O resultado dos confrontos armados na Maré

Data:

Saiu o Boletim de Segurança Pública na Maré de 2017

Daniele Moura

Desde 2016, a Redes da Maré monitora os dados referentes à Segurança Pública e seus desdobramentos, nas 16 favelas que fazem parte do território da Maré. Em 2017, esse monitoramento incluiu os confrontos entre grupos armados, além dos agentes de Segurança Pública. Foram coletados dados de todas as operações policiais (todas as polícias e Forças Armadas) e também dos grupos armados rivais, de janeiro a dezembro de 2017.  Esses dados foram reunidos de várias formas: por uma equipe da Redes da Maré, constituída por moradores em sua maioria,  que fica de plantão  quando acontecem os confrontos armados; pelo relatos de moradores que procuram o serviço de  orientação jurídica oferecido pela Organização para denunciar violações de direitos; por reportagens publicadas na Imprensa  e pelas informações dadas pelas assessorias de comunicação das Polícias Militar e Civil e das Secretarias Municipais de Saúde e Educação da cidade do Rio de Janeiro.

A pesquisa registrou 41 episódios de operações policiais (8 a mais que 2016), 41 confrontos entre grupos armados e 26 eventos com disparos sem confronto, ou seja, promovidos por um único grupo.

 Os abusos

Os dados mostram que houve abusos cometidos pelos policiais. Um exemplo ocorreu em março de 2017, quando o roubo de um veículo de um policial civil na Ilha do Governador fez com que, no dia seguinte, sábado, 25 de março, dia da Campanha de Vacinação contra a Febre Amarela, alguns policiais se juntassem para ir à Maré tentar recuperar o veículo.  A consequência foi um intenso confronto armado, que deixou três mortos e um ferido, além da interrupção das atividades de vacinação nas Unidades de Saúde. Não há informações oficiais sobre a ação nem sobre quem autorizou a intervenção policial. Consultadas, as Polícias Militar e Civil declararam desconhecer o planejamento de qualquer operação policial naquele dia. Esse é um fato gravíssimo, porque revela o descontrole do Estado e de suas forças policiais, que agem à revelia ou com a conivência de agentes públicos, realizando ações sem qualquer respaldo legal.

As consequências

Os confrontos armados, tanto os provocados por intervenção policial quanto por grupos armados, resultaram em 42 mortos e 57 feridos. Foram 35 dias sem aulas e 45 dias sem funcionamento de Postos de Saúde.  Profissionais de Educação e da Saúde já foram atingidos por disparos de arma de fogo enquanto trabalhavam.  E o número de casos de violação de direitos quase dobrou em relação a 2016, passando de 28 para 52 pessoas. Na mesma proporção, o número de relatos de violência também cresceu, passando de 32, em 2016, para 67, em 2017. Esses dados foram coletados a partir do atendimento do Maré de Direitos. Imaginando que nem toda pessoa que sofre violência ou que tenha algum direito violado vai buscar atendimento, esse número, apesar de assustador, pode ser maior, pois tudo indica que há subnotificação.

A duração das operações também interfere no cotidiano das comunidades. Doze operações policiais, durante 2017, ultrapassaram 8 horas de duração. As operações, além do desgaste da população, interferem na Economia local, pois, ao encerrar as atividades mais cedo ou com intervalos ao longo do dia, o comércio local é afetado pelos confrontos, sem contar o número menor de dias letivos e a interrupção dos serviços de assistência à saúde nos Postos da Prefeitura.

Os confrontos armados são a maior causa morte na Maré. E um dos objetivos desta pesquisa foi, justamente, chamar a atenção para a incapacidade de o Estado proteger a população. Esses dados confirmam que o Estado, com a complacência de parte da sociedade, considera que as favelas não têm garantidos direitos básicos, como os direitos à segurança e à vida.

Compartilhar notícia:

Inscreva-se

Mais notícias
Related

Após seis anos, acusados de mandar matar Marielle Franco são presos pela PF

Os suspeitos são os irmãos Domingos Brazão e Chiquinho Brazão, atual conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e deputado federal do Rio de Janeiro, respectivamente, e Rivaldo Barbosa, que é delegado e ex-chefe de Polícia Civil do Rio