Quatro moradores do conjunto de favelas protagonizam a busca por melhorias ao registrar queixas e cobrar ações dos representantes do poder público
Maré de Notícias #130 – novembro de 2021
Reportagem: Vinicius Lopes
Edição: Fred Di Giacomo
Arte: Nícolas Noel
Por quatro meses, moradores se empenharam em registrar queixas referentes ao saneamento básico nas 16 favelas do território. Essa ação, coordenada pelo Cocôzap, uma tecnologia social da organização data_labe, tem como objetivo gerar dados sobre saneamento básico nas 16 favelas da Maré — do Conjunto Esperança ao Marcílio Dias.
Conhecidos como “Embaixadores Cocôzap”, quatro moradores dos territórios formaram o time que, na primeira fase, registrou as reclamações sobre saneamento em quatro grupos de favelas, escolhidas a partir da relação dos voluntários com esses locais. Os embaixadores são moradores das favelas da Maré, que rodam pelo território desde que nasceram, e por isso sabem como a falta de saneamento afeta a vida das pessoas. Já na segunda fase do projeto, que começa agora, os embaixadores vão contatar novamente os moradores que relataram os problemas para averiguar se foram resolvidos e, em caso positivo, quando e quem foi o responsável.
Quem são os “Embaixadores Cocôzap’?
Matheus Albuquerque tem 21 anos. Nascido e criado na Nova Holanda, é estudante de Sistemas de Informação na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Entre as análises de dados e a fotografia, Matheus encontra tempo para se dedicar às questões de saneamento da Maré. “Tenho me tornado mais crítico em relação a problemas de saneamento que são visíveis e recorrentes em nossas comunidades, mas que, no geral tratamos como normal por convivermos com eles e justamente pela falta do exercício dos nossos direitos.”
Elenice Lopes tem 38 anos, é nascida e criada no Parque Maré e, atualmente, mora no Conjunto Esperança. Cozinheira de mão cheia, ela atua como embaixadora nas comunidades Vila do João, Salsa e Merengue, Vila dos Pinheiros e Conjunto Esperança. Para Elenice, um dos maiores aprendizados foi perceber as desigualdades dentro do próprio território. “Com o passar do tempo, fui entendendo mais o que é saneamento, e nessas caminhadas tenho visto como é gritante a diferença de um lugar para o outro. Tem lugares que os moradores sofrem muito mais com o lixo e o esgoto nas ruas.”
Wanderson Lira tem 28 anos; cria da Roquete Pinto, é engenheiro ambiental e aspirante a engenheiro de dados. Além de trabalhar com projetos socioambientais na Maré, ele atua como estagiário de análise de dados na Petrobras. Dentro do Cocôzap, Wanderson é responsável pelas comunidades Roquete Pinto, Piscinão de Ramos e Marcílio Dias, e já percebe alguns efeitos do seu trabalho. “Vejo uma movimentação da comunidade para resolver alguns problemas que registrei. Pude acompanhar, por exemplo, uma obra de reparação de esgoto que já era um problema há meses.”
Juliana Machado tem 28 anos e é nascida e criada no Morro do Timbau. Pedagoga por formação, atualmente é uma das coordenadoras do projeto Luta Pela Paz e mobilizadora territorial em pautas sobre juventude e meio ambiente. Dentro do Cocôzap, é responsável pelo mapeamento do Morro do Timbau, da Baixa do Sapateiro, do Conjunto Bento Ribeiro Dantas e da Nova Maré. Juliana tem grandes expectativas. “Espero encontrar menos problemas nas próximas rotas; eles se refletem na qualidade de vida dos moradores da Maré, que já enfrentam muitas batalhas em suas vidas.”
O Cocôzap
Alguns dos problemas mais comuns encontrados nos territórios — como esgoto a céu aberto, bueiros entupidos, alagamentos e acúmulo de lixo e entulho nas ruas — são históricos na região. Mesmo assim, percebe-se que os dados disponíveis não representam a realidade da Maré. Por isso, o Cocôzap recolhe queixas de saneamento, que entram em uma base de dados do projeto que, futuramente, será utilizada para reivindicar os direitos dos moradores.
Além da geração de dados, o Cocôzap também atua em frentes de educação ambiental e incidência política, promovendo o Encontro de Saneamento da Maré em parceria com o Maré Verde e a Redes da Maré, buscando levantar o debate e mostrar a importância de se falar sobre saneamento básico nos territórios. Nas últimas quatro edições, o encontro teve não apenas a participação dos moradores como também de representantes da Comlurb, da Cedae, do Ministério Público do Rio de Janeiro e de outros especialistas no assunto.
Saneamento básico e seguro (assim como o direito à água e ao saneamento, independentemente de raça, gênero ou CEP) é um direito constitucional, garantido pela Lei 11.445/2007, além de ser um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ODS/ONU).
Porém, infelizmente, esse direito não é respeitado nas favelas. Os embaixadores do Cocôzap registraram, entre abril e o início de setembro, 223 queixas de saneamento básico. A maioria das reclamações está relacionada a problemas de esgoto, seguida por acúmulo de lixo e entulho. A favela com mais queixas de saneamento básico até o momento é a Baixa do Sapateiro, com 36 queixas, enquanto os moradores do Conjunto Esperança relataram apenas dois problemas.
Está com problema de saneamento perto de casa? Manda pra gente! Você pode enviar sua queixa pelo WhatsApp, pelo número (21) 99957-3216.