‘Pesquisa sobre saúde mental na Maré é estudo de caso para o mundo’

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Webinar apresenta o estudo Construindo Pontes, investigação sobre a relação entre a violência e sofrimento mental dos moradores do maior conjunto de favelas do Rio de Janeiro

Por Tamyres Matos, em 23/08/2021 às 19h22

Entender a relação entre a violência armada e a saúde mental é a principal motivação da pesquisa internacional Construindo Pontes, cujo resultado foi divulgado nesta segunda-feira (23). Para difundir o debate e apresentar os resultados do trabalho realizado ao longo de mais de 2 anos, participaram de um webinar Eliana Sousa Silva, diretora da Redes da Maré, Paul Heritage, diretor da People’s Palace Projects, Miriam Krenzinger, diretora da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), entre outros convidados. A mediação foi da jornalista Anabela Paiva.

“A discussão sobre saúde mental é estratégica na sociedade. Os efeitos desses confrontos armados, como atingem a vida das pessoas, nunca foram levados em consideração de forma tão sistematizada. Com os resultados desta reflexão podemos pensar em respostas para os desafios na garantia do direito à segurança pública que realmente leve em consideração os moradores da periferia”, considera Eliana.

A diretora da Redes da Maré abordou o estigma da suposta naturalização/banalização da violência por parte dos moradores de regiões periféricas. “Quando a gente fala do medo que as pessoas vivem, desse estresse por conta das situações de confronto armado, é comum que as pessoas demonstrem admiração com o fato de que as pessoas que vivem na favela sintam isso. É como se estas situações se tornassem parte natural do cotidiano delas, como se esse sentimento não pertencesse a elas. Revelar esses dados sobre o sofrimento mental na Maré é muito significativo especialmente por isso”, aponta.

Na análise feita pela pesquisa, cerca de 63% da população da Maré sente medo (sempre ou muitas vezes) de ser alvejada por uma arma de fogo. O número torna-se ainda maior quando perguntados sobre o medo constante de serem atingidos ou alguém próximo: 70,9%. Para apresentar este e outros dados, participaram ainda do evento virtual Marcelo Santos Cruz, coordenador de um programa de estudos no Instituto de Psiquiatria da UFRJ, o economista Leandro Valiati (Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS), o antropólogo Luiz Eduardo Soares e o consultor de dados da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Eduardo Ribeiro.

‘Estudo de caso para o mundo’

O ineditismo da iniciativa foi destacado por todos os convidados do webinar. Para Leandro Valiati, o estudo produziu um banco de dados “inestimável” para se pensar em soluções no que diz respeito à relação entre saúde mental e violência. “A Maré é um bom estudo de caso para distintas cidades brasileiras e em outros países. É claro que existem características específicas, mas é importante não descartar o que aproxima essas diversas regiões que convivem com as consequências da violência armada”, pondera.

Dados apresentados

Para cerca de 1/3 da população adulta da Maré (31% dos entrevistados), a saúde mental é arduamente afetada pela violência – e não só a armada. Segundo o relatório, 44% dos entrevistados disseram ter estado em meio a um tiroteio nos 12 meses anteriores, sendo 73% dos que responderam vítimas desta situação mais de uma vez. Ao todo, 44% acreditam que sua saúde mental foi prejudicada.

A iniciativa ”Construindo Pontes” é liderada pela organização inglesa People’s Palace Projects e pela Redes da Maré, e foi realizada entre 2018 e 2020 com 1.411 moradores acima de 18 anos das 16 favelas da Maré. O resultado tem como desdobramento a primeira Semana de Saúde Mental da Maré, a Rema Maré, que acontece até sexta-feira (28).

Para conhecer o estudo completo, clique aqui.

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