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Luta constante por dignidade

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No mês do Dia Internacional dos Direitos Humanos, o Maré de Notícias inicia uma série de reportagens sobre o tema

Por Edu Carvalho

Num jogo rápido, responda: morador de favela tem direitos? Se você demorou mais de três segundos para responder à pergunta é porque sabe que, historicamente, a população periférica sempre esteve distante da maior parte das garantias constituídas por lei. Se elas deveriam ser válidas para todo e qualquer cidadão, independentemente do lugar onde vivem, quando se trata do território favelado e preto usufruí-las se torna um desafio. 

Dezembro é marcado pelo Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado dia 10 deste mês. Ele faz parte do calendário desde 1948, quando foi promulgada a Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Na data, ações espalhadas pelo mundo alertam sobre a garantia dos direitos tidos como fundamentais descritos na Declaração. Desde seu surgimento, a história da Maré é a trajetória da luta pela disseminação dos direitos humanos para todos.

E assim é feito através de mobilizações em diversos aspectos, como o #VacinaMaré (pela vacinação contra a covid-19), Rema Maré (saúde mental), além de Maré Diz Não Ao Coronavírus; o Maré Que Queremos e o Azulejaria, projetos por direitos urbanos e ambientais; Robótica, pela educação; Maré de Direitos e Maré Sem Fome, programas ligados à segurança pública e alimentar.

Direito à vida

Uma campanha que ajuda a responder à pergunta inicial completou dez anos de realização em 2022: Somos da Maré, Temos Direitos foi criada pela Associação Redes da Maré em 2012 para garantir, nas favelas, os direitos à vida e à segurança. 

“Quando a campanha foi lançada, a Maré estava entre as áreas prioritárias da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro para receber uma Unidade da Polícia Pacificadora (UPP). Muitas favelas com essas unidades relataram frequentes situações de violações de direitos por parte dos agentes da segurança pública”, conta Maykon Sardinha, coordenador do eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça. 

A luta por direitos na Maré é anterior às UPPs, como conta Eliana Sousa, diretora da Redes. Em 2012, a associação promoveu a campanha de conscientização e comunicação sobre o que os agentes da segurança pública podem e não fazer durante uma abordagem policial. 

“Se a gente for olhar para os direitos, as políticas de segurança pública e de justiça são aquelas que estão mais distantes da realidade de quem vive nas favelas e periferias”, diz Lidiane Malanquini, também coordenadora do eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça e testemunha da criação do eixo e do desenvolvimento da campanha. 

Segundo Lidiane, as experiências dos moradores de favela, através de relatos colhidos, são sempre ligadas à violência, o que naquele momento fez com que a ONG criasse um setor específico para trabalhar o tema: “Não tinha como a gente investir na ampliação de vários direitos e não trabalhar a segurança pública.”

Moradores na luta

Ao longo dos anos, com o diálogo efetivo junto aos moradores, uma melhor e maior compreensão no debate foi estabelecida, com articulações comunitárias que pautaram um antes e depois da vida na Maré. Marcos históricos, como a mobilização depois da chacina no Parque União em 2013, e a ocupação do Exército em 2014 por 15 meses, fizeram com que a campanha ficasse ainda mais urgente. 

“Podemos afirmar que essa ocupação não trouxe melhorias para as condições de segurança pública no território”, diz Patrícia Viana, coordenadora das Ações de Enfrentamento e Monitoramento das Violências do eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça. Patrícia explica que a campanha mobilizou o morador e fortaleceu o seu protagonismo na luta pela garantia de direitos. Um trabalho bem planejado resultou na entrega de cartilhas de porta a porta, além de outras iniciativas. 

O movimento ganhou fôlego em 2016 (um ano antes histórica Marcha Contra a Violência), quando foi criado o projeto De Olho Na Maré para coletar e sistematizar dados de violência nas 16 favelas do conjunto. Ainda em 2016, a insatisfação dos moradores com as frequentes violações de direitos cometidas por agentes da segurança pública chegou à Justiça através de uma Ação Civil Pública — ela trata de direitos difusos e coletivos — como forma de protestar por um direito coletivo.

“A ACP da Maré é um exemplo de como a mobilização por uma causa é peça fundamental para a consolidação de ações concretas que garantam a melhoria da qualidade de vida local”, diz Maykon Sardinha. 

Conhecimento é poder

A proximidade com os moradores tornou possível, no fim daquele ano, produzir o primeiro Boletim de Segurança Pública, com dados inéditos relacionados às operações policiais e seus desdobramentos. 

Com o mote “É preciso estar vivo para viver”, a terceira edição da campanha busca entender e dar visibilidade aos impactos da política de segurança pública na vida de quem mora no território.  “O objetivo era mostrar para as pessoas que a violência atravessa o cotidiano delas. Nas oficinas, pedimos às pessoas para que escrevessem seus sonhos, e conforme íamos perguntando sobre a violência, elas se afastavam’’, relembra Shirley Rosendo, coordenadora do eixo Direitos Urbanos e Socioambientais da Redes da Maré. 

Ela acredita que a luta e o engajamento da população mareense se dá de maneira contínua. “As pessoas da Maré estão lutando por direitos. E diante da ausência deles, acabam se tornando sonhos.” 

Direito, não privilégio

Para Maykon, um dos focos do trabalho é fazer com que o morador se reconheça não como quem exige um privilégio, e sim luta para a efetivação daquilo que é seu por direito: “É preciso que haja um engajamento de toda a sociedade, reconhecendo que as favelas são parte da cidade e que seus moradores são cidadãos plenos.” 

Arthur Viana, coordenador da campanha Somos da Maré, Temos Direitos!, concorda: para ele, os próximos passos da campanha giram em torno do aprofundamento do diálogo entre moradores e agentes de segurança, explicando de maneira ainda mais didática as questões relacionadas ao assunto.

”Segurança pública vai muito além dos efeitos da violência armada. Existem outros impactos, como direitos básicos que são afetados dentro das favelas por essa falta de garantias. Vamos levar a todos, usando diferentes metodologias e ferramentas, essas informações”, diz.

Pensar a questão climática da Maré ao Egito

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Cria dos territórios, Vinicius Lopes integrou a delegação da Coalizão O Clima é de Mudança que foi à COP 27 debater justiça climática e ambiental

Por Edilana Damasceno


“Para uma pessoa preta e vinda de favela como eu, é muito importante ocupar esse espaço.” Aos 23 anos, Vinicius Lopes encarou 22 horas de viagem entre o Rio de Janeiro e a cidade egípcia de Sharm-el Sheikh para participar da 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), também conhecida como Conferência das Partes ou apenas COP27. 

Vinícius integra a equipe do Cocôzap (projeto de participação social, incidência e geração cidadã de dados sobre saneamento básico em favelas do data_labe) e participou da delegação composta por sete integrantes da Coalizão O Clima é de Mudança. Esse grupo (formado por data_labe, LabJaca, Plataforma CIPÓ, Agenda Realengo 2030 e Visão Coop) é fruto do desejo das cinco instituições nacionais de pautar e complementar o debate climático a partir de perspectivas periféricas e faveladas. 

A Conferência das Partes é resultado da Convenção Quadro das Nações Unidas para Alterações Climáticas (um tratado de 1992), uma medida estabelecida para que todos os países-membros possam se reunir anualmente para debater, repensar e discutir mudanças climáticas no planeta. Trata-se de uma tentativa de estabelecer medidas que melhorem ou estabeleçam a situação climática e ambiental em que a Terra se encontra. 

Confira na entrevista abaixo as impressões de Vinicius sobre sua participação na COP27.

Quais foram suas impressões sobre os sete dias da COP27?

A COP do Egito não foi só distante em termos geográficos. Um dos grandes impactos que nós da Coalizão sentimos foi sobre como é difícil nos situarmos por conta do acesso a eventos desse tipo. Foi complicado entender o processo de como as discussões se davam, a dinâmica dos debates. Quando a gente começava a entender o fluxo das coisas, elas já tinham acabado. 

Deu claramente para perceber que quem está nesse rolê há mais tempo conseguia extrair o máximo dali; assim como nós, quem estava chegando ficava um pouco mais perdido. Então a minha primeira impressão foi a de que a COP27 era um lugar difícil de entender a dinâmica.

A impressão final é a de que foi muito incrível, mas a gente precisaria de mais tempo para entender, para circular, para estar ligado como tudo funciona, para onde a gente vai, quando ir, o que assistir — se uma mesa redonda ou alguma negociação, se a gente vai em um protesto ou precisa ir pra outro evento em outra área.

A Coalizão O Clima é de Mudança é composta por  jovens que, assim como você, são crias de territórios marginalizados. Como foi participar do debate climático?

Como pessoa preta e que veio de favela, estar ali e participar daquele debate representou simbolicamente uma vitória. Na coalizão, quase todos eram de territórios marginalizados e pretos. Vimos na COP27 uma galera de favelas e periferias, assim como representações indígenas — mas éramos cem, 200 pessoas para milhares de brancos e de países europeus. A conta não fechava. 

Acho que esse é o lugar da juventude que está olhando para o clima, para o meio ambiente e que vem desses espaços que não são somente formados por pessoas brancas ou com um alto poder aquisitivo. É preciso estar nesses espaços e se manter neles. Mostrar que se pode não só ouvir, não só fazer pressão, como também participar de debates muito qualificados, sabe? 

É sair um pouco desse lugar de objetos, ou até de coitados, como somos colocados, para de fato ocupar, pautar o debate e mostrar nossos pontos de vista. É sobre hackear o debate.

Qual momento foi mais especial ou marcante?

Um dos momentos mais marcantes foi a primeira fala do presidente eleito Lula, que trouxe muita perspectiva de abertura para a sociedade civil. Foi um momento em que a COP parou, todo mundo parou por pelo menos quinze minutos para ouvir o que o Lula tinha a dizer. Todo mundo se reuniu em frente ao pavilhão onde o Lula falaria. 

Agora a gente consegue ter uma perspectiva do que será o Brasil, para além de partidos políticos, além de qualquer coisa — a perspectiva de sermos inseridos na pauta ambiental e climática. Até agora e por muitos anos, a gente ficou de fora, então é muito simbólico esse movimento.

Vinicius aproveitou a oportunidade para falar com o presidente eleito – Foto: Ricardo Stuckert

Qual foi o impacto dessa fala do presidente eleito Lula?

Do início dos anos 2000 até 2013, o Brasil foi um dos países com mais presença para pensar em meio ambiente, pra pensar em clima. Tinha voz e a fala dele era muito importante. Era um país que as pessoas ouviam. Com o tempo, isso se perdeu. O momento da fala do Lula foi aquele de todo mundo pensar: “E aí, será que vai mudar alguma coisa? Será que o Brasil vai voltar a ser um Brasil como antes?” Acho que esse foi um dos momentos mais marcantes.

Quais são as expectativas para o futuro ambiental das periferias e para o combate ao racismo ambiental?

Um dos compromissos do presidente eleito foi uma reunião com a sociedade civil brasileira, na qual puderam participar cerca de 150 pessoas de diferentes organizações, e que foi transmitida do lado de fora para quem não conseguiu entrar na sala. Nós da Coalizão estávamos lá e a gente pôde acompanhar tudo de pertinho. Basicamente essa reunião foi para que o presidente Lula pudesse escutar a sociedade e todos pudessem ter um momento de troca mais ativa. 

Nessa reunião, algumas lideranças falaram mais, como uma representação indígena, o Douglas Belchior, da Coalizão Negra por Direitos, e a Thuane Nascimento, do PerifaConnection, falando a partir da favela. 

Logo, o racismo ambiental foi muito falado, de como essas questões climáticas chegam em locais de favela. A Thuane deixou isso marcado no discurso dela, assim como o Douglas — o Lula pôde, com certeza, dimensionar o racismo ambiental a partir da perspectiva periférica.

Entre as reivindicações, quais as mais relevantes?

Em outros espaços da COP 27 também houve muitos protestos pedindo justiça ambiental e climática. Até porque estava todo mundo muito olhando para esse conceito de perdas e danos [o prejuízo efetivamente sofrido, e o que o prejudicado deixará de ter em razão do que causou a perda], que por mais que não aponte diretamente para as favelas e periferias brasileiras também fala delas, uma vez que tratam de comunidades vulnerabilizadas.  

Esse conceito de perdas e danos basicamente diz respeito a locais que vão ser duramente afetados pelos efeitos negativos das mudanças climáticas, e não há adaptação que possa impedir os danos. Nesse sentido, já tem locais (como as Ilhas Fiji, no oceano Pacífico) que  estão sendo inundados por conta do aumento do nível do mar. 

Mas a gente não precisa ir tão longe. As favelas e periferias também já estão sofrendo um grande impacto das mudanças climáticas. Aqui na Maré a gente vê, cada vez mais, como as chuvas fortes e inesperadas têm deixado as favelas inundadas por dias, fazendo até com que famílias percam tudo que têm quando a água entra nas casas com tudo. 

O que você sente que acontecerá depois desses debates, principalmente no Brasil? 

A expectativa para o Brasil e para o mundo é olhar para as comunidades marginalizadas e historicamente mais afetadas pelos efeitos negativos da crise climática. Essa foi, definitivamente, a COP da Justiça Climática, ou seja, aquela em que o mundo todo entendeu que é necessário não só olhar para quem vai ser mais afetado como tomar iniciativas. 

Um dos resultados da COP 27 foi um acordo de um fundo de financiamento para perdas e danos. Esse resultado possibilita que o Sul Global (os chamados países de terceiro mundo) consiga fazer frente às mudanças climáticas ou pensar em maneiras de se adaptar ou, ao menos, compensar quem vai ser atingido duramente pelos efeitos dessa crise — gente que vai sofrer os efeitos de secas e enchentes. 

O Brasil é um dos países incluídos aí, e durante as negociações também se colocou favorável à criação desse fundo de perdas e danos. Com a eleição do Lula, os pronunciamentos já foram no sentido de trazer o Brasil de volta para as discussões sobre clima e meio ambiente. 

O que se espera é que os compromissos firmados pelo governo de transição e pelo presidente eleito (ouvindo a sociedade civil, os jovens, as periferias, por exemplo) sejam o fio condutor das políticas ambientais dos próximos anos. Além disso, Lula ofereceu, na COP27, o Brasil como palco da COP30, que acontecerá em 2025.

Portão da COP27, conferência do clima da ONU realizada no Egito neste ano – Foto: Mathew Tenbruggencate / Unsplash

Primeira Flup na Maré se encerra com final do Slam BR

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Por Amanda Célio, Hélio Euclides e Samara Oliveira

Com o tema Maré de Periferias, festa literária traz à favela um grito contra a violência de gêneros

Um espaço de cultura e lazer, que ao mesmo tempo traga temas para a reflexão e criação de ações de avanços nos territórios. Essa foi a 12ª edição da Festa Literária das Periferias (Flup), que desembarcou no Centro de Artes da Maré trazendo temas que precisam ser debatidos. 

Antes, no domingo (4) foi realizado no Museu de Artes do Rio, na Praça Mauá, o Dia da Escuta. O resultado das oficinas e roda de conversas foram apresentados no segundo dia da festa com direito a mesa de debate e exposição no Centro de Artes da Maré.

A Maré de Periferias trouxe a mesa “Escutatórias afetivas por um Museu da Sororidade”, que reuniu artistas do Coletivo de Mulheres da Universidade das Quebradas (UQ). O Projeto de extensão Laboratório de Tecnologias Sociais UQ realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) tem como metodologia a troca de saberes, práticas de criação e produção de conhecimento, articulando experiências culturais e intelectuais produzidas dentro e fora da academia.

Na segunda-feira (5), o evento deu sequência à programação com uma saudação aos Orixás, que consiste em cantigas em culto a todos os Orixás. Exu, Ogum, Oxum e Yansã foram representados por bailarinos  ao som do atabaque, conduzidos por lideranças de religiões afro, finalizando com um toque relembrando os ancestrais africanos que foram escravizados.

Na sequência houve o lançamento do livro “Pai Santana: Orixá do Futebol” escrito pelo co-fundador da FLUP Ecio Salles que morreu em 2019 vítima de um câncer no pulmão. O livro foi autografado no evento por Roberto Santana, filho mais velho de Eduardo Santana, mais conhecido como Pai Santana. O ex-massagista do Vasco da Gama faleceu em 2011, aos 77 anos, vítima de insuficiência respiratória.

Pela primeira vez na Maré, Santana contou que está feliz em lançar o livro que conta a biografia de seu pai que “era respeitado como um jogador pela torcida”.

Violência contra as mulheres

Na terça-feira (6) uma das dinâmicas foi a realização da mesa que trouxe o tema violência contra as mulheres, no qual debateu o trabalho da escuta realizado com mulheres, com a formulação de depoimentos que foram transformados em formas de artes. As participantes da mesa disseram que saíram fortalecidas com a escuta. Lourdes Maria, professora de escola pública por 40 anos, destacou que uma das motivações para a realização da oficina foi o trabalho com a autoestima feminina. Já Ana Carla Rosa, professora de sociologia, destacou que foi muito importante se pensar no que fazer com as falas das mulheres. “Percebemos um papel social nas oficinas e sentimento. Ninguém chega pronta para falar, mas o que pensamos tem eco, não estamos sozinhas. A oficina foi algo significativo”, diz.

Flup funciona para poder potencializar essa juventude, diz Geovani Martins

Na quinta-feira (8) o papo sobre necropolítica rolou com os escritores Geovani Martins e Jessé Andarilho, com a mediação de Thais Custódio.Geovani emocionou ao dizer que a Flup era das feiras mais bonitas quando não a conhecia, e depois que conheceu, teve ainda mais certeza. “Escrevia imitando outros autores que tinha acesso, que eram os autores da literatura brasileira. A minha realidade é interessante e potente. Foi libertador entender que a primeira camada da Flup na minha formação foi a construção da minha identidade”, disse Geovani Martins

Quem venceu? Quem tá no topo, pergunta Jessé Andarilho?

Jessé lembrou que o Brasil é uma ideia muito distante que precisa ser colocada em prática. “A gente vive até hoje num país que foi construído imageticamente por muito pouca gente. Na verdade você tá falando de uma elite cultural que está pautando isso tudo. Por que essa lógica capitalista de “dizer que a favela venceu”? A gente tá ocupando esses espaços, a gente não precisa disso. Temos que falar a favela vencer: vencer escritora, vencer cineasta. Vencer”, afirmou o escritor. 

SLAM: o grito sem notas e melodias

Afinal, o que é o Slam? O que caracteriza um? Na tentativa de sintetizar o que são slams ou poetry slams, como eram originalmente chamados, a própria Flup explica que “são competições de poesia falada, batalhas performáticas das quais participam poetas munidos de textos autorais, de até 3 minutos, sem acompanhamento musical, cenário ou figurinos e com a participação de um júri popular.”

Em um teste para cardíaco com uma competição que teve o total de quatro empates sendo três entre os dois últimos competidores, Cotta! o representante do Rio de Janeiro se consagrou campeão com o segundo lugar ficando para Matriarck, representante de São Paulo. Em poucas palavras para definir o que esperavam da final, os jurados previram “potência periférica, pluralidade, poder da palavra e força feminina”. 

As classificatórias do campeonato começaram na terça-feira (6).

E desse jeito se deu a competição. A potência periférica dos participantes foram evidenciadas em diversas poesias que contavam as vivências das comunidades, a força feminina ficou ao cargo de Apêagá, Matriarck e Tawane Theodoro, a pluralidade, assim como o poder da palavra, se fez presente em todos os participantes composto por homens e mulheres cis e transgêneros que se emocionaram e emocionaram também os jurados e o público presente.  

“Isso é a realização de um sonho. Esse sonho não é só meu, é de todos os poetas que estão aqui e sei que todos eles estavam prontos para realizarem esse sonho também. Todo mundo que está aqui tem espaço e são grandes artistas”, afirmou o vencedor Cotta!.

Matriark complementa “Como o Cotta falou isso é um sonho para mim, para ele, para o Rio, para SP, para Minas, para o Brasil inteiro… isso é Slam BR. Foi difícil, quatro empates e eu já estava perdendo a conta. Mas tudo isso tem um impacto e uma responsabilidade muito grande que é levar poesia falada para as pessoas. Só tenho a agradecer. Axé para quem é de Axé”.

Apêaga, também representante de São Paulo, chegou a empatar com Cotta e Matriarck mas acabou ocupando o não menos importante terceiro lugar. Em seguida, Malokeko (SP), Bê Machado (RS) e Tawane Teodoro (SP), ocupando a quarta, quinta e sexta posição, respectivamente.

Slam Colegial 

“Foi na escola que aprendi que posso ser a maioral: SLAM COLEGIAL, SLAM COLEGIAL” esse é o “grito de guerra” do Slam Colegial que aconteceu na Flup na última quarta- feira (7) e consagrou como campeã Stacy Ferreira, de 19 anos, representante da ONG Luta Pela Paz. Estreando no mundo slam, Stacy conta emocionada como se sentiu. 

“É algo surreal porque eu nunca tinha mostrado meu trabalho para ninguém. E só de mostrar eu já me sentiria super vencedora por mostrar algo que é meu pela primeira vez. Estrear como campeã é super inexplicável”, afirmou.

O Slam colegial se caracteriza como um movimento de formação e divulgação da poesia nas escolas públicas. Os jovens que competiram passaram por uma oficina de dois meses para se prepararem para as disputas até a final.

O campeonato contou com jovens representantes da Escola Bahia, Ciep Professor Cesár Pernetta, Escola Municipal Tenente General Napion, Conselho Jovem da ONG Luta pela Paz e Preparatório Redes da Maré. A competição foi acirrada e decidida por décimos de diferença entre todos os competidores. 

Se você perdeu as competições pode assistir clicando aqui o Slam BR e o Slam Colegial

Chave de ouro

Para fechar a Flup na Maré com chave de ouro, Anielle Franco lançou seu livro: “Minha irmã e eu: diários, memórias e conversas sobre Marielle”. A Mostra Maré de Música, projeto da Redes da Maré, apresentou talentos com a Banda Agona, Gutierry, Mc Natalhão e Nizaj e N.I.N.A. do Porte.

Grupo de mulheres mapeia situação dos animais abandonados na Maré

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Como a falta de informação gera riscos.

Por Ana Beatriz Pires

Com quantos animais em situação de rua você cruza no percurso da Avenida Brasil até a sua casa? Destes quantos você consegue identificar que estariam com ferimentos? Essas perguntas e o espírito de ajuda tocaram um grupo de quatro mulheres (Alexandra, 48 anos; Ana Lúcia, 50 anos; Elaine Oliveira, 31 anos e Luciana Pires, 48 anos) moradoras do Conjunto de Favelas da Maré. A partir daí, as quatro se mobilizaram e passaram a refletir sobre o que poderiam fazer para amenizar o cenário.

No último ano, as mulheres se reuniram para cuidar de gatos abandonados e que ficavam próximo ao local em que residem. Dois deles estavam com uma moléstia chamada esporotricose (micose subcutânea) e que foi diagnosticada por uma razão: em 2019, uma das envolvidas no projeto voluntário teve o cachorro infectado pela mesma doença. E, durante o tratamento do animal, descobriu que além da enfermidade ser transmitida através de arranhões e mordidas entre cães e gatos (quando o transmissor está infectado), a doença é uma zoonose – pode ser transmitida para seres humanos.

Elas contam que os animais, que foram identificados primeiro com a doença, eram muito agressivos. Como eles viviam em uma área com presença de outros animais, os embates se tornavam frequentes. E a transmissão também. Assim, na prática, dois gatos doentes passaram a ser 4 em menos de 1 mês. Um ritmo multiplicador perigoso.

A decisão de começar a rede de apoio para buscarem tratamento para esses animais doentes se tornaria urgente quando notaram que as crianças, desconhecendo os perigos, brincavam com eles todas as vezes que estavam na rua.

Muitas obrigações

Mas o início do trabalho não foi fácil. As quatro voluntárias se viram confrontadas por diversos desafios. Além das questões e obrigações pessoais e profissionais de suas vidas cotidianas, se viram com novas incumbências. Como já conheciam os caminhos para chegar aos medicamentos apropriados para o tratamento da doença, precisavam ir até o local. Entretanto, as exigências legais impõem que só é possível cadastrar dois animais por CPF. Na época, as mulheres estavam tratando de 4 gatos doentes e apenas uma delas tinha condições de ir até os locais que forneciam o remédio e o tratamento.

No site da prefeitura é fornecido instrução para conseguir acesso gratuito a medicação adequada, entretanto, apresentam apenas dois locais de referência: o Centro de Controle de Zoonoses, que fica  no Largo do Bodegão, 150, em  Santa Cruz e o Centro de Medicina Veterinária Jorge Vaitsman,  localizado na Avenida Bartholomeu de Gusmão, 1120, em São Cristóvão.  Em ambos os lugares há a exigência que o animal doente vá junto. “’É indispensável a presença do animal para a retirada do medicamento”, reitera o site. Isso dificulta ainda mais o acesso ao tratamento. Afinal, muitos dos animais são agressivos e, por não terem donos, são de difícil localização.

As mulheres conseguiram curar dois dos quatro gatos, um desses acabou adotado e o outro elas não têm notícias pois continuou na rua e depois de curado não voltou a aparecer na região. Há uma esperança de que tenha sido adotado por algumas razões positivas: já não tinha feridas, era castrado, o pelo estava saudável e ele era muito dócil. As quatro mulheres permanecem ajudando animais da comunidade como podem. Uma resgatou mais de 10 e colocou em sua casa. Outra, os alimenta, enquanto as demais  tentam ajudar a levar informações que reduzam danos aos pets, como campanhas de castração e vacinação local.

Em 2021 foi lançado um boletim pela Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro. Trata-se da Gerência de Doenças Transmitidas por Vetores e Zoonoses (GERDTVZ) e outras referências no assunto. No levantamento é apontado um cenário menos preocupante sobre a doença: entre  2019 e 2020 houve uma queda no número de infectados. Entretanto, o município do Rio de Janeiro permanece com o maior número de casos registrados.

A doença chega com certa facilidade aos animais e até às pessoas, mas o acesso às informações permanece lento. Uma das dificuldades pode ser verificada no âmbito oficial: não há campanhas de conscientização como informações sobre a doença nos sites do governo, por exemplo. Algo que poderia ser feito com muita facilidade.

A partir da rede de apoio que o grupo produziu, uma outra iniciativa promovida por uma mulher da mesma comunidade acabou emergindo. Ela ajuda, dentro das suas limitações, animais abandonados/de rua, cedendo a casa por um valor simbólico para que  passem por castração e tenham um lugar para ficar durante o pós-operatório.

Mesmo que o grupo possua uma potência e capacidade de impacto indiscutível na ação que se propuseram a realizar, as mulheres relataram a falta que sentem da presença do Estado na conscientização sobre as questões e riscos que atravessam. Elas acreditam que com as informações sobre as consequências do abandono de animais, a importância da castração e características das doenças, modos e lugares de tratamento chegando até a população, diminua e assim o risco de doenças perigosas, como a esporotricose, se torne mínimo. E fazem um apelo: o acesso à informação é capaz de alimentar a empatia das pessoas.

Moradores da Maré estão sem água há mais de 20 dias

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Falta de abastecimento também afeta outros bairros da Zona Norte da cidade

Moradores das regiões do Parque União, Nova Holanda e Rubens Vaz, do Conjunto de Favelas da Maré, estão sem água há mais de 20 dias. Há relatos de que nos últimos seis dias a falta d’água aumentou nessa regiões e, segundo apurou o Maré de Notícias, desde o último sábado (10), a falta de abastecimento já afetava também toda a Maré e outras localidades da Zona Norte. 

O MN também falou com alguns funcionários que se identificaram como responsáveis técnicos da Águas dos Rio e explicaram que a falta d’água começou devido a manutenção anual do sistema Guandu, que abastece a região, realizada no final de novembro. Na sequência foram identificados que comportas haviam sido arriadas e que para reparar foi criado um novo braço de água de sexta para o sábado, que também foi danificada e refeita hoje.

Para amenizar a falta de água, a concessionária Águas do Rio, que é responsável pelo abastecimento, está fornecendo desde sábado, caminhões pipa para caixas d’água espalhadas na Maré. Os moradores relatam que precisaram comprar água para beber e buscar água nos locais abastecidos por carros pipa.

Dona Vanise, de 54 anos, desempregada, contou que  nunca tinha ficado tanto tempo sem água. A moradora do Nova Holanda sofre de dores no ombro e não consegue levar água até o terceiro andar de sua casa. Além disso, Vanise conta que o carro pipa está passando só na rua principal da localidade, ficando distante e gerando longas filas para conseguir água: “É muita gente, a população é grande, tinha que ser um o carro pipa mais próximo aqui da rua Bittencourt Sampaio, ontem não tinha condições aqui, as pessoas cansadas do trabalho da semana e a fila indo lá na padaria” afirmou.

Em nota, a  Águas do Rio informou que concluiu o reparo do vazamento na adutora da Maré, na manhã desta segunda-feira (12) e disse que “segue atuando em um ponto de Manguinhos e, após a finalização do serviço, o abastecimento será retomado de forma gradativa nas comunidades e bairros impactados na Zona Norte. A concessionária mantém contato contínuo com lideranças comunitárias informando sobre as ações realizadas.” de acordo com o comunicado.

A empresa disse ainda que segue à disposição dos clientes através do 0800 195 0 195, por ligação gratuita e mensagens via WhatsApp.

Falta de água na Maré não é novidade

O dilema da falta d’água para alguns moradores é algo que acompanha o ano todo. Isso é fácil de constatar quando se caminha pelas ruas da Maré. Um utensílio que acompanha a frente das residências são as bombas hidráulicas. Com o aumento no número de casas, a verticalização da favela e a não atualização no serviço de distribuição, o barulho da bomba virou rotina. Isso ainda acarreta no aumento no valor da conta de luz. 

A situação ainda é pior em favelas que são “fim de linha” do sistema de abastecimento da Maré, como o Salsa e Merengue e Vila dos Pinheiro, em grau ainda pior, próximo ao Parque Ecológico. São moradores que precisam acordar cedo para ter a sorte de usar a máquina de lavar roupa. Durante o dia é perigoso o uso da bomba, pois sem água, pode vir a queimar. No verão a situação ainda é pior, com a escassez da água, muitos mareenses dormem mais tarde para conseguir encher os seus reservatórios.

O Maré de Notícias, na época Cedae, entrou em contato com a assessoria de imprensa que informou o receio de aumentar o volume de água que entra por três tubulações que entram pelo Parque União para chegar com força às localidades de final de linha, por perigo de rompimento. Não havendo, por parte da empresa, nenhuma estratégia de modernização no sistema de distribuição de água para a Maré.

Água é um direito

Embora não seja de conhecimento de todos, a lei Nº 9.433, de 8 de?janeiro de 1997, ou lei das Águas, define que a água é um bem de domínio público, ou seja, todos têm direito à ela.

A Lei do Saneamento (2011), atualizada com o Novo Marco Legal do Saneamento (lei 14.026 de 15 de julho de 2020), garante a cobrança de uma taxa mínima e que os valores cobrados sejam utilizados para reparos e tratamentos de saneamento básico. Se a família for declarada de baixa renda, poderá usar os serviços sem necessidade de pagamento.

Os canais para fazer sugestões e reclamações sobre a distribuição de água são: 

 – Ouvidoria Defensoria Pública:Ligação gratuita no telefone 0800 282 2279 das 08:00h às 18:00h em dias úteis; pela internet.

– Águas do Rio: Tel 0800 195 0 195, por meio de ligação e WhatsApp.

Um atleta no campo e na vida

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Morre o ex-jogador Godoy, liderança esportiva da Praia de Ramos

Por Hélio Euclides Editado por Jéssica Pires

Morreu na tarde de sábado (10/12) Nivaldo João da Silva, o Godoy, de 59 anos. Morador e liderança esportiva da Praia de Ramos, o ex-jogador também era proprietário de um quiosque há 15 anos. Ele lutava contra um câncer na garganta.

Godoy foi jogador de futebol, começou na Portuguesa, aos 14 anos, no infantil, em 1977. Aos 17 anos foi para o juvenil do Olaria, onde ficou por quatro anos. Depois atuou no Mesquita, por empréstimo, onde chegou a ser campeão. E não parou por aí, com passagem pelo Rubro, Araruama, Vila Nova de Goiás e Rio Branco do Espírito Santo. Prematuramente, aos 24 anos, encerrou sua carreira para cuidar da sua filha, que na época tinha dois anos. Após pendurar as chuteiras, Godoy virou comerciante na Praia de Ramos e atuou em dois projetos de escolinhas. 

O ex-atleta deu diversas entrevistas para o Maré de Notícias, sendo uma importante fonte sobre futebol. Sua última atuação no jornal foi em julho deste ano, quando opinou sobre a revitalização do Piscinão.

Godoy deixa esposa, os filhos Bruno e Aline, além de duas netas, Sofia e Ive. Seu sepultamento ocorreu na noite deste domingo (11/12), no Cemitério de Penitência, no Caju.