Nova reitoria da UFRJ promete estreitar relação com a Maré 

Data:

Revitalização da para promoção de local de convivência é uma das promessas e novidades de acolhimento para moradores

No último dia 4 de agosto, ocorreu a cerimônia de transmissão de cargos da reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O professor Carlos Frederico Rocha transfere a função de reitor para Roberto Medronho e para Cássia Turci, nova vice-reitora. Eles conduzirão a instituição até julho de 2027. Medronho é professor titular da Faculdade de Medicina (FM). É também doutor, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e graduado em Medicina pela UFRJ em 1982. Ainda coordenou o Grupo de Trabalho Multidisciplinar para Enfrentamento da Pandemia de Covid-19 (GT-Coronavírus) da UFRJ. Ele é membro titular da Academia Nacional de Medicina (ANM).

Veja a entrevista que o novo reitor cedeu com exclusividade para o Maré de Notícias.

O que representa para a UFRJ a chegada de um reitor com um olhar para a saúde? Como trabalhar a situação do Hospital Clementino Fraga Filho?

A saúde é nosso bem mais valioso. Passamos por uma das maiores crises sanitárias de nossa história com a pandemia de covid-19, que deixou centenas de milhares de óbitos e um grande número de pessoas com sequelas. Testemunhamos a grande contribuição que a Universidade teve no combate ao coronavírus. Ciência salva vidas. Nossas nove unidades hospitalares e de saúde, em especial o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), passam por uma crise sem precedentes, como a questão do seu financiamento e seu quadro de pessoal. Vamos encarar essa questão com prioridade e recuperar nossas unidades para prestar mais e melhores serviços à população. Fazemos parte do SUS e necessitamos de financiamento adequado e reposição de pessoal para a realização de um trabalho voltado a melhorias no sistema público de saúde.

Quais as prioridades de sua gestão?

Ampliar a assistência estudantil e aprimorar o acolhimento aos alunos, especialmente aos que estão em condição de vulnerabilidade socioeconômica. Precisamos expandir os restaurantes universitários e a residência estudantil. Dessa forma, podemos reduzir a evasão desses estudantes. É inaceitável ver um aluno que foi aprovado para uma das melhores universidades do país ter que abandonar o curso por questões socioeconômicas. Não podemos permitir que isso ocorra. 

Vislumbrando tornar o processo de aprendizagem cada vez mais participativo e inclusivo, precisamos incentivar a utilização de metodologias ativas de ensino. É necessário que encantarmos os estudantes para a magia do conhecimento e mostrar que, dessa forma, podemos transformar essa sociedade profundamente desigual.

É fundamental investir em nossa infraestrutura para tornar o ambiente de ensino-aprendizagem e de pesquisa mais adequado. Para tal, é fundamental recebermos recursos orçamentários suficientes. 

Precisamos estreitar nossa relação com a sociedade. O melhor combate às fake news se faz pela disseminação de informação relevante. Além disso, a UFRJ precisa estar mais presente nas comunidades, especialmente nos territórios circunvizinhos a ela, como na Maré. Esse processo é uma via de mão dupla. Levamos conhecimento e ações concretas para melhorar a vida das pessoas e nossos alunos tornam-se mais conscientes da importância de mudar essa realidade. A missão da UFRJ é contribuir para a formação de cidadãos comprometidos com a transformação social e não apenas profissionais para o mercado de trabalho.

Precisamos fomentar as artes e as culturas, em especial, a cultura popular. O samba, o funk e todas as expressões artísticas têm que estar conectadas à Universidade. Como dizia o grande Candeia: “Cante um samba na Universidade e verás que seu filho será príncipe de verdade (…)”. Sou parceiro de Noca da Portela há 40 anos e sei da importância da cultura popular para o desenvolvimento da nação. Pretendemos fazer festivais de música e de todas as manifestações artísticas para ampliar essa conexão entre a Universidade e a sociedade. Temos muito o que aprender com a sabedoria popular.

Com relação aos recursos, como serão as obras necessárias para a Universidade?

Acreditamos que o governo Lula irá priorizar os investimentos em educação e saúde. Dessa forma, poderemos melhorar nossa infraestrutura. Sempre digo que ajudaremos o presidente Lula a reconstruir este país. Com os investimentos adequados, cada centavo investido na UFRJ retorna de forma exponencial em bons serviços à sociedade.

Os estudantes pobres, e em sua maioria negros, são os que mais precisam de bolsas. Há algo que possa ser feito para que esses alunos não sejam obrigados a abandonar a Universidade?

Com certeza! Costumamos dizer que, assim como o Programa Bolsa Família, a política de cotas e de ampliação das vagas nas universidades implementadas pelo presidente Lula foram uma das maiores políticas de inclusão social realizadas em nossa história. Precisamos agora ampliar a assistência estudantil a esses estudantes para que eles se formem. Assim, eles poderão mudar sua vida, a de sua família e da comunidade onde estão inseridos.

Para o senhor, o que é educação e como ela deve ser estruturada para que todos tenham acesso a ela?

Educação liberta. Um povo instruído é o grande medo de certos políticos, que, hoje, estão em maioria no país. Educação transforma. Transforma a pessoa, sua família e sua comunidade. Como diz Caetano Veloso em sua bela canção Haiti, composta por ele e Gilberto Gil: “E na TV se você vir um deputado em pânico / Mal dissimulado / Diante de qualquer, mas qualquer mesmo / Qualquer, qualquer / Plano de educação (…)”.  Aliás, a história do Haiti é extraordinária e inspiradora! O país conquistou sua independência em 1804. Foi a primeira nação independente da América Latina e do Caribe e o único país do mundo fruto de uma revolta das pessoas que eram escravizadas, que ousaram lutar contra a opressão e tomar para si o seu próprio destino. Foram duramente retaliados, sofreram cruel bloqueio econômico por décadas e foram obrigados a pagar indenização ao colonizador.

Moradores da Maré usam no final de semana o campus como área de lazer. Como o senhor vê essa utilização?

Somos totalmente favoráveis. A UFRJ é do povo brasileiro! Inclusive, é nossa proposta ampliar esses espaços, dotando-os de melhor infraestrutura. Para isso, precisamos de recursos, que iremos buscar não apenas no Ministério da Educação (MEC), mas também no Ministério dos Esportes. Precisamos que as áreas do campus Cidade Universitária sejam utilizadas pelos moradores da Maré e por nossa comunidade universitária nos finais de semana. Nossa ideia é promover eventos artísticos e esportivos. Pretendemos, também, revitalizar nossa orla e torná-la um local de convivência, inclusive, nos fins de semana.

A Maré fica ao lado da UFRJ, mas às vezes fica distante. O que vai ser feito para garantir esse movimento de extensão?

Ao longo dos últimos anos, a UFRJ vem construindo um relacionamento sólido e pautado no diálogo com os moradores. Compreendermos o nosso papel social e a importância da educação como catalisador de um processo de mudança. Por acreditarmos no potencial dos moradores, investimos continuamente no desenvolvimento de projetos e parcerias. No entanto, precisamos ampliar nossa interação. Atualmente, a UFRJ desempenha projetos em parceria com a Maré, como os listados a seguir:

Projeto de extensão “Musicultura!” – estuda a diversidade musical produzida nas favelas cariocas e os diferentes temas ligados à música e à região, como a memória do samba da Maré, cujos resultados romperam com habituais estereótipos ligados à favela. O projeto é uma parceria do laboratório de Etnomusicologia da UFRJ com o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM). Os moradores participantes não precisam ter experiência musical. 

Projeto Núcleo Ecoclima – o Programa de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica e da Química (PEA) da UFRJ, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (PR-2) da Universidade, está colaborando com o projeto Núcleo Ecoclima, iniciativa da Redes da Maré e da Petrobras. O seu objetivo é fornecer e promover cursos lúdicos sobre temas da Educação Ambiental e da Engenharia Ambiental, usando metodologias ativas de aprendizagem. Além disso, contribui para a implementação de pilotos adaptados aos espaços físicos de uma comunidade, tais como telhado verde, compostagem, tratamento de esgoto e aproveitamento do biogás, recuperação do manguezal no entorno, reciclagem de resíduos de plásticos e eletroeletrônicos.

Projeto Escreva Seu Futuro – é voltado à alfabetização de mulheres da Maré. O curso envolve um percurso de dez meses e, ao término dele, após avaliação diagnóstica e articulação com as escolas públicas da Maré, a equipe realiza o encaminhamento para uma das instituições que atendem a modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

Como o senhor define Roberto Medronho?

Um sonhador que deseja tornar os seus sonhos realidade. Contudo, compreendo que meus sonhos são fruto de uma construção coletiva, fundamentada no apoio e colaboração dos demais. Acredito que o acesso à educação e a inclusão social são os principais agentes para a transformação do Brasil em um país mais justo e igualitário.

Um recado aos leitores do Maré de Notícias:

Precisamos ajudar nosso presidente Lula a unir e reconstruir este belo país. Para isso, é fundamental que estejamos juntos. A UFRJ sempre estará aberta à comunidade da Maré. É necessário ampliar iniciativas que nos aproximem. A Maré tem muito o que nos ensinar! E nós podemos contribuir para melhorar a qualidade de vida dessa comunidade.

Compartilhar notícia:

Inscreva-se

Mais notícias
Related

Por um Natal solidário na Maré

Instituições realizam as tradicionais campanhas de Natal. Uma das mais conhecidas no território é a da Associação Especiais da Maré, organização que atende 500 famílias cadastradas, contendo pessoas com deficiência (PcD)

A comunicação comunitária como ferramenta de desenvolvimento e mobilização

Das impressões de mimeógrafo aos grupos de WhatsApp a comunicação comunitária funciona como um importante registro das memórias coletivas das favelas

Baía de Guanabara sobrevive pela defesa de ativistas e ambientalistas

Quarenta anos após sua fundação, o Movimento Baía Viva ainda luta contra a privatização da água, na promoção da educação ambiental, no apoio às populações tradicionais, como pescadores e quilombolas.

Idosos procuram se exercitar em busca de saúde e qualidade de vida

A cidade do Rio de Janeiro tem à disposição alguns projetos com intuito de promover exercícios, como o Vida Ativa, Rio Em Forma, Esporte ao Ar Livre, Academia da Terceira Idade (ATI) e Programa Academia Carioca