Rio de Janeiro: uma cidade (quase) sem leitos e sem hospital de campanha

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Prefeitura nega que esta alternativa será utilizada neste período de colapso na saúde

Por Dani Moura e Hélio Euclides, 29/03/2021 às 8h

Editado por: Edu Carvalho

“Hospitais de campanha são desnecessários. O Rio não precisa de hospitais de campanha, precisa dos hospitais que têm, com os leitos que tem, funcionando”, afirmou Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro, durante apresentação semanal do Boletim Epidemiológico no dia deste mês, reiterando o pensamento em coletiva conjunta com prefeito de Niterói, na segunda-feira passada, 22/03. Com o colapso na saúde, capitais como Belém, Teresina e Fortaleza decidiram retomar atividades do hospital de campanha, enquanto as prefeituras de São Paulo e Rio descartaram a opção. 

Com a pandemia, os hospitais de campanha surgiram como uma opção para aumentar o número de leitos que atenderiam pacientes com coronavírus. Mas o que seria uma solução, virou um elefante branco, pois eles não chegaram a funcionar como deviam e em muitos casos não deixaram de ser apenas uma estrutura. O projeto inicial esbarrou em falta de pessoal, de equipamentos, de remédios, além de confusões nas inaugurações e administrações, isso sem falar nas denúncias de irregularidades financeiras.  

Por parte da Prefeitura, o único construído foi o do Riocentro, aberto em maio de 2020, que não funcionou em sua capacidade máxima. O aparato hospitalar foi desativado no início de 2021 pela atual gestão. Leandro Matos, pesquisador de saúde pública da UFRJ, em entrevista ao R7, discordou da desativação da unidade: “A partir do momento que os hospitais de campanha foram desmontados, até abrir licitação, um novo edital, montar tudo de novo, já são dois meses. O hospital de campanha deveria ter sido mantido, mesmo que só a estrutura e sem funcionários por mais um tempo, até quando tivesse a certeza de que não teria uma nova onda da pandemia”. 

Em julho de 2020, antes de assumir o cargo de secretário municipal de saúde, Daniel Soranz declarou ao Maré de Notícias que o projeto dos hospitais de campanha foi dinheiro jogado fora. “Tinha de investir no Sistema Único de Saúde, no tratamento primário. Os governos investiram, acho que para ter visibilidade e tentar votos futuros. Não ocorreu legado nenhum para a população, com equipamentos temporários, além de ser um rombo no orçamento público”, dizia à época. 

Um pesadelo hospitalar

No estado, ao todo, seriam sete hospitais – dois deles não chegaram ao término da construção, sendo as unidades de Casimiro de Abreu e Campos dos Goytacazes. Já as unidades de Duque de Caxias, Nova Friburgo e Nova Iguaçu chegaram a ser desativadas sem nunca terem funcionado. Os construídos no Maracanã e São Gonçalo foram abertos no final do primeiro semestre de 2020 e fechados no mês de agosto do mesmo ano. 

Um imbróglio envolveu a criação dos hospitais, sobretudo quando o governo estadual rompeu com a organização social Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde, a IABAS, após atrasos e uma série de denúncias de irregularidades, como compra de materiais superfaturados. Contudo, a IABAS acabou embolsando dos cofres públicos o valor de R$ 256 milhões pelos serviços prestados. 

Para quem acompanha o jogo político, a iniciativa é uma velha participante em escândalos no Rio. Na gestão municipal, no ano de 2019, a organização social foi alvo de investigação pela Polícia Civil do RJ e o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). Pode- se apurar que a OS recebeu entre os anos de 2009 e início de 2019, (gestões de Eduardo Paes e Marcelo Crivella) R$ 4,3 bilhões em recursos públicos, dos quais os R$ 6,5 milhões teriam sido desviados. 

O MPRJ revelou também um grande esquema na cúpula do governo do estado, suspeitas de desvio de dinheiro público, com a prisão do ex-subsecretário de Saúde Gabriell Neves. O andamento do processo causou o afastamento do cargo do governador Wilson Witzel, que segue com processo de impeachment na Assembleia Legislativa. No final de dezembro, Edmar Santos, ex-secretário estadual de saúde, virou réu por improbidade administrativa em processo que investiga possíveis fraudes na compra de mil respiradores para o tratamento de pacientes com a Covid-19. O ex-secretário de saúde acabou aceitando o acordo de colaboração premiada. As informações passadas por Edmar ajudaram a Justiça a denunciar Witzel, o Pastor Everaldo, líder político do Partido Social Cristão, o PSC, além de mais 11 pessoas por corrupção e lavagem de dinheiro.

O que fica para o agora?

A Secretaria de Estado de Saúde, a SES, esclareceu que os hospitais de campanha administrados pelo estado já foram desmobilizados e não serão reativados. A SES informou que a rede SUS no estado do Rio de Janeiro conta atualmente com 4.553 leitos, sendo 2.124 de cuidados intensivos para tratamento de pacientes diagnosticados com Covid-19 e vem ampliando de maneira contínua a oferta de leitos no Estado.

Já a Secretaria Municipal de Saúde, a SMS, declarou que o Hospital de Campanha do Riocentro não será reaberto. Assegurou que dos 313 leitos anunciados para a unidade, havia apenas 70 de fato operacionais no fim de dezembro, e os demais não tinham condições de funcionamento, por falta de profissionais e insumos. Confirmou que o Hospital de Campanha do Riocentro tinha custo mensal estimado em R$ 25 milhões, mas o número de internados na maior parte do tempo foi de 60 a 70, o que dava cerca de R$ 360 mil por paciente ao mês, ou R$ 12 mil por dia. Os resultados seriam melhores se os valores fossem investidos na abertura de leitos nos hospitais da rede, que ficariam e na Atenção Primária.

A Prefeitura afirmou ainda que a gestão anterior realizou gastos em  compra de R$ 300 milhões em equipamentos da China, sem que houvesse qualquer estudo prévio de necessidade. Como resultado, os equipamentos sequer foram tirados das caixas e custaram ao município, desde meados do ano passado, mais de R$ 182 mil por mês em aluguel para estoque. A SMS garantiu que abriu 353 novos leitos dedicados exclusivamente ao tratamento da covid-19 desde o início da gestão, que somente no mês de março abriu 143 novos leitos.


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