Um sentido para a vida

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Morador da Nova Holanda, Seu João acredita que plantar é uma terapia – que dá sentido à sua existência e traz a natureza para o território

Maré de Notícias #106 | Novembro de 2019

Hélio Euclides

Quem vê João Alves dos Santos, 79 anos, cuidando de plantas pelas ruas da Maré, não imagina a história de vida desse potiguar, que começou a trabalhar cedo nas terras do seu pai. Foi lá que começou o seu amor incondicional pelas plantas. Muitos anos depois, em 2013 e já no Rio de Janeiro, perdeu sua esposa, o que o levou à depressão. Para superar a doença, passou a cuidar da natureza, deixando mais verde a Maré. “Para levantar dessa situação, comecei a varrer a Rua Carmela Dutra, na Nova Holanda. Percebi que há pessoas à minha volta, que conversar faz muito bem”, conta.

Nos cinco hectares de terra do seu pai, Seu João “puxava cobra dos pés”, ou seja, era um trabalhador que não abandonava a enxada. Só que um dia sofreu um choque térmico, que o deixou paralítico por quatro anos. Foi desenganado pelos médicos, mas, com fé, tomou um remédio dado por uma vizinha, que trouxe de volta seus movimentos. À procura de um tratamento definitivo, veio para a Cidade Maravilhosa, em 1974.

Cuidar da natureza é terapia

Seu João começou a cuidar de jardins utilizando a técnica que aprendeu na agricultura. “O primeiro lugar foi na Paróquia Jesus de Nazaré, depois na Escola Estadual Professor João Borges de Moraes, onde levei um susto, tinha mato da minha altura, com 1,62 cm. Agora, na Redes da Maré, é onde tento trazer vida às plantinhas da instituição”, diz.

O mareense não se separa do carrinho de mão e do seu capacete. “Por ser branco, já me chamaram de engenheiro”, comenta. Detalhe: uma das características de Seu João é a humildade. Apesar de ser um paisagista nato, não se considera um jardineiro por desconhecer os nomes de plantas. “Sinto que plantar me anima. Dessa forma, a preguiça para mim não existe”, acrescenta.

O que o deixa triste é ver o que plantou sendo maltratado. Por isso, ensina para as pessoas que planta significa vida. E, apesar de alguns problemas de saúde, Seu João acredita que cuidar da terra virou uma terapia. “Esqueço das dificuldades, como lembrar da minha casa, que está precisando de uma reforma urgente, mas não tenho condição financeira”, diz.

Maré Verde em atividade

Após o plantio de mil mudas de plantas e árvores no fim de setembro (uma parceria com o Projeto Verdejando, uma inciativa da TV Globo), o Maré Verde continuará suas ações de educação ambiental. A próxima acontecerá nos dias 6, 7 e 8 de dezembro, quando será realizado o 2º Encontro de Saneamento da Maré, no Parque Ecológico da Vila do Pinheiro – uma parceria com o data_labe, que será marcada por um mutirão de plantio. “Importante é lembrar que a Maré está entre as principais vias da cidade. Por isso, precisa de arborização, para se ter um impacto na saúde e na qualidade de vida. O desafio é conseguir uma consciência para o verde, como o fim do lixo espalhado”, explica Julia Rossi, bióloga e coordenadora do projeto Maré Verde.

Criação de uma composteira no espaço da Comlurb

Você sabia?

O Maré Verde, iniciado em 2018, é um projeto da Redes da Maré que visa desenvolver atividades de educação ambiental e mobilização social, que envolvam a comunidade escolar, moradores, catadores, Comlurb e outros atores locais.

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