve início na Praça do Cais do Valongo, ainda de manhã, com o Afoxé Filhos de Gandhi e o Bloco Prata Preta subindo até a Arena Samol. A festa contou com entrevistas; homenagens à Mãe Beata de Iemanjá, apresentadas pela jornalista Flávia Oliveira; mesa de debate com Haroldo Costa e Gilberto Gil, representando a Academia Brasileira de Letras; além de atividades infantis, a tradicional feijoada e muita música.
Nesta sua 13° edição, a Flup realizou o lançamento do livro “ Quilombo do Lima”, obra que reuniu 22 autores e autoras negras para revisitar e atualizar as obras do escritor para a nova geração. Vagner Amaro, fundador da Editora Malê, responsável pela publicação da coletânea, estava presente e destacou a importância da transformação do meio literário. “A cada livro que eu publico é um discurso de resistência contra quem desqualifica a literatura negra.”
O evento promovido pelo Ministério da Cultura, pela Prefeitura do Rio e pela Secretaria Municipal de Cultura celebrou também a retomada do MinC e dos investimentos no setor. Junto aos representantes do Ministério da Educação, do MinC, da Prefeitura e da associação de moradores do Livramento, a diretora e porta-voz da Flup, Daniele Salles, falou sobre o simbolismo desse momento.
Voltamos a um país onde a cultura não é criminalizada, a cultura é investimento. É aqui que acontece o encontro dos nossos escritores com o Brasil.
Para o músico e percussionista Eduardo Reis Batista, acompanhar a Flup representa uma mistura de sentimentos: “Eu tenho 54 anos, faço parte do primeiro bloco afro do Rio de Janeiro e a gente acompanha a Flup desde o início. É uma felicidade, uma coisa maravilhosa tá participando disso aqui hoje. Mas a gente também fica triste porque poderia ser muito maior. O público do Rio de Janeiro, da periferia do Rio, deveria ter mais acesso a esse tipo de evento. Isso que vai fazer a diferença pra gente transforma esse país no que ele realmente precisa ser”
Encerrando as mesas de debate, Gilberto Gil falou sobre nossa eterna permanência no que chamou de “pós abolição”. O imortal da Academia Brasileira de Letras disse que “enquanto existir esse excesso de agressividade em relação ao negro e a criação e produção negra, esse conceito de que ainda não alcançamos a abolição permanecerá”. Na data que marca a abolição da escravatura, para ele, a crença que fica é que as novas gerações realizem aquilo que um dia foi sonhado. “Que venha uma segunda abolição. Uma terceira se necessário. No sentido de que nós, os negros do Brasil, estejamos definitivamente inseridos na história como partícipes. Não só pelos que já estão, mas pelos que ainda estão por vir para construir essa brasilidade.”
Gil se despediu do público cantando “Babá Alapalá”, fechando sua participação ao lado de Haroldo Costa e da mediadora Eliana Alves Cruz. Os últimos momentos do evento que teve mais de 13 horas de duração ficou por conta de Zélia do Prato, da escola de samba Vizinha Faladeira e do grupo Samba de Caboclo.
(*) Alessandra Holanda e Maria Clara Paiva são estudantes de jornalismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e fazem parte do Curso de Extensão Conexão UFRJ com o Maré de Notícias.