O papel dos jornais comunitários na Rocinha e na Maré na luta contra estereótipos e desigualdades
Por Michel Silva
Maré de Notícias #150 – julho de 2023
Os jornais impressos e digitais de favelas do Rio de Janeiro herdaram as pautas de outras mídias comunitárias que existiram nas décadas de 1980 e 1990. A pauta é como um guia que nos ajuda, como jornalistas, a decidir quais notícias ou histórias devem ser contadas.
Cresci vendo minha favela sendo mostrada pelas mídias tradicionais como um lugar violento, em que as pessoas não tinham perspectivas de vida e nem direitos básicos, como saneamento. Apesar das notícias, eu como morador sempre soube que a Rocinha era lugar de coisas boas e ótimas histórias, que mereciam ser mostradas e contadas. São dessas dores geradas pela desigualdade e falta de visibilidade que nascem os jornalistas de favelas, e foi assim que eu e outros jovens fundamos o jornal Fala Roça em 2013.
O papel do jornalismo comunitário é ampliar vozes e dar visibilidade a questões que afetam a vida dos moradores da localidade. No Fala Roça, chamamos de jornalismo de favela, para reafirmar a importância histórica desses territórios; muitas vezes, nosso papel é contrapor as narrativas das mídias hegemônicas.
O Maré de Notícias e o Fala Roça fornecem informações relevantes todos os dias sobre infraestrutura, acesso a serviços básicos, questões de segurança, atividades culturais e eventos comunitários. São assuntos que nem sempre ganham a atenção da chamada grande imprensa. E quando acontece, muitas vezes é porque a pauta partiu de nós.
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Fazemos jornalismo há dez anos na Rocinha e perdemos as contas de quantas reportagens escrevemos sobre injustiças e desigualdades. O lixo, por exemplo, é um assunto recorrente por aqui e por aí também. Em vez de só culpar o morador, produzimos reportagens contextualizadas, apontando responsáveis e cobrando de quem deve tomar providências.
O jornalismo de favela também é um aliado no fortalecimento comunitário porque cria um senso de coesão, traz informações para as reuniões das associações e compartilha histórias de moradores e seus projetos sociais. No início da pandemia de covid-19, o Fala Roça não só combateu à disseminação de notícias falsas, como também doou milhares de cestas básicas.
A gente mora, vive, sente a favela todos os dias. O jornalismo é aliado da favela quando bem utilizado. Parafraseando o pesquisador Marco Morel, no livro Jornalismo Popular nas Favelas Cariocas, “engana-se quem pensa que por trás dessas folhas de jornal estão apenas uma imitação barata da mídia tradicional. Nesses jornais de favelas estão a História do Povo”.
Que venham mais edições dos jornais mais queridos da Maré e da Rocinha!