‘Escreva seu Futuro’ da Redes da Maré visa alcançar a emancipação e diminuir a taxa de analfabetismo no território
A relação entre educação e as mulheres é marcada por luta e superação, no qual por muito tempo, elas tiveram o acesso ao ensino negado. Hoje, mulheres da Maré voltam a estudar depois de adultas e superam desafios históricos, culturais e sociais para um futuro transformador. O projeto Escreva seu Futuro da Redes da Maré e a Educação de Jovens e Adultos contribuíram para ampliar o acesso à educação do público feminino.
Reescrevendo o futuro
O projeto Escreva seu Futuro idealizado pelo Eixo Educação da Redes da Maré tem como objetivo a alfabetização de mulheres para alcançar a emancipação e diminuir a taxa de analfabetismo no território, uma das consequências do acesso tardio ao ensino no período escravista.
As inscrições para o projeto estão abertas e você pode mudar a sua história. Os requisitos para se inscrever consistem em ser mulher a partir dos 15 anos, sem limite de idade, não ter frequentado a escola quando pequena ou não ter conseguido concluir os anos iniciais do Ensino Fundamental ou ter dificuldades no desenvolvimento da escrita e leitura.
As aulas acontecem em diversos pontos da Maré e para se inscrever é necessário comparecer na localidade de interesse (Veja ao final da matéria os locais e horários) ou clicar aqui para fazer a inscrição online.
De acordo com Vânia, coordenadora do projeto, a educação é a chave para que as mulheres possam conquistar sua autonomia e alcançar novas oportunidades na vida: ”É algo incrível e indescritível ver essas mulheres vislumbrando novos horizontes que todo o esforço que não só dela, mas de todas nós que no dia a dia fazemos o projeto acontecer, sentimos valer a pena estar no território e realizar esse trabalho. É como se fosse um combustível, o que nos impulsiona”, declara.
Filhas, mães, avós, mulheres de favela. Assim como Anisia concluiu a graduação aos 35 anos, diversas mulheres da Maré estão enfrentando barreiras sociais como o preconceito com idade e se dedicando aos estudos: “É importante possibilitar que mulheres de diferentes idades, mas especialmente as mais velhas, voltem a se priorizar ao retomarem o ambiente escolar. E consequentemente, ao decorrer do projeto, possam também aumentar sua autoconfiança, autoestima e até mesmo autonomia”, conta Vânia.
Dona Maria José da Silva conta que não foi alfabetizada pois trabalhava como empregada doméstica e não conseguia ficar acordada durante as aulas. Hoje, com 68 anos, ela retornou aos estudos através do Escreva seu Futuro para se alfabetizar: “Quando cheguei no Rio de Janeiro, eu tinha 9 anos e fui trabalhar. Estudar era meu sonho, mas eu não tinha condições e sempre tive vergonha de não saber ler e escrever. Quando mandavam mensagem pra mim, eu enviava pra minha sobrinha, pra ela ler e me mandar em áudio. Eu sentia que estava no escuro”, relembra.
Dona Maria José não é a única que precisou trabalhar e deixar os estudos. Dados do IBGE em 2022 mostram que 40,2% dos jovens que abandonaram os estudos após os 15 anos, fizeram por necessidade de trabalhar. Para as mulheres, esse percentual é de 31,1%. Outros motivos para o abandono escolar feminino estão entre gravidez (23,8%) e cuidar de pessoas ou dos afazeres domésticos (11,5%).
As dificuldades enfrentadas não deixaram Dona Maria José desanimar e hoje ela diz que o encanto pela educação só aumenta: “Eu estou apaixonada pela escola e enquanto eu tiver saúde, todos os dias, eu quero pegar um livro, ler e escrever”, conta.
Mulheres negras na educação
As mulheres conquistaram o direito de estudar em 1827 no Brasil e o acesso às universidades somente em 1879. No entanto, esse cenário não contemplava mulheres negras e de origem periférica, já que até 1888 a população negra ainda era escravizada e a consequência disso ainda reflete nos dias de hoje.
Anísia Batista da Silva nasceu em 1900, em Minas Gerais e foi a primeira mulher negra a ingressar no ensino superior. Ela tinha 35 anos quando concluiu a graduação em Pedagogia pela Universidade do Brasil (atual UFRJ). Apesar das dificuldades, Anisia abriu caminho para as futuras gerações de mulheres e inspirou mudanças significativas no sistema educacional.
Angélica Ribeiro, de 24 anos, mulher negra e moradora da Maré, não teve a oportunidade de iniciar o ensino médio. Ela decidiu fazer parte do projeto Escreva seu Futuro e diz: “ A educação é um divisor de águas. Não parem de estudar, não importa a idade que você tenha, se tem um amigo, um familiar ou a própria Redes da Maré te apoiando, segue em frente”, reforça. Angélica conta ao Maré de Notícias que participar do projeto deu a ela a perspectiva de algo que não tinha em mente, o sonho de ingressar na universidade, a mesma que Anisia concluiu, a UFRJ: “Ao longo do projeto, eles me apresentaram um caminho, um sonho pessoal de fazer uma faculdade e quero cursar fotografia. Serei eternamente grata à Redes por essa possibilidade”, conclui.
Interessadas em se inscrever presencialmente devem comparecer nas unidades de interesse abaixo.
NOVA HOLANDA ( Prédio Central da Redes) – 10h às 12h
VILA DOS PINHEIROS (Ao lado do Ciep Ministro Gustavo Capanema) – 8h às 10h
CONJUNTO ESPERANÇA (Associação de Moradores) – 10h às 12h
NOVA MARÉ (Areninha Herbert Vianna) – 10h às 12h
PARQUE UNIÃO (Casa das Mulheres) – 14h às 16h e 19h às 21h.