Light e Maré: discutindo a (difícil) relação

Data:

Maré de Notícias #88 – maio de 2018

Moradores reclamam de falhas no atendimento

Hélio Euclides

Desde o tempo das cabines de luz, na Baixa do Sapateiro, até os dias de hoje, com a distribuição individual, por meio de medidor, muita coisa mudou. Mas os problemas continuam; só que agora são outros, como a demora no atendimento da Light, Empresa responsável pela distribuição de energia elétrica na cidade do Rio de Janeiro e outros municípios. Um exemplo foi a falta de energia causada pela chuva de 14 de fevereiro. Alguns bairros foram atendidos na manhã seguinte, mas a Maré ficou 48 horas às escuras.

“A obrigação da Light era atender igualmente a todos os cariocas, mas não faz. Os últimos acontecimentos mostram isso, em fevereiro foi um descaso de dois dias! Depois ficamos três dias sem luz, em março, com um cabo no chão, trazendo riscos. E em abril foram mais três dias. Ao ligar, não queremos promessas e, sim, o conserto. Se há medo de entrar, que tenham um contato direto com o morador. O serviço oferecido precisa levar em conta que há inúmeras casas de quatro andares que utilizam bomba hidráulica e ar condicionado”, relata Renan Santos, morador da Via C2, próximo ao Parque Ecológico, na Vila do Pinheiro.

O valor das contas e do serviço

Na Maré, o serviço de manutenção é realizado pela empresa terceirizada Medral. Esse serviço é criticado pelo eletricista Severino Batista: “o atendimento aqui na Maré não é bom, é preciso ter cabos diretos, sem emendas. Por outro lado, os fios que levam energia às casas precisam de conectores, mas alguns eletricistas da comunidade ainda fazem sem o devido equipamento”. Para Cláudia Santana, presidente da Associação de Moradores do Parque Ecológico, a falta de energia é causada pelas redes antigas e danificadas. “Acho que falta investimento, em especial aqui na favela. Somos sempre informados que falta cabo novo para a Maré”.

Cláudia aponta outra dificuldade, que é a quitação da conta. “Uma problemática é o não pagamento das contas; falta uma conscientização da Empresa, para a criação de uma taxa fixa. Outro agravante são os gatos que, mal feitos, sem os conectores, deixam os cabos danificados”. A questão dos gatos é antiga e polêmica. “Há 17 anos, a Empresa pegou um gato na minha instalação elétrica. Recebi uma multa. Se a concessionária conhecesse a comunidade, iria ver que muitos não têm relógio ou fazem gatos por causa do valor alto das contas”, argumenta Ismael Martins, morador de Marcílio Dias.

Valtemir Messias, o Índio, presidente da Associação de Moradores da Vila do João, também vê

Moradores reclamam de transformador que vaza óleo na comunidade Rubens Vaz | Foto: Elisângela Leite

outros problemas no serviço prestado e faz sugestões para a melhoria do atendimento: “aqui há cabos de baixa tensão, postes e transformadores para trocar. Sobre a reclamação pela demora no atendimento, a nossa comunidade já teve uma ação pública que dava prazo de 12 horas. Acho que hoje deve ser feita uma ação coletiva para toda a Maré”.

 

No Conjunto Esperança, as chuvas de 14 de fevereiro ainda causam problemas. “Precisamos de poda de árvores, que após as chuvas de fevereiro encostaram nos cabos e causam problemas”, reclama Pedro dos Santos, presidente da Associação de Moradores.

Anizete Guilherme, da Rua Massaranduba, no Rubens Vaz, diz que já não dorme tranquila. “Pago mais de 100 reais de luz, não tenho gato. Não aceito que tenha um transformador na minha porta que vaza óleo. Já liguei mais de dez vezes para a Light, e ela não faz nada. Quando vaza, sai fumaça, e isso pode causar um incêndio, tenho medo que exploda”.

Os postes de madeira

Jupira dos Santos, presidente da Associação de Moradores de Marcílio Dias, acredita ainda ter 30 postes de madeira na sua comunidade. “Desses, quatro estão podres, têm caráter emergencial para a troca, senão vão cair na casa de morador”, avalia. A realidade, segundo os moradores é que os poste de madeira são antieconômicos “Para substituir os postes de madeira, ficamos sem energia um “tempão”, um transtorno. Já foram trocados três vezes. Quando chove a rua inunda, a água chega ao poste e com o tempo fica podre”, explica José Helvécio, da Rua José Sarney, em Marcílio Dias.

Um dos postes se encontra torto, relatam moradores de Marcílio Dias. “A situação é horrível, já trocaram o poste de madeira, mas sempre fica torto, não sei como não caiu. Os fios estão pendurados. Nos temporais, fico com medo. Quando vai aparecer alguém para trocar?”, pergunta Sergio Noronha, da Rua José Sarney. Já Reinaldo Almeida, também morador da Rua José Sarney, avalia o trabalho da Light: “quando falta luz, até que a Empresa atende rápido, acredito que seja por causa do Mercado São Sebastião. Mas na questão dos postes de madeira tenho medo que caiam em cima da gente, ou dos carros que passam”. Ramos Pereira, da Rua Dalva de Oliveira, em Marcílio Dias, tem um poste em frente de casa. “Esses postes se tornaram um perigo para as crianças. Fico com a mente pesada de preocupação. O ideal é um poste de concreto”.

Para Vilmar Gomes, o Magá, presidente da Associação de Moradores de Rubens Vaz, há a necessidade de troca de cabos na Rua Massaranduba e Rua do Canal. Mas ele também vive o dilema dos postes: “ainda são de madeiras, defasados e podres, e outros de concreto precisam também ser trocados”. Isso ocorre na Rua João Araújo também. “Esses postes de madeira são quase da inauguração da favela, do tempo do ronca”, lembra Armando Luiz, morador da mesma Rua.

As explicações da concessionária

A Assessoria de Imprensa da Light informou que o fornecimento de energia na Maré é diretamente prejudicado pelas ligações clandestinas na comunidade, que sobrecarregam os equipamentos e, consequentemente, causam a queima de transformadores e cabos. Completa que a Light atua no combate ao furto de energia, e que a perda na Maré está em 79,27%. Especificamente na Maré, a Empresa vem investindo na robustez da rede elétrica, que atende aos clientes da Companhia na região, para diminuir as ocorrências.

A Assessoria de Imprensa da Light ressalta ainda que, devido às condições de segurança, muitas vezes a Light não consegue atuar na comunidade, tanto para realizar serviços de campo, como para desenvolver projetos de eficiência energética. E que a Empresa mantém um programa de manutenção em toda a sua área de concessão. Sobre o atendimento, informa que atualmente quase todos os serviços podem ser pedidos ­on-line, pela Agência Virtual (www.agenciavirtual.light.com.br), sendo necessária a presença do cliente nas lojas da Light apenas para alguns serviços, como pedidos de ligação nova e alteração de carga.

O atendimento virtual também pode ser acessado pelos seguintes canais: Redes Sociais – @lightclientes e facebook.com/lightclientes; Disque-Light Comercial: 0800 282 0120; Disque-Light Emergência: 0800 021 0196; SMS: para informar falta de energia, envie apenas o seu código da instalação por SMS para 54448 ou pelo Twitter, enviando por DM (mensagem direta) “#luz código da instalação”.

Um passado de problemas

Atanásio Amorim, alfaiate, recorda do tempo que foi presidente da Associação da Baixa do Sapateiro, no final dos anos 1960. Na época, a energia era fornecida por cabines de luz, cada uma gerenciada por um morador. “Tinha a do Pedro Torres, do Cícero Humanitário, e do Celso Carvalho. Essa última era muito boa, já a do Cícero era fraca”, relembra.

“Celso deixou a dele com os outros para tomar conta e apareceram extensões, que não pagavam, e a Light cortou. Formamos uma comissão, e fomos até o Celso. Ele nos entregou a rede. Descobrimos que, de um total de 80 usuários, 25 eram gatos. Pagamos a dívida e transformamos em cabine Santa Luzia”. Com o ato, Atanásio participou da comissão de luz por três anos. “Com o tempo, a comissão municipal ficou com as cabines, e queriam a nossa, não demos”, comenta.

Para resolver a situação, ele foi à Secretaria Municipal de Energia e descobriu que existia uma ordem de prisão por rebeldia. “Expliquei que existiam 53 associados da cabine e que tínhamos pago 1.500 cruzeiros. Lá, fiquei sabendo que o senhor Celso não podia vender. Falei que só entregava se nos indenizássemos. Aceitaram e veio a indenização e a carta de prisão foi-me entregue para guardar de recordação”.

Vários postes apresentam risco de cair na Rubens Vaz | Foto: Elisângela Leite

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