A pluralidade se destaca nas escolhas de homens e mulheres com importantes contribuições dentro de suas áreas para chefiar as 37 pastas
Por Andrezza Paulo, Samara Oliveira e Ana Paula Lisboa
A escolha do ministério do terceiro mandato de Luís Inácio Lula da Silva como presidente, foi acompanhada atentamente pelo país inteiro. Depois de quatro anos marcados por políticas públicas equivocadas, aparelhamento dos ministérios e trocas constantes de ministros, os titulares das pastas foram submetidos a intensa avaliação popular e responsáveis pelo suspiro de alívio coletivo, quando seus nomes foram anunciados.
O Executivo conta com 11 mulheres, o maior contingente desde o mandato da ex-presidente Dilma Roussef (nove ministras); além de ter, à frente das pastas, dez dirigentes autodeclarados negros e dois indígenas.
O governo de Jair Bolsonaro teve 23 ministérios, o menor número em 20 anos; o do presidente Lula são 37. Novos ministérios, porém, não significam necessariamente mais custos.
Eficiência, não custos
Segundo a professora e pesquisadora em administração pública e governo da Fundação Getulio Vargas (FGV) Gabriela Spanghero Lottas, em entrevista ao site alemão Deutsch Welle (DW), a distribuição de cargos é central para conseguir apoio no Congresso e aumentar a base partidária através da cessão de cargos para a construção de alianças.
“Lula fez uma composição ministerial que permite a ele tanto garantir maior governabilidade quanto priorizar temas e públicos que o elegeram. Isso explica, em parte, o aumento no número de ministérios. Mas isso não gerará automaticamente aumento de gastos; tudo depende da coordenação e da eficiência”, diz a pesquisadora.
O Maré de Notícias destaca quatro perfis dentro os novos ministros, alguns bastante conhecidos dos mareenses.
UMA MÉDICA PRÓ-VACINA COMO MINISTRA DA SAÚDE
Nísia Trindade é doutora em sociologia e foi como presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de 2017 a 2022, que ganhou destaque nacional.
Foi da Fiocruz que ela liderou os esforços no enfrentamento da covid-19 no país, e isso inclui a criação de um novo Centro Hospitalar no campus de Manguinhos; do manual de biossegurança em escolas; do Observatório Covid-19 para pesquisas e análise de dados; entre outras iniciativas.
A nova ministra da Saúde esteve à frente do acordo entre o Ministério da Saúde, a Universidade de Oxford, a farmacêutica AstraZeneca e laboratórios para a produção de doses de vacina. Nísia coordenou a ação inédita de vacinação em massa contra a covid-19 nas 16 favelas do conjunto de favelas da Maré, em parceria com a secretaria municipal de Saúde e a Redes da Maré. A campanha imunizou cerca de 36 mil moradores com mais de 18 anos com a primeira dose da vacina, em apenas quatro dias.
UMA INDÍGENA NO MINISTÉRIO DOS POVOS ORIGINÁRIOS
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), os chamados povos originários ou indígenas representam 5% da população mundial e são responsáveis pela preservação de 80% da biodiversidade do planeta.
Porém, esta é uma população que é ainda alvo de preconceito e racismo (durante a pandemia, os indígenas foram os mais afetados, de acordo com estudo do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, perdendo 28,6% de renda e vendo o desemprego crescer em quase 3%) e sub-representada nas esferas de poder. É de Sônia Guajajara a tarefa de dirigir este que é um ministério inédito no Brasil e garantir aos indígenas acesso à educação, saúde e a demarcação de suas terras, além de combater o genocídio.
Esta foi, aliás, sua primeira tarefa: o socorro imediato ao grupo de cerca de 700 yanomamis atendidos na Casa de Apoio à Saúde Indígena, em Boa Vista (RO), a maioria crianças com desnutrição grave.
Sônia é do povo Guajajara/Tentehar, habitantes da Terra Indígena Araribóia, no Maranhão. Graduada em letras e enfermagem, fez pós-graduação em educação especial. Em 2022, foi escolhida pela revista americana Time como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.
UM ADVOGADO COMO MINISTRO DOS DIREITOS HUMANOS
Até o fim de 2022, em 30 anos de democracia no Brasil, apenas 12 pessoas negras ocuparam cargos de ministros. Sílvio de Almeida é um homem negro, descrito como um dos maiores intelectuais brasileiros. É graduado em direito e filosofia, mestre em direito político e econômico e doutor em filosofia e teoria geral do direito. Silvio é ainda autor do livro Racismo Estrutural (Pólen; 2019) e presidente do Instituto Luiz Gama.
Em uma de suas primeiras falas como ministro, Sílvio manifestou a intenção de recriar a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, responsável por tentar localizar os ainda 144 desaparecidos durante a ditadura militar. A comissão ficou inativa durante os quatros anos do governo anterior e foi extinta no dia 30 de dezembro de 2022.
UMA ARTISTA COMO MINISTRA DA CULTURA
Segundo o ranking elaborado pela empresa de mídia U.S. News & World Report, a cultura do Brasil está em sétimo na lista das que mais influenciam o mundo, além de ter um mercado interno continental. Por isso, apenas uma secretaria subordinada ao Ministério do Turismo (como na gestão anterior) não é suficiente: com a recriação do Ministério da Cultura, a escolhida para assumir a pasta foi a cantora Margareth Menezes.
O currículo da baiana calou aqueles que se opuseram à sua nomeação por “falta de experiência”: aos 60 anos, Margareth Menezes é artista há mais de três décadas, com quatro indicações ao Grammy, um dos mais importantes prêmios de música do mundo.
Ela é tanto artista como ativista social: em 2004, fundou e assumiu a presidência da ONG Fábrica Social, criada para fomentar a cultura em Salvador através do incentivo ao empreendedorismo, principalmente em comunidades de baixa renda e promovendo ações culturais e sociais voltadas para crianças e jovens de periferia. A entidade ainda atua (através da Associação Fábrica Cultural) no combate ao trabalho infantil, entre outras violações de direitos.