Entre moradores e personalidades da história, saiba quem foram os homenageados nas unidades de saúde da Maré
Maré de Notícias #121 – fevereiro de 2020
Por Hélio Euclides
Na edição 83 de dezembro de 2017, o Maré de Notícias mostrou quem são as pessoas que dão nome às escolas. Agora chegou a vez de conhecer a vida por trás dos nomes das unidades de saúde: quem são e qual sua importância para a história da Maré?
O Centro Municipal de Saúde Vila do João leva o nome da favela que foi construída por meio do Projeto Rio. O prédio foi erguido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a primeira administradora do espaço. Em 2007, a Prefeitura assumiu a unidade e fez modificações no espaço. Durante muito tempo, foi a segunda maior unidade de saúde na Maré, já que as outras ficavam dentro dos CIEPs. Hoje, o terreno onde está situado a unidade, na Rua Dezessete, também abriga o Centro de Referência de Mulheres da Maré (CRMM), administrado pela UFRJ e que leva o nome da idealizadora do projeto, a pedagoga e ex-diretora do Conselho Nacional de Direitos da Mulher Carminha Rosa.
A Clínica da Família Ministro Doutor Adib Jatene fica na Vila dos Pinheiros e surgiu depois do fechamento do Posto Médico Gustavo Capanema, que funcionava em sala anexa ao CIEP. O prédio foi inaugurado em 19 de janeiro de 2016 e funciona na Avenida Bento Ribeiro Dantas, na ciclovia, perto do Conjunto Pinheiros. Adib Domingos Jatene nasceu em 1929, em São Paulo. Cirurgião, professor universitário e cientista, foi o criador de uma técnica cirúrgica (que leva seu nome) para o tratamento de problemas cardíacos em recém-nascidos; é dele um dos primeiros modelos de coração-pulmão artificial do país. Foi secretário estadual de Saúde em São Paulo e, por duas vezes, ministro da Saúde; Era membro da Academia Nacional de Medicina. O médico morreu em 2014, vítima de um infarto fulminante.
A Clínica da Família Augusto Boal surgiu da fusão dos postos médicos Vicente Mariano e Elis Regina, que funcionavam dentro de CIEPs. A unidade funciona na Rua Guilherme Maxwell, endereço ocupado anteriormente pelo Serviço Social da Indústria (SESI), próximo ao Morro do Timbau e da Avenida Bento Ribeiro Dantas. A clínica foi inaugurada em 11 de dezembro de 2010, recebendo o nome do dramaturgo Augusto Boal. Nascido na Penha em 1931, foi um dos maiores nomes na criação de um teatro genuinamente brasileiro e latino-americano. É dele o Teatro do Oprimido, que levou aos palcos a realidade brasileira traduzida em gírias, comportamentos, maneirismos e sotaques. O público era convidado a interagir com a trama, decidindo o destino dos personagens. Formou diversos jovens na Maré, organizando grupos de Teatro do Oprimido na favela.
O Centro Municipal de Saúde João Cândido funciona na Avenida Lobo Júnior, em Marcílio Dias, favela atendida inicialmente por profissionais do projeto Médicos Sem Fronteiras até ser criada a unidade municipal de saúde, instalada no prédio da associação de moradores. Mas quem foi João Cândido?
Conhecido como “Almirante Negro”, João Cândido Felisberto nasceu em 1880 e foi um marinheiro notório por ter liderado a Revolta da Chibata, em 22 de novembro de 1910. Na época, os marinheiros, a maioria negros e analfabetos, eram disciplinados através de castigos físicos, como chibatadas (castigo já abolido com o fim da escravidão, mas ainda em prática na Marinha). Depois de tentarem pôr fim à prática de forma pacífica, Cândido e outros marinheiros se amotinaram e tomaram o controle do navio onde estavam. Eles ficaram presos por 18 meses e em dezembro de 1912, os membros do grupo foram levados ao Conselho de Guerra. Mesmo absolvidos foram excluídos da Marinha. Em 1969, aos 89 anos, João Cândido morreu vítima de um câncer. Em 2008, recebeu anistia póstuma e foi reconhecido como herói do Estado do Rio de Janeiro.
Mareenses que nomeiam clínicas
Não apenas personalidades da História do Brasil e da cidade do Rio nomeiam clínicas da Maré. A trajetória de moradores também é lembrada.
A Clínica da Família Jeremias Moraes da Silva foi inaugurada em 2 de março de 2018, na Rua Teixeira Ribeiro, Nova Holanda. A composição das equipes da clínica foi feita a partir da fusão dos extintos postos médicos Samora Machel e Nova Holanda. O primeiro funcionava no CIEP do mesmo nome e o segundo, onde hoje é a Associação de Moradores Nova Holanda e depois, em espaço anexo ao CIEP Elis Regina.
O nome da unidade de saúde lembra um dos momentos mais tristes da Maré: a morte de Jeremias, morador de 13 anos da Nova Holanda, atingido por uma bala perdida quando chegava na casa de sua professora de música, durante operação da Polícia Militar, em 6 de fevereiro de 2018. Passados três anos, a única novidade no caso foi a nomeação da unidade, que precisa de gerador para ter energia elétrica. Por diversas vezes, a clínica ficou sem atendimento por falta de luz. A nova administração municipal prometeu resolver a questão, num encontro entre presidentes de associações de moradores e o subprefeito no final de janeiro.
A Clínica da Família Diniz Batista dos Santos foi inaugurada em 7 de fevereiro de 2018, na Avenida Brigadeiro Trompowski, no Parque União. A unidade nasceu depois do fechamento dos postos de saúde Parque União e Hélio Smidt, que funcionavam na associação de moradores e no CIEP de mesmo nome, respectivamente. Apesar de funcionar há dois anos, até hoje o acesso à clínica se dá por meio de passarela com degraus, o que prejudica o atendimento de idosos e pessoas com deficiências. Quem dá nome à unidade é Diniz Batista dos Santos, nascido no Nordeste em 1926. Em 1951, chegou ao Rio de Janeiro em busca de trabalho, morando nos oito anos seguintes nas palafitas da Baixa do Sapateiro. Já casado e com filhos, mudou-se para o Parque União e, com espírito empreendedor, abriu um armazém e uma empreiteira, que empregava muitos moradores. Criou 11 filhos e dois sobrinhos, morrendo em 2008. “Quando estavam procurando um nome para a clínica, minha irmã apresentou a trajetória dele e a Prefeitura aprovou. Ele foi um grande herói da história da Maré. Tenho orgulho de ser filha dele”, conta Vilma Santos.
O Centro Municipal de Saúde Américo Veloso funciona na Rua Gerson Ferreira, na Praia de Ramos, desde 1970. Com a criação do bairro Maré, a unidade deixou de fazer parte de Ramos (onde atendia moradores do bairro e do Complexo do Alemão) e foi incorporada ao conjunto de favelas, tornando-se a primeira unidade de saúde. Em 2011, com o fim do Posto Médico 14 de Julho, que funcionava no CIEP Leonel de Moura Brizola, sua equipe foi incorporada à unidade. O posto homenageia o médico Américo Veloso, morador da favela, que atendia a comunidade de forma gratuita. Além disso, foi dele a iniciativa de conseguir, junto aos vereadores, o terreno onde hoje funciona o centro municipal de saúde que leva seu nome.
A saúde mental das crianças
Com o fechamento do Posto Médico 14 de Julho, foi aberto um novo espaço de saúde, o Centro de Atenção Psicossocial Infantil Visconde de Sabugosa, na Avenida Guanabara, para o atendimento de crianças e adolescentes com transtornos mentais graves e persistentes. Seu nome vem da maior obra de Monteiro Lobato, a série de livros “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”: o Visconde de Sabugosa é um boneco feito de uma espiga e, por isso, é sempre o escolhido para as missões que envolvem perigo – se terminasse destruído, outro boneco era feito de uma espiga nova.
Unidades de Saúde da Maré:
Clínica da Família Jeremias Morais da Silva
Rua Teixeira Ribeiro s/n – Nova Holanda
Clínica da Família Diniz Batista dos Santos
Avenida Brigadeiro Trompowski, SN – Parque União
Clínica da Família Adib Jatene
Via B/1, 589-501 – Conjunto Pinheiros
Clínica da Família Augusto Boal
Avenida Guilherme Maxwel, 901- Bento Ribeiro Dantas
CMS Américo Veloso
Rua Gerson Ferreira, 100 – Praia de Ramos
CMS Vila do João
Rua 17 s/n, Vila do João
CMS João Cândido
Av. Lobo Junior, 83 Marcílio Dias
Unidade de Pronto Atendimento UPA
Rua Nove, 4.880 – Vila João