O que contam os nomes das Clínicas da Família da Maré 

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No mês do Dia Mundial da Saúde (07/08), selecionamos algumas histórias que dão nome às Clínicas da Família da Maré.

Por Maria Clara Paiva (*). Editado por Daniele Moura

Atualmente, o Conjunto de Favelas da Maré conta com 11 unidades de saúde pública, dentre elas quatro Clínicas da Família (CF). Essas unidades de atenção promovem a saúde e buscam prevenir a disseminação de doenças por meio de atendimentos individuais, visitas domiciliares e grupos especializados.

O principal objetivo é garantir o acesso universal à saúde, ampliando a cobertura do atendimento médico e assim melhorando índices de morbidade e mortalidade. Essas unidades oferecem serviços de atenção básica, com diferentes especialidades. 

Histórias mareenses

No mês do Dia Mundial da Saúde (07/08), selecionamos algumas histórias que dão nome às Clínicas da Família da Maré. A primeira foi a Augusto Boal, que surgiu da união de dois Programas de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) que acolhiam o Morro do Timbau, Nova Maré, Conjunto Bento Ribeiro Dantas e Baixada do Sapateiro. A Augusto Boal fica localizada em Bonsucesso e foi a fusão dos postos Vicente Mariano e Elis Regina, que funcionam dentro de CIEPs. Inaugurada em 11 de dezembro de 2010, a clínica ocupa o antigo SESI e leva o nome do dramaturgo, nascido na Penha, que foi um dos grandes nomes do teatro brasileiro. 

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Augusto Pinto Boal (1931-2009) é o criador do Teatro do Oprimido, que traduziu a realidade de seu país nos palcos, com uma maneira brasileira de falar, sentir e pensar. Na dimensão política e social sua obra é concebida como um instrumento de transformação por meio da linguagem. Na Maré, ele foi responsável por formar diversos jovens, organizando grupos de teatro na favela.

Seis anos depois, a CF Ministro Doutor Adib Jatene surgiu na Vila dos Pinheiros após o fechamento do Posto Médico Gustavo Capanema, que também funcionava em um CIEP. O prédio localizado próximo ao Conjunto Pinheiros leva o nome de Adib Domingos Jatene (1929-2014) cirurgião, professor universitário e cientista, responsável por um dos primeiros modelos de coração-pulmão artificial do país. Era membro da Academia Nacional de Medicina e foi ministro da Saúde por duas vezes, durante o governo de FHC e Collor. 

Em 2018, a Clínica Diniz Batista dos Santos foi inaugurada no Parque União no lugar dos postos de saúde da Associação de Moradores do P.U e do CIEP Hélio Smidt. A unidade leva o nome do morador que nasceu no nordeste, em 1926, e veio para o Rio de Janeiro aos 25 anos em busca de trabalho. A responsável pela nomeação foi uma de suas filhas, que elaborou um abaixo assinado contando a história de seu pai e enviou para um dos responsáveis da prefeitura. 

“Dar nomes a ruas e lugares como uma unidade de saúde, ao meu ver, é uma garantia da memória. É uma forma da pessoa ser lembrada. E nada mais justo do que esses nomes terem relação com a história da própria favela.”

Suzane Santos, neta de Diniz Batista dos Santos

Diniz morou por oito anos nas palafitas da Baixa do Sapateiro e depois se mudou para o Parque União, já casado e com filhos. Foi um empreendedor, abriu um armazém, uma empreiteira e foi responsável por empregar muitos moradores. Com 11 filhos e 2 sobrinhos, morreu em 2008 deixando seu legado. Segundo sua neta, Suzane Santos (29), quando os avós chegaram na comunidade existiam poucas casas na região e o prédio em que moravam foi o primeiro a ser construído lá e pela empreiteira de Diniz. “Hoje o Parque União é quase todo tomado de prédios, alguns deles também construídos pelo meu avô.”

Jeremias Moraes da Silva

Diferente do processo que determinou o nome da unidade do P.U, a iniciativa que nomeou a última clínica inaugurada na Maré chegou pelo presidente da associação de moradores, também em 2018, na Nova Holanda. A  CF Jeremias Moraes da Silva atende cerca de 30 mil pessoas das favelas Rubens Vaz e Parque Maré e homenageia o menino de 13 anos morto durante uma operação da Polícia Militar, quando ia par aula de violão perto da praça da Nova Holanda.

Vânia Moraes da Silva, mãe de Jeremias, conta que o prefeito da época, Marcelo Crivella, procurou a associação para solicitar uma autorização para que a homenagem fosse feita, e assim o processo começou.

“Na época eu te garanto que fiquei muito feliz, era uma prova viva de que meu filho era inocente”.

Vânia Moraes da Silva, mãe de Jeremias.

Mas Vânia completa que após a emoção do momento, a placa que homenageia seu filho na entrada da clínica foi motivo de indignação: “foi gratificante, porém é vergonhoso; tem uma foto dele dizendo que foi baleado por uma bala perdida, quando não foi bala perdida, meu filho foi assassinado”.

Esses são apenas alguns dos exemplos de aparelhos públicos que carregam homenagens em seus nomes. Para a neta de Diniz Batista dos Santos, essa é uma garantia da memória. “É uma forma da pessoa ser lembrada, e nada mais justo do que esses nomes terem relação com a história da própria favela”. Além das CFs, existem outras unidades de saúde que homenageiam moradores, como é o caso do Centro Municipal de Saúde Américo Veloso. O CMS que funciona na praia de Ramos desde 1970, quando atendia moradores do Complexo do Alemão, foi a primeira unidade de saúde da comunidade, que deixou de fazer parte de Ramos com a criação da Maré. O nome dado ao posto homenageia o médico Américo Veloso, morador da Maré que atendia a comunidade gratuitamente e foi um dos responsáveis por conseguir o terreno em que hoje funciona a unidade. 

Hoje, além das 4 clínicas, Maré conta com mais 7 unidades de saúde pública: a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), três Centros Municipais de Saúde (CMS), um Centro de Atenção Psicossocial II (CAPS II), um Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil II (CAPSi II) e um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas III (CAPSad III).

ONDE IR: 

  • CMS Américo Veloso: Rua Gerson Ferreira, 100 — Ramos. De segunda a sexta, das 7h às 18h; sábados, das 8h às 12h;
  • CMS Vila do João: Rua 17 S/N — Vila do João. De segunda a sexta, das 7h às 18h; sábados, das 8h às 12h;
  • CMS João Cândido: Avenida. Lobo Júnior, n° 83 — Marcílio Dias. De segunda a sexta, das 7h às 17h;
  • CF Augusto Boal: Avenida Guilherme Maxwel, 901 — Bonsucesso. De segunda a sexta, das 7h às 18h;
  • CF Adib Jatene: Avenida Bento Ribeiro Dantas, S/N — Vila do Pinheiro. De segunda a sexta, das 8h às 17h;
  • CF Jeremias Moraes da Silva: Rua Teixeira Ribeiro, s/n — Nova Holanda. De segunda a sexta, das 7h às 16h;
  • CF Diniz Batista dos Santos: Avenida Brigadeiro Trompowski, SN — Parque União. De segunda a sexta, das 7h às 18h; sábados, das 8h às 13h;
  • CAPS II Carlos Augusto da Silva (Magal) –  Atende apenas adultos. Endereço: Avenida Dom Hélder Câmara, nº 1.390, fundos — Manguinhos. De segunda a sexta, de 8h às 17h;
  • CAPSi II Visconde de Sabugosa –  Centro de atendimento a crianças e adolescentes. Endereço: Avenida Guanabara, s/n — Praia de Ramos. De segunda a sexta, das 8h às 17h;
  • CAPSad III Miriam Makeba – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas. Endereço: Rua Professor Lacê, 485 — Ramos. De segunda a domingo, 24h.

    SAIBA MAIS:

Conexão Saúde reduz mortalidade por Covid-19 na Maré (RJ) (fiocruz.br)
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(*) Maria Clara Paiva é estudante universitária de Jornalismo vinculada ao Curso de Extensão Conexão UFRJ – Maré, uma parceria entre o Maré de Notícias e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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