Monitoramento da Redes da Maré expõe desrespeito à ADPF das favelas em operações policiais

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Às vésperas do lançamento do 8º Boletim Direito à Segurança Pública na Maré, uma operação iniciada na terça-feira, que durou mais de 32 horas, deixou seis pessoas mortas, sete feridas e 140 mil em pânico, prova a importância do levantamento de dados para o controle social da atividade policial. Em 2024, chegamos ao triste total de duas pessoas mortas por mês no Conjunto de Favelas da Maré em operações policiais. O número já é maior que o do ano passado, onde ocorreram oito mortes durante 34 operações.

Os dados anuais do boletim relativos a 2023, mostram que o desrespeito à ADPF 635, ou ADPF das Favelas, é uma conduta do Estado. No ano passado, a polícia descumpriu sistematicamente seis preceitos da ação; só na operação desta semana, foram desrespeitadas cinco recomendações.

Um dos destaques foi a ausência no uso de câmeras corporais pelos agentes da segurança pública, importante dispositivo para combater ilegalidades durante as operações. Em 2023, somente em sete das 34 operações policiais foi observado o uso de câmera de vídeo nos uniformes dos agentes. A ausência de perícia em situações de morte também chama a atenção.

Em nenhuma das oito mortes ocorridas foi realizada a perícia e, em quatro delas, houve indício de execução. Apenas uma das cinco mortes ocorridas na operação desta semana passou por perícia, ocorrida no local onde o policial morreu. Prova de que a ausência desse importante elemento para eventuais processos de responsabilização não é um caso isolado.

O Estado cometeu 211 violações de direitos humanos durante as incursões dos agentes de segurança pública no conjunto de 15 favelas da Maré ao longo de 2023. A mais recorrente foi a invasão de domicílio, que aconteceu em 77% das operações, seguida de dano ao patrimônio. Em terceiro lugar, vem o furto de pertences e em quarto lugar, ameaça. Existe maior incidência de violações de direitos em operações policiais planejadas, o que denota um modus operandi que desrespeita o morador e que não segue qualquer tipo de protocolo de controle e uso da força por parte do Estado.

Esses são alguns dos dados apresentados no levantamento anual feito pelo Eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré. Um dos relatos de uma vítima dessas violações obtido pela equipe retrata o processo de criminalização da pobreza, que considera suspeito todo e qualquer cidadão que viva naquele território. Nesse caso, uma profissional teve seu estabelecimento invadido pela polícia durante uma operação, o material de trabalho destruído e pertences furtados.

“Vi uma cena de terror! Tudo o que conquistei com muito suor foi destruído. Quebraram a porta, armário, teto de PVC, geladeira, jogaram meus materiais de trabalho na rua. Minhas espreguiçadeiras quebradas, e o estoque de guaraná, coca-cola, entre outras bebidas, tomaram tudo. Levaram o som, a sanduicheira e alguns produtos de bronzeamento”.

Os dados mostram redução de 70% no número de mortes na comparação com 2022 em contraste ao aumento no número de operações: foram 20 a mais do que no ano anterior. Esse quadro segue a tendência do estado do Rio de Janeiro, que registrou redução de 34% na letalidade policial em operações. Por outro lado, a presença ostensiva da polícia no território gera outros tipos de violência aferidos pelo monitoramento, bem como afeta o acesso da população a direitos básicos, como saúde e educação.

Estudantes perderam um quarto do semestre letivo de 2023 devido ao fechamento de escolas durante operações. No acumulado do ano, a população ficou 26 dias sem atendimento no sistema de saúde por interrupção no funcionamento das unidades em dias de atuação policial. O levantamento também mostra que sete em cada 10 vítimas de algum tipo de violência são pessoas negras, apresentando prevalência de violações sobre as pessoas pretas, pois estas compõem mais de um terço das vítimas, superando o número de vítimas pardas, que é o perfil majoritário nas favelas da Maré.

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