Lua Brainer entrelaça caminhos de transformações na Maré   

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Mulher trans, travesti e moradora da Vila dos Pinheiros, Lua se tornou uma figura proeminente na cena ballroom do Rio de Janeiro, reconhecida por sua atuação como Legendary Imperatriz

Lua Brainer: mulher trans travesti que ao longo dos anos se tornou o nome de referência quando se pensa na luta pela visibilidade trans nas ruas da Maré. É ela, junto com um coletivo da comunidade LGBTQIAP+, que vem costurando um caminho de transformação político-cultural dentro do território. Moradora da Vila dos Pinheiros desde 1996, ano em que nasceu, Lua se tornou, ao longo dos anos, a figura proeminente na Cena Ballroom do Rio de Janeiro, reconhecida por sua atuação como Legendary Imperatriz.

Educadora na Casa das Mulheres, finalizando sua formação em Teoria da Dança pela EEFD/UFRJ e principal gestora do projeto “Ballroom in Maré”, Lua vive, desde muito nova, em processo de transformação. Começou na dança com aulas de hip-hop no Museu da Maré. Aos poucos, foi descobrindo a cultura ballroom e logo quis mostrar ao mundo o que era aquilo. Os movimentos levaram Brainer para a rua, onde pode aprender e reivindicar o direito de ser um corpo não marginalizado: “Ia pra Lapa muito nova pra participar das balls, mas havia sempre o receio na hora de ir e voltar, por ser um corpo estereotipado e hipersexualizado […] Temos corpos violados pela polícia desde Xica Manicongo, então, enxergo esses espaços como tecnologia para minimizar esses dados”.

Em 2017, ao encontrar, nesta vida, com seu parceiro de luta Kill Bill, bicha preta do Morro do Timbau, Brainer resolveu que iriam juntos trazer o cenário da expressão artística LGBTQIAP+ para a favela. Hoje ela é a Legendary Imperatriz, mas agradece a possibilidade de continuar o legado de travestis da Maré que iniciaram essa história de resistência ainda nos anos 80 e 90, com os shows “Noite das Estrelas”, também resgatado na última década pelo projeto Entidade Maré.

Cena Ballroom

O movimento político Ballroom se iniciou no fim da década de 60 em bairros do subúrbio de Nova Iorque com Crystal LaBeija. O principal intuito era descentralizar os padrões racistas dos concursos para drag queens e trans existentes na época. A nova vertente teria como público-alvo negras e latinas, como é até hoje.

Em 1980, com o surto de HIV, e por consequência, a perseguição a grupos com questões relacionadas ao gênero,  o movimento político-cultural se tornou um refúgio para pessoas que eram perseguidas ou expulsas de casa. Era um novo lar, como uma adoção, por isto, se tornavam “filhos” dos espaços que frequentavam.

Balls na Maré 

Em tradução literal, Ballroom significa “salão de baile”, mas, não há dúvidas de que o movimento sempre foi mais do que um local para se dançar vogue. Com muita música, moda, performance e afeto, a cena Ballroom torna possível um outro olhar para a cena: “é um mecanismo de resgate e acolhimento da comunidade trans e travesti”, salienta  Lua Brainer.

Quando perguntada sobre o que torna a Cena Ballroom carioca singular, Lua responde que se diferencia, principalmente, por incorporar elementos da cultura afro-brasileira, do funk e da estética favelada, criando-se uma identidade que busca interiorizar o que é ser “uma corpa trans de favela”. 

As houses, como são chamados os espaços de encontros, funcionam como lugar de conscientização e proteção para pessoas trans e LGBTQIAP+ que estão em situação de vulnerabilidade ou simplesmente se tornaram pertencentes ao movimento. O principal desejo da Imperatriz é que exista uma house fixa na favela da Maré, para que se solidifique ainda mais a ideia de pertencimento.

Mais do que um movimento artístico, a cultura ballroom é uma rede de apoio e um grito de resistência. Na Maré essa cena oferece visibilidade para aquelas que muitas vezes são marginalizadas pela sociedade. Ao celebrar a cultura ballroom, reconhecemos sua história de luta e sua importância como espaço de pertencimento e arte para a comunidade LGBTQIAP+. Dos quarteirões de Nova Iorque para as ruas da Maré: elas seguem, vivas, autênticas e revolucionárias.

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