O anormal novo normal

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A flexibilização não significa relaxamento nem o fim da pandemia

Por Hélio Euclides em 19/09/2020

Tem dias que acordamos e não estamos para conversa, tampouco para visitas. Mas sem esperar chega aquela pessoa inconveniente, que deixa a gente mais desanimado e não tem hora para ir embora. Quem “chutou” que o nome do chato é COVID-19, acertou em cheio. Este personagem, que assombra 2020, insiste em permanecer em nossas vidas, por isso é necessário não baixar a guarda e continuar com os cuidados de prevenção. Porém, ao andar pelas ruas da cidade e, principalmente na Maré, parece que tudo já voltou ao normal, mas o vírus é invisível e continua a se espalhar. 

O mês de agosto começou com um alerta. O Boletim do Observatório Fiocruz COVID-19, que analisou a primeira quinzena do mês, mostra que os casos diários de COVID-19 no estado do Rio de Janeiro inverteram a tendência e voltaram a subir 8,4% em relação ao mês de julho. Nos dias 20 e 21 de agosto, a média móvel apontou tendência de alta das mortes. No dia 20, foram registradas 128 mortes, o que elevou a média móvel de mortes diárias para 99 óbitos. Na comparação com o início do mês, houve um aumento de 35%. Para saber a média móvel, basta somar o número de novos casos ou mortes dos últimos 7 dias e dividir por 7. Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde, o estado tem no dia 24 de agosto quase 15,4 mil óbitos e mais de 211,3 mil casos confirmados.

O grande receio é a publicação de Decreto do governo do Rio de Janeiro, que traz normas para uma nova fase de reabertura da economia. Entre as medidas, está a liberação de funcionamento de cinemas e teatros em regiões onde o risco é considerado baixo há pelo menos duas semanas seguidas. A norma depende, no entanto, das prefeituras. O Decreto também prevê a volta às aulas presenciais.

Uma Maré sem máscaras

Por meio do Decreto nº 47.375, de 18 de abril, a Prefeitura tornou obrigatório o uso de máscara facial para quem sair às ruas e circular nos estabelecimentos abertos ao público ou nos meios de transportes públicos ou privados da cidade. Na Maré, os comércios fixaram cartazes sobre a necessidade do uso da máscara. Graça Nascimento, de 66 anos, moradora da Vila dos Pinheiros, enquadra-se no grupo de risco e vê o uso da máscara muito importante. “Sempre uso a máscara, é uma proteção, pois estou na 3ª idade e tenho diabetes”, conta. Para Luciene Brito, de 37 anos, moradora do Parque União, o acessório precisa virar parte do vestuário. “Usar máscara precisa virar um costume de vida. Eu me protejo e ao meu filho. Já vi casos de doenças e até morte no meu trabalho. O problema é que poucos usam máscara nas ruas”, diz.

“Esta doença não está de brincadeira. Todos da minha família se cuidam, fazem a higienização, sempre. Só saio para fazer as compras com máscara e quando chego lavo bem as frutas e legumes”, diz Romilda Santos, de 71 anos, moradora da Vila dos Pinheiros. Já Luana Ramos, de 30 anos, moradora do Parque União, além de proteção, integra a máscara ao seu estilo de vestir. “A máscara é um acessório, tem que combinar com a tiara e a roupa. Protejo-me ao máximo, pois tenho filho e idosos em casa. Estou fazendo a minha parte, pois o povo não está nem aí”, conclui.

Ficar em casa é a principal medida para reduzir a velocidade de transmissão do coronavírus. Mas, fora deste ambiente, alguns espaços podem representar maior ou menor risco de contágio da COVID-19. Para compras em supermercados, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda higienizar as alças dos carrinhos de compras ou cestas, antes do uso. Também lavar bem as mãos após chegar em casa e depois de manusear e armazenar os produtos adquiridos. Outra dica é higienizar as superfícies muitos tocadas, como maçanetas, teclados do computador e celulares.

Um vírus ainda presente

Marcelo Gomes, pesquisador em saúde pública no Programa de Computação Científica da Fiocruz, acredita que o vírus ainda está presente e que é fundamental manter o uso de máscara, a higienização e o distanciamento. Ele entende quem está frustrado com tanto tempo de distanciamento e que as autoridades têm um papel fundamental em dar condições e passar informações precisas para que a população entenda os riscos. “Do contrário, não podemos colocar a culpa em quem não está seguindo as recomendações. Só começou a diminuir os casos, porque a população fez a sua parte. Se a gente volta a se expor, retorna a subir”, diz.

Há várias semanas que o InfoGripe vem alertando que há sinais de que o novo coronavírus no estado não está mais em queda. “Infelizmente, parece que essa mensagem não tem sido levada em conta”, destaca o pesquisador Para ele, a proximidade pode facilitar a transmissão. “Locais pouco arejados e de grande circulação de pessoas, como ônibus e centros comerciais estreitos e pequenos mercados muito frequentados, são os mais preocupantes. Isso porque a baixa circulação de ar faz com que o vírus tenha mais facilidade de se transmitir. Já em locais abertos, como as feiras livres, o risco é menor, pois o ar circula mais fácil”, expõe.

O pesquisador percebe que há um desafio nos registros oficiais dos números de infectados e mortes. “A questão do endereço usado pelas pessoas das comunidades muitas vezes não consta nos registros dos correios ou do município, por isso não identifica que o caso é daquele local. Nisso, os dados extraoficiais podem ajudar muito”, diz. Ele também defende as ações comunitárias. “Nas comunidades, é valioso se montar uma espécie de vitrine virtual, onde os comerciantes podem divulgar os seus produtos. A partir daí, a pessoa faz o pedido e vai aos pequenos centros comerciais só para pegar as compras”, conta. Marcelo acredita que seria uma proteção para os clientes, comerciantes e a diminuição dos impactos econômicos.

Para Nathália Mendes, jornalista, nascida e criada no Vidigal, é preciso que haja ações do poder público nas favelas. “Lutamos pela Lei nº 6.760/20, que estabelece um programa municipal contra o coronavírus. A proposta é a contenção da doença e um auxílio aos moradores das favelas para diminuir os impactos financeiros. Não podemos ficar parados, é preciso lutar pela população mais vulnerável”, avalia.

É muito importante manter os cuidados na rua. Lembre-se sempre de:

– Lavar as mãos com água e sabão

– Usar máscaras

– Tentar manter o distanciamento de pelo menos 1,5 metros

– Evitar tocar olhos, nariz e a boca com as mãos sem lavá-las

– Higienizar as mãos com álcool em gel, frequentemente, ao sair

– Limpar e desinfetar objetos e superfícies que as pessoas tocam com muita frequência.

Os casos e óbitos nas favelas

Para coletar e divulgar dados sobre o alcance da COVID-19 nas favelas do Rio de Janeiro, devido à insuficiência de testes e de dados públicos adequados, na percepção das entidades envolvidas, foi criado o Painel Unificador COVID-19 nas Favelas do Rio de Janeiro. Trata-se de uma pesquisa cidadã, cujas fontes são uma rede confiável de mobilizadores, organizações e comunicadores de favela, além de dados públicos. A partir do Painel, é possível identificar a diferença entre os números registrados pela Prefeitura e pelas organizações locais.

Veja a comparação dos Painéis COVID-19 da Prefeitura e do Unifi cador
de Favelas (02 de setembro):

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