Do salário, nem o mínimo

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Salário mínimo deveria garantir acesso a necessidades básicas, porém o valor não se adequa a realidade da população

Maré de Notícias #149 – junho de 2023

Por Lucas Feitoza

No dia 1º de maio, o salário mínimo sofreu um reajuste de 9%, passando de R$ 1.212 para R$ 1.320. Um mês depois da mudança, perguntamos aos moradores da Maré se esse aumento se refletiu no cotidiano da população.

Stefanie da Silva, de 22 anos, é moradora da Vila dos Pinheiros. Ela trabalha como auxiliar de galpão e afirma que o valor do salário mínimo não é suficiente para suprir suas necessidades básicas e as de sua filha de dois anos. 

Stefanie é mãe solteira e tem despesas com aluguel, mas reclama principalmente dos gastos com alimentação, que chegam a cerca de R$ 600 mensais. Segundo ela, “se compro a mistura, não consigo pagar por todos os legumes”.

A Constituição de 1988 regulamenta o salário mínimo e estabelece que ele deve ser reajustado regularmente para garantir o poder de compra da população. Entre suas principais funções está assegurar que os trabalhadores e suas famílias tenham um valor adequado para suprir necessidades básicas, como alimentação, moradia, vestuário, cuidados de higiene, saúde, segurança e transporte.

Apesar de não suprir todas as necessidades, o salário mínimo foi reajustado acima da inflação pela primeira vez em quatro anos, o que significa que o poder de compra da população vai aumentar gradualmente. Porém, uma das pessoas que ainda não sentiram a mudança é Alessandra Macedônio, moradora da Nova Holanda.

Ela também afirma que o salário mínimo não é suficiente para o sustento da família. Ela e o marido estão entre os 67,1% dos trabalhadores que recebem até dois salários mínimos. Mesmo assim, o casal enfrenta dificuldades para arcar com todas as despesas: “O supermercado é o que nos prejudica, e a cada mês os preços aumentam”, diz Alessandra.

Valor necessário

Em setembro de 2022, cerca de 34,7 milhões de trabalhadores no Brasil recebiam até um salário mínimo, o que representa 35,6% do total de ocupados no país. Esses dados são da Pesquisa Nacional por Amostragem por Domicílio Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Porém, o valor do salário mínimo é percebido de duas maneiras, como explica o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Existem dois tipos: o real, que é o valor efetivamente pago, e o necessário, que seria a quantia suficiente para suprir as necessidades básicas. 

Hoje, este último teria que ser de R$ 6.676,11, segundo a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, realizada mensalmente nas capitais. No Rio de Janeiro, a cesta básica ficou em 4º lugar entre as mais caras do país, custando R$ 750,77.

Para o economista Fernando Mattos, professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF), a questão do salário mínimo deveria ser pensada, questionada e cobrada como um ato cotidiano de cidadania.

Ele ressalta que a economia é uma questão política: “A maioria das pessoas acredita que só se deve discutir política em período de eleições. Na verdade, agora é a hora de cobrar dos parlamentares o aumento do salário mínimo. A população escolheu um Congresso conservador, que não se preocupa com o salário dos trabalhadores, e isso dificulta na hora de exigir reajustes maiores.”

O Rio de Janeiro tem a 4o cesta básica mais cara entre as capitais, custando R$ 750,77 – Foto: Gabi Lino
Lucas Feitoza
Lucas Feitoza
Jornalista

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