Um sonho na ponta dos pés

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Determinada a ser bailarina profissional, a pequena Lays Barbosa precisa de ajuda para desfrutar da vaga que conquistou na Escola de Teatro Bolshoi

Por Gracilene Firmino em 24/12/2021 às 07h. Editado por Tamyes Matos.

Descobrir a própria vocação a qualquer momento da vida é um privilégio e a pequena Lays Barbosa é daqueles casos em que o talento inata acelera esse processo. A menina, de apenas dez anos, já escolheu seu rumo na vida: ser bailarina profissional. Os primeiros passos para a realização desse sonho já foram dados: Lays foi aprovada, entre mais de mil crianças, para estudar balé em uma das maiores instituições do mundo, a Escola do Teatro Bolshoi. Cria do conjunto de favelas da Maré, a menina vai mudar de vida mas, para isso, precisa de ajuda. 

Determinada, disciplinada, focada e talentosa: é assim que amigos descrevem a pequena bailarina. Lays começou a estudar balé com oito anos, mas sua mãe percebia o interesse da menina em dançar desde que a pequena contava com apenas quatro anos. Chegou a fazer algumas aulas em uma academia de dança, mas foi no Centro de Assistência e Desenvolvimento Integral (Cadi) na Maré que ela pôde se dedicar integralmente à dança. O Cadi existe desde 2016 e, hoje, conta com seis turmas de balé com cerca de 15 alunos, cada. Dentre os mais de 90 estudantes, a pequena nascida e criada em Capivari, no Morro do Timbau, se destacou: Lays se desenvolveu muito rapidamente dentro do projeto. 

“Em seu primeiro ano de aulas aqui com a gente, já fez um solo na apresentação de fim de período, antes das festas. E o que a Lays tem não é apenas talento. Ela é muito dedicada, disciplinada, aplicada e estudiosa. Assistia mais de uma aula, demonstrava um interesse verdadeiro pela dança”, conta Jeniffer Rodrigues, professora de balé da menina. Foi ela quem ajudou Lays a se preparar para os testes. “Ela ficava horas aqui (no Cadi) comigo para ensaiar, se aperfeiçoar e podermos gravar o vídeo que a seleção exigia.” 

Lays Barbosa e sua professora, Jeniffer Rodrigues – Foto: Matheus Affonso

Gosto pela arte

Lays tem uma rotina atribulada: todos os dias, acorda cedo para ir à escola, e volta para casa apenas para tomar banho e sair novamente para as aulas de balé. Às segundas e quartas ela tem aula no Cadi, das 16h às 18h. Terças, quintas e sextas a menina estuda balé no Centro de Artes do Méier – o que a obriga a sair de casa às 15h30m, mesmo com as aulas começando às 17h. Às 20h é hora de a pequena bailarina voltar para casa, onde chega às 21h30. “Às vezes ela vem praticamente dormindo, nem consegue jantar direito”, conta Daiane Barbosa, mãe de Lays. A programação agora ficou ainda mais intensa: a menina começou a fazer aulas de balé aos sábados. 

Mas na vida de Lays também há espaço para momentos de descontração. “Gosto muito de ficar nas redes sociais, vendo vídeos, principalmente os de balé, claro. Gosto de brincar na rua, ficar com meus amigos, ir à praça. Também amo séries e filmes com o tema de dança e balé: são os que eu mais assisto”, diz Lays, sorrindo. Tímida, mas expressiva e articulada, quando perguntada sobre sua referência na arte que tanto ama, a menina é clara e direta. “Ana Botafogo!”, responde. 

A seleção para o Bolshoi

A Escola do Teatro Bolshoi no Brasil funciona desde março de 2000 na cidade de Joinville, Santa Catarina, na região Sul do Brasil. É a única filial do tradicional Teatro Bolshoi de Moscou, na Rússia; por isso, seus alunos vêm de todas as partes do Brasil e do mundo. Com professores russos e brasileiros, a instituição forma bailarinos profissionais com a mesma precisão técnica e qualidade artística aplicados em sua sede na Rússia. O grupo de professores da escola na parte de dança e preparação física é formado por três russos e dez brasileiros. A instituição trabalha com o Método Vaganova, um conjunto de técnicas para o ensino do balé criado pela pedagoga Agrippina Vaganova.

A Bolshoi brasileira realiza seleção anual para novos alunos, com avaliações médicas e artísticas específicas. São disponibilizadas vagas para os cursos técnicos e básicos da instituição, todas com bolsas de estudo 100%. 

Este ano, foram mais de mil inscritos; todos enviaram vídeos em que se apresentavam fazendo exercícios, o que serviu para a escola fazer uma pré-seleção dos candidatos. Cerca de 200 crianças passaram para a etapa presencial (40 foram selecionadas para a bolsa de estudos), que aconteceu entre os dias 5 e 6 de novembro. Daiane conta como foi para a pequena bailarina encarar todas as fases, e lembra que fez de tudo para que a filha chegasse aonde chegou. 

“Eu já estava de olho nas redes sociais da Escola Bolshoi há um tempo, esperando as inscrições para a seleção anual. Quando abriram, logo falei com a professora de balé da Lays, a Jeniffer, para ela me ajudar com tudo que fosse necessário. Foi preciso pagar uma taxa de inscrição de R$ 25. No começo, nem cheguei a contar para a Lays que ela estava inscrita porque era uma coisa que ela queria muito e sabíamos que isso geraria muita ansiedade nela. A Jeniffer ajudou muito para que tudo acontecesse, principalmente na parte do vídeo, em que eles pediam que as crianças fizessem alguns movimentos”. 

Quando Lays foi aprovada para a etapa presencial, a animação tomou conta de Daiane – e com ela, a preocupação com os gastos. “Fizemos uma rifa para pagar as passagens para Santa Catarina, para que a Lays pudesse fazer os testes. Ficamos quatro dias lá.” Nessa etapa, as crianças, entre 8 e 11 anos, foram avaliadas para as bolsas através de provas de português, matemática e conhecimentos gerais, além de testes físicos e avaliações médicas. “Pegavam a minha perna, alongavam, mandavam fazer algumas posições de balé”, conta Lays, que acabou contemplada com uma bolsa de estudos, juntamente com  cinco crianças moradoras de favelas do Rio. 

Necessidade de apoio

Além de balé, a Escola Bolshoi oferece aos alunos outros benefícios, como alimentação no local, transporte para ir às aulas e equipamentos e uniformes de prática (sapatilhas, malha, meia-calça, mochila etc). Também são fornecidos gratuitamente uniformes escolares de verão e inverno, figurinos, orientação pedagógica, assistência odontológica preventiva, atendimento fisioterápico, nutricional e assistência médica de emergência/urgência pré-hospitalar. Ao todo, a formação da Escola do Teatro Bolshoi dura oito anos e, mesmo diante da estrutura e do apoio oferecidos pela instituição, alunos como Lays precisam de ajuda para se mudar para Joinville.

A pequena bailarina sairá do Morro Timbau rumo à Santa Catarina, juntamente com a mãe e o irmão mais novo de quatro anos, em busca de seus sonhos e para construir uma nova vida no sul do país. A família de Lays vai precisar custear passagens aéreas, moradia e  alimentação, entre outros gastos, já que Daiane vai precisar de tempo até se estabilizar e conseguir trabalho na nova cidade. Ela e Jeniffer estão arrecadando online os recursos para a família se mudar em janeiro e custear os gastos dos primeiros seis meses em Joinville. A meta é conseguir R$ 15 mil, e qualquer ajuda é bem-vinda: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/lays-barbosa-no-bolshoi 

Daiane está determinada a fazer realizar não apenas o desejo de vida da filha como o seu próprio. “Eu também estudei balé na infância. É uma arte que sempre admirei e amei. Não vou soltar a mão dela, é o sonho de vida da minha filha”, diz. Lays, por sua vez, não vê a hora de chegar o dia 3 de março de 2022, quando as aulas na Bolshoi começam. “Fiquei muito feliz e estou ansiosa. Eu amo dançar. Quero ser bailarina profissional e ajudar outras crianças a realizar o mesmo sonho”, conta a menina, com brilho nos olhos.

Bailarina Lays Barbosa – Foto: Matheus Affonso

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