Especialistas alertam para risco de pomadas modeladoras

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Anvisa proibiu a comercialização e utilização de todas as pomadas modeladoras de cabelos em fevereiro

Por Lucas Feitoza

“Quando não se usa a pomada acontece isso”, desabafa a trancista Michelle da Silva do Nascimento, de 29 anos, enquanto desfaz a trança da cliente que voltou para consertar fios soltos. A trancista mora no Conjunto Bento Ribeiro Dantas, conhecido como Fogo Cruzado, e conta que mesmo depois da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibir, no dia 9, o  uso e comercialização de pomadas modeladoras, as clientes ainda procuram o produto pela durabilidade, e na favela, ainda encontram lugares vendendo. “Eu alerto sobre os riscos de usar essa pomada, mas antes usava para fazer as tranças das clientes e não tive nenhum caso aqui no meu salão”, afirma.

A medida preventiva foi tomada depois que a Anvisa recebeu outros relatos de “cegueira temporária”, como está sendo chamada a Ceratite Ocular. A última nota da agência contabilizava 780 casos relacionados ao uso dos produtos de modelar/trançar cabelos. A oftalmologista Liana Tito Francisco, sócia fundadora do grupo Ifé Medicina, considera inadequado chamar de cegueira temporária, já que a ceratite ocular é uma inflamação temporária na córnea, caracterizada por machucados e escoriações na pele, vermelhidão e inchaços nas pálpebras e sensação de corpo estranho, que causam a diminuição da visão. Mas Liana tranquiliza que fazendo o tratamento de forma adequada, em aproximadamente 30 dias os sintomas terão passado.

A cliente que foi refazer o cabelo é a dona de casa Valdeci da Silva Santos, de 57 anos, que também mora no Fogo Cruzado. Ela relata que faz trança há muito tempo e nunca teve problemas, apenas com Michelle, ela já trança o cabelo há três anos: “Eu, minha filha e a minha comadre nunca tivemos problema, eu lavo o cabelo pra trás, fico no sol pra secar e fica tudo bem”, afirma.

Já a jovem Cecília Lemos Victoriano dos Santos, de 17 anos, que mora na Vila dos Pinheiros, não teve a mesma sorte. Ela relata o desespero vivido em dezembro de 2019, quando colocou tranças pela primeira vez. Depois de lavar o cabelo alguns dias após a aplicação, ela sentiu um desconforto nos olhos: “Achei normal, mas ficou o dia todo aquele incômodo, eu dormi e no dia seguinte estava pior”, conta. A estudante relembra que foi ao hospital e lá passaram remédio para desinflamar, mas não disseram o que tinha causado. Ela resolveu fazer uma pesquisa sobre o assunto na internet e encontrou que poderia ter sido a pomada de cabelo. Mesmo assim, três meses depois, optou por colocar trança de novo, e teve o mesmo problema: “Como eu já tinha o remédio que o médico passou, coloquei e melhorou rápido, mas foi horrível.”

Não são casos isolados

O que aconteceu com Cecília também foi relatado por outras pessoas que usaram os produtos para cabelo. O caso mais conhecido aconteceu com a influenciadora digital Bielle Elizabeth, de 29 anos, que relatou a cegueira temporária no início do ano. 

A oftalmologista Liana Francisco alerta para os riscos de continuar usando o produto mesmo sabendo da proibição: “O ideal é aguardar a liberação ou proibição (definitiva) da Anvisa com o produto no armário, porque não tem como assegurar que você não vai pegar uma chuva e o produto escorrer para os olhos,” afirma. Liana Francisco explica também que qualquer machucado nas córneas são propícios para complicações que podem danificar a visão ou até mesmo causar cegueira definitiva. 

Nos casos de produtos químicos entrarem em contato com os olhos, a médica explica que deve-se lavar a região com água corrente por pelo menos 30 minutos e ir para a emergência, preferencialmente a oftalmológica, para passar por exames específicos e detectar o problema para que dê início ao tratamento. 

A trancista Michelle optava pelas pomadas capilares pelo preço mais acessível e pela quantidade. Um pote de 1kg custa em média R$40, mas hoje em dia ela opta pela gelatina capilar, para evitar os riscos. 

Em nota, a Anvisa destaca que todas as pomadas de trançar/modelar cabelos estão proibidas e que também não devem ser vendidas; “Neste momento, não há determinação de recolhimento geral, mas os produtos não podem ser comercializados”. 

Lucas Feitoza
Lucas Feitoza
Jornalista

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