Especial por Lucas Veloso, em Guaianases – São Paulo
Em Guaianases, zona leste da capital paulista, como nos bairros aqui perto, a pandemia impactou diretamente as pessoas, sobretudo os mais pobres. Uma das consequências mais nítidas pode ser vista na vida dos imigrantes que vivem por aqui. Em grande parte, sem documentos necessários para acessar serviços públicos e outros direitos, vivem na informalidade e contam com doações de alimentos para sobreviver nestes últimos meses. Muitos não receberam o auxílio emergencial por não estarem cadastrados em programas assistenciais da prefeitura. Sem escolas, as crianças ficaram com a dieta ideal comprometida e a própria educação, já que computadores ou celulares não são equipamentos de fácil acesso para elas.
A falta de políticas públicas para que as pessoas fiquem em casa também é um ponto a ser considerado. Alguns líderes comunitários com quem falei nos últimos meses disseram que não houve quarentena nos bairros, pois as ações que poderiam ter sido implementadas não foram colocadas em prática. Um exemplo: os ônibus e trens continuam a operar cheios, apesar das concessionárias dizerem que aumentaram a frota. Se o ônibus está cheio, como fazer o distanciamento social? E o uso da máscara e do álcool em gel? Aqui, uma máscara custa R$5 e para muita gente é muito dinheiro, ainda mais com a alta no preço dos alimentos e o fim do auxílio emergencial – que manteve minimamente algumas famílias atendidas.
A Coalizão Negra por Direitos – uma aliança que juntou cerca de 200 grupos do movimento negro do país – propõe uma agenda para os próximos meses, como o retorno do auxílio emergencial imediatamente, além de outras medidas para diminuir o impacto da crise entre os mais pobres, que em sua maioria é negra. Por isso, é necessário ouvir moradores das favelas e periferias, além de profissionais da linha de frente desses territórios. É um passo essencial para encararmos o combate ao vírus, que tanto escancarou a desigualdade social, tão presente no país, mas ignorada por aqueles que deveriam combatê-la, mas não o fizeram. Carolina Maria de Jesus disse que o Brasil precisa ser dirigido por alguém que já passou fome. Concordo com a escritora, ainda mais neste momento.
Lucas Veloso é um dos co-fundadores da Agência Mural, iniciativa que tem como missão minimizar as lacunas de informação e contribuir para a desconstrução de estereótipos sobre as periferias da Grande São Paulo. É jornalista atua como repórter na própria agência, além de colaborar em outros veículos de comunicação, como Folha de São Paulo, RioOnWatch e Alma Preta.