Carta de Saneamento da Maré: saiba mais sobre diagnóstico e metas estabelecidas

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Documento propõe soluções para melhorar a qualidade de vida dos moradores do conjunto de favelas

Por Hélio Euclides, em 26/10/2021 às 15h52

Elaborada por moradores e especialistas, a Carta de Saneamento da Maré, além de trazer um diagnóstico atual dos serviços oferecidos, tem como objetivo fortalecer as lutas e avançar na busca por serviços que ainda não foram efetivamente garantidos. O documento é dividido em quatro eixos: esgotamento e Baía de Guanabara; abastecimento e manejo de água pluvial; resíduos sólidos; e saúde e bem-estar. A carta traz demandas sistematizadas para cada um dos segmentos, sendo uma forma de contribuições da Maré para o desenvolvimento de políticas socioambientais e parte integrante da Agenda Rio 2030. 

A Cartaa é fruto de quatro encontros realizados a partir da parceria da Casa Fluminense, do Projeto Maré Verde da Redes da Maré e do Projeto Cocôzap do data_labe. “Os encontros foram muito importantes porque reuniram moradores da Maré e pessoas com conhecimento técnico sobre a problemática voltada para saneamento”, conta Lorena Froz, articuladora do Eixo Desenvolvimento Territorial da Redes da Maré e do Projeto Maré Verde.

Os eventos foram marcados pela discussão das demandas e soluções para a mobilização. “Esses encontros também tiveram o intuito de, junto com o território, ocorrerem articulações com órgãos públicos e o mapeamento das demandas, que foram registrados para só assim cobrar o que não acontecia. De lá para cá, ocorreu a atualização da carta e comparativo do que conseguimos incidir e o que precisamos trabalhar mais”, diz. 

Lorena já pensa nos próximos passos. “O que queremos é que esses encontros culminem num fórum de saneamento básico para trazer pautas, discutir assuntos e leis, como os de pontos de reciclagem e do tronco coletor de esgoto que precisam ser avaliados para o território. O fórum seria esse local de entendimento. Os encontros são rápidos; para um aprofundamento detalhado é preciso pesquisa e grupos de estudos, algo que será possível num fórum”, conclui. 

Qualidade de vida na Maré

Os quatro encontros tiveram como tema principal as melhorias necessárias para a qualidade de vida dos moradores das 16 favelas da Maré. Tudo começou em abril de 2019, quando a Lona Cultural Municipal Herbert Vianna recebeu moradores e especialistas no assunto para tratar da questão do saneamento local. 

Em dezembro do mesmo ano, ainda ocorreu a segunda etapa, na Redes da Maré, da Vila dos Pinheiros. O encontro teve como objetivo construir uma agenda contínua sobre o saneamento, tendo como ponto de partida a geração de índices e as especificidades territoriais para o planejamento urbano. Nessa edição, a discussão foi ampliada, com a abordagem de temas como violação de direitos básicos, racismo ambiental e gestão das políticas públicas. No encerramento, foi elaborado um planejamento de propostas para 2020. 

A terceira reunião ocorreu em outubro do ano passado, de forma remota por causa da pandemia. O encontro trouxe o desafio imposto pela emergência sanitária, que dificultava ainda mais os serviços de saneamento básico na Maré, prejudicando a qualidade de vida por ineficiência no acesso à água potável, ao esgotamento sanitário e à coleta de lixo. Um documento foi construído a partir da atualização da carta de saneamento do ano anterior, com propostas de soluções coletivas para os problemas sociais e ambientais do território.

A edição mais recente ocorreu em maio deste ano, ainda de forma online, e reuniu moradores, especialistas e representantes da coleta de resíduos sólidos. A discussão envolveu a geração de lixo e a falta de coletiva seletiva no território, bem como o impacto dos serviços prestados pela Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) na vida dos moradores das 16 favelas da Maré. Este quarto Encontro de Saneamento da Maré serviu de continuação e conclusão das outras edições.

Carta de Saneamento da Maré 2020 (resumo)

A Carta de Saneamento da Maré 2020 é parte da agenda global da Casa Fluminense com o objetivo de alcançar as mãos das candidatas e candidatos à prefeitura das cidades do Rio nas eleições municipais de 2020. Ela foi elaborada a partir da atualização da carta de saneamento do ano anterior, num trabalho conjunto entre moradores e ativistas ambientais da Maré e especialistas dentro do I Encontro de Saneamento da Maré. O documento será disponibilizado nos sites e plataformas do data_labe, da Casa Fluminense e da Redes de Desenvolvimento da Maré.

A intenção da Carta é fortalecer essa tradição de lutas e avançar coletivamente na busca por serviços que ainda não foram efetivamente garantidos. Este documento é segmentado nos eixos: esgotamento e Baía de Guanabara; abastecimento e manejo de água pluvial; resíduos sólidos; saúde e bem estar, e traz demandas sistematizadas para cada um desses segmentos. 

Esgoto e Baía de Guanabara

  • Garantia de recursos públicos e monitoramento de obras e ações inacabadas, como a construção do tronco coletor para a Estação de Tratamento Alegria.
  • Estratégias de mobilização comunitária envolvendo movimentos juvenis, ativistas locais, ONGs, postos de saúde, escolas e moradores em geral.
  • Promoção de ações do poder público no entorno dos valões para despoluição e criação de áreas verdes como ilhas flutuantes, que auxiliam no tratamento de esgoto a partir de plantas e suas raízes.

Abastecimento de água e manejo de água pluvial

  • Alternativas sustentáveis podem auxiliar na drenagem urbana, evitando enchentes.
  • A Maré tem um sistema público de encanamento da década de 1960 que não supre a demanda atual. É necessária a implantação de um sistema que contemple as atuais demandas.
  • Disponibilização dos mapas de abastecimento de água e de rede de esgoto por parte da Cedae e da Prefeitura. 

Resíduos sólidos

  • A Maré é maior do que 95% dos municípios do país e sua população cresce exponencialmente. Os serviços da Comlurb não têm investimento diretamente proporcional à demanda populacional. É preciso aumentar e melhorar o serviço de coleta de lixo por meio de equipamentos, número de garis e frequência.
  • Os locais com maior número de violações de direitos em relação à segurança pública são os que sofrem mais com os problemas do lixo. Experiências históricas demonstram que o cuidado maior com essas áreas impactam na diminuição da violência; por isso, é importante trabalhar para a transformação desses espaços com ações do poder público.
  • O lixo orgânico acumulado nas vias públicas também são um grande problema para a população. Em torno de 55% das demandas da Central de Atendimento ao Cidadão na Maré são relacionadas à proliferação de roedores. 
  • É necessário fazer um diagnóstico da estrutura dos serviços de coleta de lixo e compartilhar essas informações com a população.
  • É urgente a necessidade de promoção de atividades em educação ambiental. 

Saúde e bem estar

  • A saúde respiratória dos moradores da Maré precisa de atenção, isso porque a localização do bairro entre as três principais vias da cidade compromete cronicamente o sistema respiratório dos habitantes.
  • A chegada da covid-19 evidenciou ainda mais a necessidade de se ter mais pias para higiene das mãos do território.

Os pontos levantados nessa carta propõem um entendimento mais amplo da situação do saneamento básico na Maré, com possíveis soluções para diferentes problemas que permanecem no território, apesar de tantas promessas políticas ao longo dos anos. A garantia de acesso a serviços de saneamento, incentivo e articulação entre moradores e poder público, assim como impulsionamento das iniciativas já existentes, são fundamentais para o desenvolvimento socioambiental pleno. Não podemos deixar de reivindicar que políticos, instituições e funcionários da máquina pública trabalhem de forma transparente e deem voz aos moradores das periferias e, principalmente, que trabalhem comprometidos com a redução das desigualdades sociais, tão presentes e naturalizadas na sociedade brasileira.

A carta elaborada coletivamente durante o período pandêmico

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