O nome é Esperança, mas podia ser resistência

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Moradores, como a Vó da Padaria, são exemplos de luta, trabalho e conquista por um lugar sob o sol da Maré

Camille Ramos

Entre o prédio de expansão da Fiocruz e o Canal do Cunha, foi erguido, em 1982, o Conjunto Esperança. Os 1.400 apartamentos divididos em 35 edifícios receberem cerca de sete mil pessoas – uma delas foi Elcyr Paixão de Albuquerque, ou, como é mais conhecida, a “Vó da Padaria”.

A história de Dona Elcyr, hoje com 97 anos, começa muito longe da Maré, em São Luís do Maranhão, cidade de onde veio fugida de seu marido, quando tinha lá pelos 37 anos. Ao chegar ao Rio, com uma maletinha amarela e uma criança de seis anos, não poderia imaginar que teria um lugar reservado pra chamar de seu: a Maré. O que primeiro chamou sua atenção no bairro não foi muito bom: lonas pretas esticadas nas beiradas da Avenida Brasil. Na época, por falta de passarelas e pelo pouco conhecimento dos perigos de uma via expressa, as pessoas atravessavam a avenida e eram atropeladas.

Um lugar chamado Esperança

Ao chegar, Dona Elcyr foi morar nas palafitas do Parque União. Depois, por causa das remoções do Projeto Rio*, iniciado em 1979, ganhou um apartamento no Conjunto Esperança. Em 1982, depois de ter se mudado para o Conjunto Esperança, começou a trabalhar na padaria, onde virou quase “uma lenda”. “Esse Conjunto foi construído em cima de um mangue e ele ainda existe. O cheiro era muito forte. Aqui, era uma construção para abrigar militares e nós conseguimos vir antes deles e tomamos conta”, brinca. Detalhe importante: entre os antigos, comenta-se que alguns prédios seriam mesmo ocupados pelos militares e que os moradores tomaram posse antes e ficaram até hoje.

Os prédios eram coloridos e próximos à Avenida Brasil. Por falta de comércio na região, foram se improvisando espaços – o que originou, às margens da Baía de Guanabara, um conjunto de casas construídas pelos próprios moradores, que foi chamado de Vala Shopping (por causa da proximidade com o Canal do Cunha), que tinha construções com lojas no 1º andar e casas no 2º. O local também é conhecido como Vila Esperança ou Pata Choca.  “Eu vi tudo isso crescer”, conta a senhora que, ao longo de quase quatro décadas, virou símbolo e patrimônio do Conjunto Esperança.

Você sabia?

*Em 1979, o Ministério do Interior idealizou o Projeto Rio, que foi posto em prática pelo Banco Nacional da Habitação (BNH). Seu objetivo era remover palafitas, aterrar aquela parte da Baía de Guanabara, expulsar a população que há décadas residia na região e, assim, torná-la mais “moderna e civilizada”. De acordo com o site www.rioonwhatch.org.br (relatos das favelas cariocas), os conselhos de moradores resistiram à ofensiva. O governo recuou e permitiu que os moradores permanecessem no local. As palafitas, no entanto, foram removidas e seus moradores realocados em complexos habitacionais construídos em aterros próximos. Assim, surgiram os conjuntos habitacionais Vila do João, Vila do Pinheiro, Conjunto Pinheiro e Conjunto Esperança.

*O Conjunto Esperança tem cerca de 1.870 domicílios e 5.356 habitantes. (Censo Maré 2003.

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