Projeto Uerê completa 24 anos de atuação na Maré

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Mais de duas décadas dedicadas ao incentivo à educação da infância da favela 

Por Jéssica Pires e Hélio Euclides, em 29/06/2022 às 07h. Editado por Edu Carvalho

Para uma parte da sociedade poderia ser um deserto, mas para Yvonne Bezerra de Mello toda terra pode ter um rio. Isso pode explicar a escolha do nome Uerê, de origem tupi-guarani, que define um lago na margem direita do rio Juruá, entre a confluência dos rios Gregório e Carauari, no estado do Amazonas. Outros significados da palavra indigena são: criança, brincadeira e diversão. Com esse pensamento de unir o lago do saber com a alegria da criança, em 1998, o projeto de fortalecimento escolar, a Uerê chegou à Maré. A raiz da iniciativa surgiu em 1976, quando Yvonne trabalhou na África e, depois, com a atuação nas ruas do Rio de Janeiro, por meio do projeto Escola Sem Portas Nem Janelas, um convívio com grupos de crianças e jovens em situação de rua. As ações da escola cresceram depois da chacina da Candelária, em 1993, quando oito crianças de um dos grupos atendidos por ela foram assassinadas por policiais militares.

O menino Thiago Veríssimo inspirou o Uerê. Com apenas seis anos, escapou da matança e refugiou-se com sua família num viaduto na Leopoldina, zona central da cidade. No local, com ajuda de uma rede de amigos, construiu o espaço Coqueirinho, mais que uma escola, um amoroso atendimento humano à comunidade local. Na Maré, o primeiro trabalho foi feito no antigo Kinder-ovo, na Vila do Pinheiros, depois a sede foi estabelecida na Nova Maré. Assim se concretiza o Projeto Uerê, com uma metodologia de ensino própria, desenvolvida para crianças que frequentam colégios públicos, e enfrentam os desafios do acesso à educação de qualidade. É oferecido o complemento do ensino formal, além de oficinas extracurriculares. Atualmente cerca de 400 crianças mareenses são beneficiadas pelas ações do projeto.

Um casamento entre a instituição e a Maré que completa bodas de opala, ou seja, 24 anos de trajetória. “Me sinto muito emocionada por chegar a tantos anos educando e instruindo com qualidade. Construímos uma família Uerê muito sólida num trabalho diário com muito amor e dedicação. Agradeço às muitas crianças e adolescentes que estiveram e estão nas nossas salas de aula nos dando inúmeras alegrias. Não posso esquecer as famílias dos nossos alunos que nos entregam seus filhos na confiança de que serão amados e bem formados”, destaca Yvonne, fundadora do projeto.

Mello entende que só foi possível ultrapassar por duas décadas de trabalho por não se encontrar sozinha na instituição. “Só tenho que agradecer por tem uma equipe maravilhosa, muitos conosco todo esse tempo. Estou muito feliz por continuar com a obra da minha vida que não seria possível sem a equipe e sem Luciana, nossa presidente. Minha eterna gratidão aos patrocinadores e amigos brasileiros e estrangeiros que fazem esse sonho acontecer todos os dias”, conclui.

Luciana Martha, mencionada por Yvonne, é a presidente da instituição e lançou o livro ‘A Bela Chance‘ em 2018, no qual demonstra todo carinho com o projeto que foi um marco na sua vida. Para ela, esses 24 anos foram de comprometimento, qualidade do serviço, somados a uma equipe que respeita a pedagogia da Yvone. “Acreditamos que até para pregar um prego é preciso o compromisso. São anos de surpresas boas e vontade de investir. São jogos e exercícios didáticos, que estimulam a mente. Somam-se a isso as aulas de artes, informática e música com instrumentos de cordas, como violão, violino e violoncelo”, conta. No projeto ainda há futebol e todas as crianças recebem uma alimentação de qualidade.

Para o sustento da instituição, não se vende nenhum produto e sim o crédito da qualidade para os patrocinadores. Esse profissionalismo começa quando o Uerê completa dez anos. “Antes só funcionava no turno da manhã, era uma ong amadora. A partir daí houve um empoderamento e fomos captar recursos. Ficaram mais claras a força de uma equipe que fica melhor a cada dia, e da Yvone, que tem a tenacidade”, expõe. A fórmula que explica o sucesso de chegar aos 24 anos é mostrar que o projeto não é uma creche, e sim um lugar que tem como meta o pensar no futuro. Assim o Uerê computa três gerações que passaram pelas suas salas.

“Um diferencial é que estamos presentes na vida da instituição e dos alunos. Conhecemos cada família e vibramos com cada conquista. Um período marcante para nós foi o início da pandemia, na qual tivemos que fazer um plano de contenção, mas priorizamos o pessoal”, comenta. O projeto ainda conseguiu atender a todos os funcionários e famílias dos alunos com cestas básicas, pelo período mais difícil da pandemia.

A presidente lembra que quando o Uerê começou tudo na favela era precário, com crianças que ficavam presas em casa para os pais irem estudar. “Percebemos uma evolução e mudança social, com o governo federal de esquerda e ficamos felizes pois tivemos a nossa dedicação. Avalio que por parte das crianças só percebemos aptidão. Podemos dizer que não só agora, mas sempre estamos comemorando, pois somos uma instituição alegre. Nestes 24 anos só queremos realçar que o Uerê é da Maré”.

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