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Um pedacinho do Nordeste

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Maré de Notícias #93 – 02/10/2018

Migrantes nordestinos contam sua história, uma trajetória que enriqueceu o Rio de Janeiro com seu trabalho, sua cultura, sua culinária, seu vocabulário e tudo o mais que se possa imaginar

Hélio Euclides

 

Na Maré, quem não é nordestino, é filho, neto, outro parente ou amigo de alguém da Região Nordeste. O Censo Maré, de 2013, detalha que a favela tem uma concentração de 35.884 nordestinos, 25,8% dos 139.073 moradores. Esses números revelam, portanto, que a formação da Maré passa pela cultura do povo do Nordeste.

Quando se pergunta sobre o fluxo de nordestinos, a resposta é sempre parecida: a busca por melhores condições de vida e a procura de se unir aos parentes. Na Maré, o Estado que prevalece é a Paraíba, que reúne 14.597 conterrâneos, ou seja, 10,5% da população total. Uma delas é Maria Ferreira, de 71 anos, que veio de Retiro, antigo nome do município Pedro Régis, na Paraíba. Lá, trabalhou na roça até os 20 anos. “Meu pai falava que o Rio de Janeiro não era lugar para moça, que eu ia embuchar logo. Provei para ele que eu era certinha, casei com meu marido depois de três meses de namoro”, revela.

Severina Martins Santos e seus filhos Marcos e Márcia: vida na Maré, das palafitas à Vila Olímpica, uma trajetória de muito trabalho | Douglas Lopes

Sua conterrânea, Severina Martins Santos, de 62 anos, tem sua origem em Araçagi e chegou ao Rio com 17 anos. “Quando cheguei queria desistir, era muito trabalho em casa de família, mas percebi que, para vencer, é preciso entender que a batalha diária não faz mal a ninguém. Que temos a necessidade de ter um objetivo na vida. Aqui, na época em que vim morar, era palafita. Onde hoje é a Vila Olímpica era nossa casa. À noite, íamos dormir e sentíamos o barraco balançar, além de uma mosquitada. Minha irmã pedia emprestado o ‘ola’, para pegar água, e tinha de devolver cheio”, comenta. Severina ainda trabalhou em fábricas de cerâmica, de vidro de relógio e foi cobradora de ônibus, profissão na qual atuou por 30 anos.

“Nasci no Rio de Janeiro, mas me identifico como parioca, mistura de paraibano com carioca. Sou fã da cultura nordestina, do respeito e da luta, é um povo guerreiro. Minha mãe é ‘braba’ como Maria Bonita. E, por isso, tiro o chapéu para ela”, diz Marcos Martins, filho de Severina.

 

Histórias do Nordeste e do Rio

Raimunda Simplício, de 53 anos, é do interior de João Pessoa, local que até hoje não é asfaltado. Sua decisão de largar tudo e vir para o Rio, em 1980, foi por ser uma adolescente rebelde que queria ter as coisas. “Lá tinha festa junina, ciranda e quermesse, forró e dança de roda, mas meu pai não me deixava participar. Certa vez, colocou o meu namorado para correr, acho que corre até agora. Então, com 16 anos, decidi vir com uma amiga”, explica.

Na Cidade Maravilhosa, Raimunda foi trabalhar como empregada doméstica. “Comecei a dormir no trabalho, no bairro da Barra da Tijuca, para juntar um dinheiro. Então comprei um barraquinho na Maré. Ao chegar do Nordeste, o primeiro lugar que vi foi a Nova Holanda, e me acostumei: tudo é perto e o transporte é bom. Sair daqui só para minha terrinha”, afirma. Ela acrescenta que na Maré tem muito nordestino, que influenciou na mudança local. Raimunda estuda na Escola Clotilde Guimarães, onde convive com muitos conterrâneos.

Hoje, como diarista, já pensa em guardar um dinheirinho para visitar parte da família, já que dos seis irmãos, cinco estão aqui. “Quero matar a saudade do fogão de lenha; gosto da comida nordestina, da cultura de fazer bolinha de feijão verde com farinha e comer com a mão. Lá na terrinha tudo é plantado, como é chamado aqui de orgânico. A alimentação é mais saudável. Aqui a fava é muito cara, R$ 23 reais. Quando alguém vem do Nordeste, peço para trazer fava, cará, feijão de corda, feijão mulatinho, farinha e urucum, conhecido aqui como colorau. Só não peço para trazer galinha caipira”, brinca.

O seu objetivo é voltar de vez ao se aposentar. “Porque sem dinheiro é complicado, pois lá falta chuva. Quero voltar a falar ôche, vice, tá danado, tá com a molesta, bexiga taboca, oxente. Pois, quando chego lá e não tenho mais essa linguagem, dizem que eu imito carioca. Desejo beber água do pote de barro, na caneca de alumínio e, se necessário, um remédio caseiro. Tudo isso animado pelas músicas de Amado Batista, Marinês, Elba Ramalho e Marcio Greyck”, planeja.

 

A música para matar saudades

Com 75 primaveras, Geralda Farias Pereira é uma verdadeira contadora de histórias. Sua vinda de Campina Grande, em 1952, foi um dilema, que durou oito dias, num pau de arara, com banco sem estofamento. Quando atolava, todos desciam e tentavam ajudar. Ela conta: vieram eu, meu pai, minha mãe e uma amiga. Nesses dias, recordei nossa vidinha, onde os tios moravam no mesmo sítio e os primos se misturavam e eram muitas brincadeiras. Meu pai era muito festeiro, todo final de semana tinha forró”.

Ao chegar, foram morar de aluguel em Ramos. Os amigos deram a sugestão da compra de madeiras que todos iam ajudar na construção. “Assim nasceu, na Praia de Ramos, um barraco, em cima da maré, na palafita. Para andar tinha de ter cuidado com as tábuas. Pelo meu medo, nos mudamos para outro local, aterrado por serragem”.  Ela conta que trabalhou na linha de montagem da TV Emerson até o seu casamento.

Apesar da distância da terra, o amor veio de lá, um rapaz de Aroeiras, também na Paraíba, e eles se casaram em 1959. “Ele era niquelador, dava banho de níquel nos para-choques de caminhões. Mas o seu sonho era a música, então foi contratado pela gravadora Chantecler e lançou o primeiro LP. Aí foi trabalhar com música, em 1960. Depois foi para a gravadora Cantagalo, e no total foram 22 LPs”, ressalta. Adolfinho dos Oito Baixos tocava o instrumento que virou seu sobrenome, uma sanfona menor que o acordeom. Ele também consertava sanfona e eletrificou a primeira no Rio.

“Ele tocava no forró de Pedro Sertanejo, pai de Oswaldinho do Acordeom. O Luiz Gonzaga vinha na minha casa e foi padrinho da minha filha. Em retribuição, íamos para o sítio de Luiz Gonzaga, em Santa Cruz da Serra. Lá, o cardápio era buchada de bode. Outro presente na minha residência, era Sivuca”, revela. Numa casa famosa, a família cresceu. Foram quatro filhas, sete netos e sete bisnetos. Para a família, ela confessa que ainda faz galinhada com arroz mole. “Nós somos um pouquinho paraibanos, em especial quando se fala de comida”, resume Vanessa Pereira, sua neta.

Maré de Notícias #93

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Curta-metragem fala sobre o Maré de Notícias

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Filme foi lançado no evento Mídia das Ruas realizado pela Uerj

Por Hélio Euclides – Em 28/09/2018

 

O Laboratório de Comunicação Dialógica realizou, na Uerj, o evento Mídia das Ruas. Na tarde de 25 de setembro, foram exibidos três filmes. O primeiro a ser exibido foi um curta-metragem, do diretor Marcelo Ernandez, sobre o jornalismo comunitário, que fala sobre o Maré de Notícias. Ernadez, disse, na ocasião, que pretende exibir sua obra na Maré. Os outros filmes exibidos mostram a jornada de manifestações de 2013 na visão da mídia ativista.

Após a sessão, ocorreu um debate com o pesquisador de comunicação comunitária Nico Carpentier. Ele gostou de conhecer, por meio do filme, o dia a dia do Jornal Maré de Notícias. “O Maré de Notícias pensa com a favela, tem um engajamento com ela, e cobra transformações, pois está enraizado no cotidiano do morador. O morador tem um veículo que não distorce as notícias, como os da grande mídia. A mídia alternativa tem uma cobertura diferenciada da grande mídia, mas nem por isso corta relações, e sim constrói portas de diálogos”, disse Nico.

Organizações brasileiras de direitos humanos se reúnem com Alto Comissariado da ONU

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Encontro, realizado na Suíça, denunciou violação de direitos na militarização da segurança pública, entre outros problemas

Em 19/09/2018 – Por Eliane Salles

Representantes da Redes da Maré, Observatório da Intervenção, Anistia Internacional, Conectas Direitos Humanos e Mônica Benício, viúva de Marielle Franco, se reuniram nesta quarta-feira (19), em Genebra, na Suíça, com a Alta Comissária Adjunta da ONU para os Direitos Humanos, Kate Gilmore; com a Relatora Especial da ONU para Execuções Sumárias, Agnes Callamard; e membros das equipes dos Relatores Especiais da ONU para Defensores de Direitos Humanos e Violência contra a Mulher.

Nas reuniões, o grupo denunciou violações de direitos na militarização da segurança pública no Brasil, o aumento dos homicídios provocados pela polícia e a falta de respostas sobre o assassinato da defensora de direitos humanos, a vereadora Marielle Franco. “As reuniões mostraram a importância da internacionalização das denúncias de violações de direitos que ocorrem nas favelas e periferias do Brasil. Sem dúvida, esse é um meio de pressionar por mudanças efetivas no campo do direito à vida e à segurança pública” afirma Eliana Silva, Diretora da Redes da Maré.

Na quinta-feira, dia 20, as organizações realizam um evento paralelo à 39Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU. O evento “Militarização da Segurança Pública: Intervenção Federal no Rio de Janeiro, Execuções Extrajudiciais e Riscos para Defensores de Direitos Humanos” será realizado na Sala XXVII do Palais de Nations, às 12h30, Genebra (7h30, Brasília), e terá transmissão ao vivo pela página do Facebook da Red Internacional de Derechos Humanos.

Debate sobre segurança leva candidatos ao governo do estado do Rio à Maré

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Mesmo sem contar com a participação dos candidatos mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais, encontro reúne centenas de pessoas no Centro de  Artes da Maré e mostra o alto nível de conscientização política da população da Maré

Em 19/09/2018 – Por Eliane Salles

Cerca de 400 pessoas, a maioria jovens, participaram na noite desta terça-feira (18) do Debate com Candidatos na Maré, realizado no Centro de Artes da Maré (CAM). O encontro, promovido pelo Fórum Basta de Violência – Outra Maré é Possível, contou com a presença de três candidatos a governador e uma candidata a vice-governadora: Marcia Tiburi (PT), Dayse Oliveira (PSTU), Luiz Eugênio  Honorato (PCO) e Ivanete Conceição da Silva (que representou Tarcísio Motta, candidato do PSOL). O encontro durou cerca de duas horas e teve a participação ativa de jovens, muitos deles alunos da Redes da Maré. Diferentemente de alguns debates, todos os doze candidatos foram convidados a participar.

O Fórum Basta de Violência – Outra Maré é Possível é uma iniciativa dos moradores da região, lideranças comunitárias e organizações civis do território, como a Redes da Maré, e tem por objetivo ser um canal de prática e discussão sobre a diminuição dos  homicídios no conjunto de favelas da Maré.

Violência e Saúde

Segundo os organizadores, o objetivo do debate foi “promover trocas diretas entre candidatos e moradores, no sentido de buscar alternativas e possibilidades para a construção da segurança pública e oficializar suas propostas e intenções a partir de documentos e registros”. O debate foi dividido em seis rodadas de perguntas (segmentadas por perfil, como por exemplo: morador da Maré, não candidato nas eleições; morador de outras comunidades, etc.). As perguntas eram feitas por quem estivesse dentro do perfil e se inscrevesse.  Os questionamentos eram formulados pelo próprio participante, que também escolhia qual dos candidatos deveria respondê-los.

O ponto alto do encontro foi a constatação do nível de politização e de consciência dos jovens moradores do território, que levantaram questões que aprofundaram o debate, como: o não ensino da cultura negra nas escolas; problemas de saneamento básico, que impactam na saúde dos moradores; qualidade da educação pública; além, obviamente dos temas relacionados diretamente à segurança. Entre eles, a violência impetrada pelos agentes da segurança pública contra a população negra e favelada.

Casas na Favela do Arroz são demolidas pela Prefeitura

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Moradores e associação de moradores alegam que não foram notificados antes nem durante a ação

Por Eliane Salles – Em 14/09/18

Na próxima quinta-feira, 20, representantes da Redes da Maré acompanharão moradores de uma área conhecida como Favela do Arroz (localizada na comunidade de Marcílio Dias, na Maré) a um atendimento no Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Estado (NUTH), especializado em remoções.

A ação faz parte de um processo de orientação que a Redes, através de seu projeto Maré de Direitos, vem dando aos moradores da área, que alegam terem tido suas casas demolidas pela Prefeitura sem mandado ou notificação prévia. O projeto Maré de Direitos busca garantir e ampliar o acesso a direitos e interferir em práticas sociais que dificultem o acesso à justiça.

Prefeitura não teria notificado moradores

A remoção foi realizada no último dia 6, e, segundo os moradores, os pegou de surpresa: por volta das 7 horas da manhã, uma equipe da Prefeitura, acompanhada por policiais militares e agentes da Guarda Municipal, começou a demolir 21 barracos ainda em construção.  Na ocasião, a equipe da ação teria dito que voltaria ao local na segunda-feira (dia 10) para remover os demais, o que não aconteceu. Na ação, foram colhidos nomes, CPF e identidade das pessoas que já residiam no local. Não há, até o momento, informações oficiais sobre os objetivos do cadastramento.

Tanto os moradores quanto representantes da Associação de Moradores da Favela Marcílio Dias alegam não terem sido notificados antes, nem durante a ação. Questionada, a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Habitação ficou de apurar os fatos, mas, até a publicação desta matéria, não havia se posicionado. 

Segundo os moradores, há cerca de 1 ano e 6 meses, vem sendo construídas casas no entorno de um galpão pertencente ao Banco do Brasil. Antes da remoção,  havia cerca de 59 barracos no local (alguns de alvenaria, outros de madeira), que abrigam famílias de até quatro pessoas.  De acordo com a Associação de Moradores da Favela Marcílio Dias, não há funcionamento regular no local, apenas a circulação de vigilantes e seguranças de uma empresa privada. De acordo com matéria publicada no site Terra, o galpão do Banco do Brasil seria leiloado ontem, dia 13. O Maré Online não consegui confirmar se o leilão foi realizado e o imóvel vendido.