Após dez anos da primeira promessa, os mareenses podem finalmente ter acesso ao que é de direito
Por Júlia Motta (*)
No dia 22 de março, foi publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro o resultado do processo de licitação do tronco-coletor Roquete Pinto, que promete implantação de um sistema de esgoto sanitário e de drenagem pluvial no Conjunto de Favelas da Maré.
O Maré de Notícias falou sobre esse assunto algumas vezes. Na última matéria produzida sobre saneamento básico, contamos o drama da prometida obra ETE-Alegria, em 2013, pela CEDAE, completando dez anos este ano e jamais concluída.
Em apuração, descobrimos que essa obra, agora sob responsabilidade do Programa de Saneamento Ambiental (PSAM), coordenado pela Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS), não abrange mais a Maré, que será atendida por outro tronco-coletor, o Roquete Pinto.
A última atualização que tivemos até a publicação dessa matéria publicada em 1 de abril de 2023 era que a obra estava em processo de licitação, e a expectativa era de mais espera. Porém, no dia 22 de Março, o Diário Oficial noticiou o resultado, que concedeu à Hydra Engenharia e Saneamento Ltda a responsabilidade pela construção do tronco, por R$ 36.752.500,46.
Apesar da conquista, o cenário é contraditório: por um lado, temos uma obra completando dez anos inacabada, por outro, mais uma promessa. Será que finalmente os mareenses podem voltar a sonhar com acesso ao que lhes é de direito, o saneamento básico? Qual a previsão de conclusão dessa obra? Será que a Maré aguenta mais dez anos de espera?
Outra questão importante é sobre a área de abrangência. Segundo o site da PSAM, a obra vai ser construída no Parque Roquete Pinto e vai atender apenas a essa comunidade. O Complexo da Maré é composto por 16 favelas, todas com problemas de coleta de esgoto. É preciso uma obra que atenda à toda população, e urgente. Acesso ao saneamento é um direito básico como o próprio nome já diz. E os mareenses estão há mais de dez anos esperando uma solução.
O Maré de Notícias então entrou em contato com o Programa de Saneamento Ambiental (PSAM) para sanar essas e outras dúvidas a fim de levar esclarecimentos aos moradores. Porém, não obtivemos retorno até o momento. Segundo o ambientalista Sérgio Ricardo, do Movimento Baía Viva, os processos de licitação são mesmo feitos sem transparência, com falta de informações. “Nesse caso, eles acabam colocando ‘saneamento no Complexo da Maré – Roquete Pinto’, para conseguir uma montanha de dinheiro para o Complexo porque é muito populoso, mas na hora fazem só a Roquete Pinto. Ou seja, superfaturam a obra.”
Conversamos também com o Instituto Trata Brasil, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, que desenvolve projetos em comunidades vulneráveis ao saneamento básico.
Luana Pretto, presidente executiva do Instituto, relata a importância do saneamento básico na vida como um todo. “A falta do saneamento gera uma série de doenças como dengue, esquistossomose, leptospirose, diarreia e isso faz com que a população tenha menor qualidade de vida e menor possibilidade de desenvolvimento econômico e social”, afirma. Essas doenças impactam no aproveitamento escolar das crianças e na produtividade no trabalho dos adultos, segundo Luana.
Um sistema de esgoto decente é mais que coleta de rejeitos. É dignidade de vida, mais oportunidades e valorização local. Luana reforça que “especificamente no caso da Maré e das favelas, precisa tratar o saneamento como um tema prioritário, porque existe uma grande população que reside nesses locais e que precisa ter a mesma dignidade de quem tem acesso a esse serviço”, e complementa defendendo que “essa pode ser sim uma força motriz de transformação social na vida dessas pessoas, um sistema básico que vai impulsionar o desenvolvimento e a geração de renda nesses locais”.
(*) Júlia Mota é estudante de jornalismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e faz parte do Curso de Extensão Conexão UFRJ com o Maré de Notícias.
Saiba mais: