Todos de máscaras

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Com decreto, cidade utiliza acessório como ferramenta de proteção

Maré de Notícias #112 – maio de 2020

Hélio Euclides

“Antes era proibido, agora é obrigatório, que confusão” – essa foi uma frase de um morador da Maré. Ele estava se referindo, primeiro, à Organização Mundial da Saúde, que só recomendava o uso da máscara para infectados e profissionais de saúde. E depois, a obrigação das máscaras de proteção foi definida por decreto da Prefeitura do Rio, que entrou em vigor no dia 23 de abril. A medida foi tomada para conter a disseminação do novo coronavírus. Na Maré, o número de moradores que utilizam o novo acessório de tecido vem aumentando, mas é possível ver pessoas com o utensílio no pescoço, debaixo do queixo, ou simplesmente se abstendo do uso.

Nenhum folião que desfilou no Carnaval vestido de médico iria imaginar que a máscara seria reutilizada, não para festejar, mas para proteção. O primeiro alerta foi dado no primeiro dia de abril, quando o Ministério da Saúde orientou que “qualquer pessoa” poderia fazer máscaras de pano como barreira contra o novo coronavírus. No próprio site do Ministério, ficou disponível um modelo para fabricação caseira.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) recomenda o uso de máscaras caseiras, mas lembra que o uso, pela população em geral, pode causar uma falsa sensação de proteção. Mesmo com a máscara, as principais medidas, hoje, capazes de diminuir o aumento da COVID-19 são a manutenção do isolamento social; as medidas de higiene, como lavar as mãos, higienizar a casa e os produtos que vêm da rua; os cuidados com as máscaras, como não compartilhar e não tocar nela depois de colocá-la.

A multiplicação das máscaras

Na Maré, diversas costureiras viram a necessidade da fabricar máscaras, como uma forma de ajudar na economia da casa. Fernanda Gomes, moradora do Conjunto Esperança, realiza a venda e a entrega das máscaras feitas por sua mãe. “Ela, antes, vendia pano de prato. No momento, tinha pedaço de pano estocado e percebemos a necessidade da comunidade. Então, partimos para as máscaras. Tem muita gente procurando, já vendi umas 100 unidades”, conta. Ela vende cada uma ao preço de R$ 5,00.

A vontade de ajudar moradores incentiva a mudança do ramo do negócio. Cristina Alves, que antes tinha um salão de beleza no Morro do Timbau, decidiu investir também na produção das máscaras. “O isolamento social na favela é complicado, especialmente com bar aberto. Pensei em fazer um trabalho social, com máscaras a preço de custo, para que todos tenham acesso. O objetivo é conscientizar o morador da necessidade de proteção”, diz. As máscaras que ela e amigas fabricam são vendidas por R$ 2,50, a unidade.

Moradores se adaptam a nova moda

Algumas máscaras são de apenas uma cor, outras coloridas e algumas temáticas. O morador percebe que o importante é a proteção, sua e do vizinho. “Sou diabética e idosa, por isso tenho de me proteger. Antes do decreto já usava, pois tenho consciência do estrago que a pandemia vem causando. Quero viver e ver meus netos crescerem”, comenta Maria José, de 60 anos, moradora do Conjunto Esperança. Esse é o mesmo pensamento de Cristiane Mendes, moradora do Salsa e Merengue. “Não é só pelo decreto municipal. Todos têm de usar, pois tem muita gente na rua. Eu só saio de casa quando necessário”, relata.

Não só mulheres da Maré assumiram o uso das máscaras, mas homens e crianças. “Eu me curei de uma pneumonia. Passei por maus bocados e não quero viver isso de novo. Uso a máscara e acho que todos devem utilizar também”, diz Antônio da Conceição, conhecido como Beto Filó, morador da Vila do Pinheiro.

A união das mulheres faz a força

Muitas mulheres na Maré viraram empreendedoras de máscaras de tecido. Imagina quando elas se unem para fazer solidariedade da favela…Esse é o objetivo do Tecendo Máscaras e Cuidados, da Casa das Mulheres da Maré. O projeto é uma das ações de geração de renda e sensibilização para a prevenção à COVID-19. O financiamento vem de doadores da campanha Maré diz NÃO ao Coronavírus, da Redes da Maré. Com as doações, já foi possível realizar o projeto-piloto, que reúne 32 costureiras da favela.

A meta do projeto-piloto é a produção diária de 80 máscaras, podendo chegar a 12mil peças semanais, com a duração de dois meses. Depois de prontas, as máscaras serão higienizadas e distribuídas no território, para aqueles que precisam ir às unidades de saúde, as mães da Associação Especiais da Maré e a população em situação de rua. “Eu tive COVID-19 e percebo que é uma forma de ajudar as pessoas a entender que precisamos, de fato, da proteção. Além de ser um projeto importante, a gente espera que se reflita para outras vertentes, até mesmo para a Casa das Mulheres”, expõe Myllenne Fortunato, produtora do projeto Tecendo Máscaras e Cuidados.

O projeto ainda aguarda mais doações para continuar e se desenvolver, agregando mais mulheres e adquirindo material. Uma das reclamações é que as matérias-primas, como elástico, tecido e linha, tiveram uma elevação no preço.

Quando a proteção vira fake news

O uso de máscara também foi alvo de diversas fake news. Circulou nas redes sociais um áudio, que afirmava que o acessório doado pela Prefeitura do Rio de Janeiro vinha da China e estava contaminado, instigando as pessoas a não receberem o produto. A informação que foi negada pela Administração municipal.

Em outro caso, uma cabeleireira andou de máscara pelas ruas da Vila do Pinheiro antes do decreto, e virou motivo de várias mensagens preconceituosas. Ela utiliza máscara durante o seu trabalho, para não inalar os produtos que aplica nos cabelos das clientes. “Um dia, levei um grande susto, quando um amigo ligou chorando [dizendo] que minha esposa tinha morrido de coronavírus. Como pode pessoas espalharem essa notícia?”, conta Edson Soares.

O outro caso de fake news aconteceu no Morro do Timbau, quando circulou a informação de que um morador tinha contraído a COVID-19 e estava circulando constantemente pelas ruas, colocando a saúde de todos em risco. Ao saber da notícia, o morador entrou em contato com o Maré de Notícias e explicou que teve orientação médica da quarentena e a cumpriu corretamente. As notícias falsas causam mais do que constrangimentos: colocam a vida de pessoas em risco!

Máscara de tecido é coisa séria

Raphael Rangel, biomédico virologista do Centro Universitário IBMR, entende que a máscara não vai impedir que a pessoa seja infectada, mas que outras infectadas emitam gotículas virais e, assim, se consegue diminuir a propagação do vírus. O biomédico destaca que a forma correta de uso da máscara é cobrindo nariz e boca, que são as vias aéreas respiratórias superiores. “Não se pode tirar para falar. Agora é preciso evitar falar, pois fica umidificada e pode perder o seu efeito. Se por acaso a pessoa vier a tossir ou espirrar de máscara, deve levar o antebraço à superfície da boca e do nariz para cobrir”, conta. A regra de cobrir boca e nariz ao espirrar ou tossir continua, mesmo com o uso da máscara.

A recomendação é do uso da máscara quando tiver a necessidade de ir à rua, como ao supermercado. “É uma medida de segurança complementar ao isolamento, ao distanciamento, à lavagem das mãos, entre outros. Não é pelo fato de estar usando a máscara que devemos ir às ruas e ficar passeando. Devemos seguir as orientações dos órgãos de saúde, para que possamos passar por esse momento difícil da melhor maneira possível, garantindo a segurança da população, principalmente nas comunidades”, comenta.

Sobre a limpeza, Rangel adverte que as máscaras caseiras de pano devem ser trocadas a cada duas ou, no máximo, quatro horas. Que depois do uso, devem ser higienizadas numa solução de um litro de água e duas colheres de sopa de água sanitária.

IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DE MÁSCARAS

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