O estudo vai mapear o cotidiano alimentar de famílias com crianças de 5 a 10 anos. Dividida em três etapas, a iniciativa começou com um grupo focal, promovendo uma roda de conversa no Observatório de Favelas
O Instituto Desiderata deu início a pesquisa: Avaliação do Ambiente Alimentar e Estado Nutricional de Crianças e Adolescentes Residentes em Favelas. O estudo consiste em avaliar o ambiente alimentar de favelas de três favelas brasileiras, Maré, Caramujo, em Niterói e Coque, no Recife. O objetivo é associar a situação de segurança alimentar e o estado nutricional de famílias com crianças, com vistas a subsidiar ações de incidência política.
Um dos pontos que a pesquisa vai identificar é como se encontra o grau de obesidade infantil nas favelas. Segundo um levantamento do Observatório de Saúde na Infância, uma parceria da Fiocruz e da Faculdade de Medicina de Petrópolis (Unifase) revela que em crianças brasileiras de até 5 anos, o excesso de peso, que inclui casos de sobrepeso e de obesidade afeta uma em cada dez e um em cada três adolescentes, de 10 a 18 anos, em 2022. No quadro mundial, o Brasil possui 14,2% de crianças com excesso de peso e 5,6% da média global registrada em 2022. Em relação aos adolescentes, a média nacional apontou que 31,2% estão acima do peso, quase o dobro da média global de 18,2%.
Na Maré, a pesquisa vai mapear o cotidiano alimentar de famílias com crianças de 5 a 10 anos. Dividida em três etapas, a iniciativa começou com um grupo focal, promovendo uma roda de conversa no Observatório de Favelas. Na ocasião, sete responsáveis participaram do encontro e discutiram as características do ambiente alimentar nas favelas. Os participantes destacaram a importância de uma alimentação saudável, ressaltando os benefícios de verduras e legumes. Também compartilharam suas experiências sobre onde costumam fazer compras no território, como feiras livres, mercados e sacolões. Apesar disso, apontaram a ausência de estabelecimentos que ofereçam opções como sanduíches naturais, evidenciando lacunas na oferta de alimentos mais saudáveis.
Os responsáveis também relataram a existência da dificuldade financeira e de tempo. Segundo eles, nas áreas urbanas é muito difícil manter a alimentação saudável, pois há muita concorrência de alimentos ultraprocessados. Para eles, uma alimentação mais natural só é mais fácil para quem mora em sítios. Eles também deram sugestões de como incentivar para alavancar as vendas de produtos saudáveis, os comerciantes a colocarem os produtos que estão perto de vencer a validade por um preço mais baixo ou até mesmo doar. Também pediram mais cursos envolvendo o ambiente gastronômico na favela, mas sem o limite de idade.
“Acredito que aprenderemos sobre os alimentos mais saudáveis e vamos compartilhar”, conta Cleide de Oliveira, moradora da Nova Holanda. Os moradores avaliaram também a alimentação escolar. Uma característica é que as crianças criam um hábito dos horários que se alimentam na escola, que acabam seguindo isso em casa.
A segunda etapa acontece em 2025, com a realização de 400 entrevistas de casa em casa, nas favelas da Nova Holanda, Parque União, Parque Rubens Vaz, Parque Maré, Praia de Ramos e Morro do Timbau. Serão perguntas socioeconômicas sobre compra de alimentos para casa, sobre o acesso aos alimentos, e o consumo desses alimentos pelas crianças, além de medir o peso e altura da família. Além das entrevistas nas residências, ocorrerão pesagem dos familiares. “A primeira etapa foi um momento produtivo, em que todos puderam participar da conversa e que venha a pesquisa para a melhoria”, comenta Joyse Gabriel, moradora da Nova Holanda.
Os questionários vão revelar as condições das pessoas que se alimentam em diferentes localidades, especificamente qual a diferença da Maré para a Zona Sul. A terceira etapa tem como objetivo final propor políticas públicas para que a favela possa acessar a alimentação adequada a partir das necessidades percebidas na pesquisa.“Acredito que essa fase foi um sucesso. É muito importante escutar e assim conhecer os desafios e estratégias que são feitas para colocar no prato os alimentos saudáveis. Podemos juntos argumentar com os governantes para a implantação de políticas públicas necessárias”, destaca Sophia Rosa, gerente de saúde em obesidade do Instituto Desiderata.