Intervenção Federal diminui o número de crimes contra o patrimônio, mas o número de mortes em Operações policiais aumenta em 36,3%
Maré de Notícias #97 – fevereiro de 2019
Por: Camille Ramos
Proteção ao patrimônio: este é, basicamente, o resultado da Intervenção Federal, que terminou no dia 31 de dezembro de 2018. Embora tenham diminuído os casos de roubos de carga e de carros, e de assaltos a pedestres, o número de mortes decorrentes de ações policiais aumentou em 36,3%. O investimento financeiro (uma verba de R$ 1,2 bilhão da qual apenas 6% foi utilizada) foi concentrado na compra de armas e equipamentos de confronto. Na Maré, ocorreram menos operações. No entanto, elas foram mais violentas. Segundo dados do Boletim divulgado pelo Eixo de Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, em 2018, aconteceram 13 Operações policiais com 19 mortes. Em 2017, foram 21 operações com 20 homicídios.
Apesar de o número de confrontos policiais terem diminuído na Maré, ao contrário do que houve na Vila Kennedy, no Complexo do Alemão e na Praça Seca, que, de acordo com o aplicativo Fogo Cruzado, foram as regiões que mais tiveram registros de tiros durante o período da Intervenção, as Operações que aconteceram na Maré foram mais violentas. As duas maiores datam de 20 de junho, quando houve o uso de helicóptero que sobrevoou a área, despejando balas sobre várias regiões da comunidade, matando sete pessoas, entre elas dois adolescentes: Marcos Vinicius da Silva, de 14 anos, e Levi, de 18; e a operação que começou na madrugada do dia 6 de novembro, se estendeu por quase todo o dia, causando pavor durante 17 horas e resultando em cinco mortos. Durante a Intervenção, a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, foram assassinados. As mortes aconteceram no dia 14 de março e o crime ainda não foi elucidado.
O legado da Intervenção
Sobre o resultado da Intervenção, a assessoria de comunicação do Gabinete da Intervenção Federal (GIF) respondeu, por e-mail, ao Maré de Notícias: “Como legado da Intervenção pode-se destacar, além da redução dos índices de criminalidade, o aperfeiçoamento dos sistemas de ensino, a manutenção de viaturas, equipamentos pesados e armamentos, a destruição de armamento obsoleto, o apoio especializado de serviço de engenharia, o treinamento, reciclagem e capacitação de pessoal, o planejamento das ações dos Órgãos de Segurança Pública com bases nas manchas criminais, a recuperação do efetivo desse Órgão, a nova legislação para os Órgãos de Segurança pública e Secretaria de Administração Penitenciária, dentre outros”.
Segundo Lidiane Malanquini, coordenadora do Eixo Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, o Estado não consegue pensar a Segurança pública a partir da lógica cidadã, de prevenção e inteligência. “A única resposta que se dá é militarizar, armar mais, via confronto bélico, repressão da criminalidade. A Segurança pública deveria ser vista, também, como direito à saúde, à educação e à habitação, mas, historicamente, foi vista como um instrumento de violência”, analisa.
Jogo de empurra
Questionadas sobre a reestruturação das polícias e sobre o direito à vida, mostrando dados do Instituto de Segurança Público (ISP) no período de fevereiro a setembro de 2017, quando foram contabilizados 636 homicídios decorrentes de intervenções policiais, enquanto no mesmo período em 2018 aconteceram 1026 mortes, o Maré de Notícias não obteve resposta – nem da assessoria do Comando Militar do Leste, nem do GIF e, muito menos, da Secretaria de Segurança Pública (que está em extinção no novo governo). Uma assessoria atribuía a outra a resposta ao questionamento, configurando um verdadeiro jogo de empurra entre elas.
No entanto, em entrevista ao Jornal Nacional no dia 11 de dezembro, o secretário de Segurança do Rio, general Richard Nunes, disse que “o aumento de mortes em confrontos está relacionado à recuperação da capacidade operacional das polícias, à atuação das forças de Segurança em regiões mais violentas” e chamou de irracional o comportamento de grupos civis armados “quando escolhem o enfrentamento”. O general Nunes ainda completou: “O foco da intervenção, como sempre dissemos, era muito mais em termos de reestruturação dos Órgãos de Segurança pública, de motivação de recuperação da autoconfiança, autoestima, de modo que os resultados pudessem vir em consequência disso”.
Verba bilionária
O Governo federal liberou R$ 1,2 bilhão para a Intervenção Federal no Rio. O Relatório da Intervenção estima que foram gastos apenas 6% deste orçamento. De acordo com o GIF, 97,5% da verba foram empenhados (quando existe a promessa de compra, mas o dinheiro ainda não foi gasto) e serão destinados à compra de carros novos para a Polícia, além de três helicópteros, armas, munições e outros equipamentos. O maior investimento foi na compra de carros novos, totalizando um gasto de R$ 440 milhões.