Em um mundo onde as imagens têm o poder de moldar percepções e histórias, a fotografia popular desafia estereótipos
Por Affonso Dalua
Foto: Arthur Vianna
À medida que celebramos o Dia Mundial da Fotografia em 19 de agosto, é importante reconhecer como essas imagens estão moldando uma nova narrativa para as favelas e periferias brasileiras. Um movimento fotográfico vem ganhando força nas favelas e periferias, desafiando as narrativas tradicionais e permitindo que os moradores desses territórios construam suas próprias narrativas imagéticas. O Imagens do Povo, projeto do Observatório de Favelas, tem se tornado uma plataforma essencial para a produção e preservação de imagens que refletem a vida, a cultura e os desafios desses territórios do Rio de Janeiro.
Ao investigar essas narrativas, conversamos com Ratão Diniz e Francisco Valdean fotógrafos importantes no cenário da fotografia popular. Valdean é idealizador do Museu MIIM (Museu de Itinerante de Imagens da Maré).
Reconstruindo narrativas
Valdean, um dos primeiros alunos da Escola de Fotografia Popular (Turma de 2004), compartilhou suas reflexões sobre o impacto do Imagens do Povo na produção de novas narrativas imagéticas: “O projeto Imagens do Povo é fundamental e muito necessário na produção de novas narrativas sobre as favelas. Ele materializou um modo de imagens que os movimentos sociais das favelas reivindicavam desde os anos 80, quando não se reconheciam as imagens que se produziam sobre as favelas.” Valdean destacou como o projeto ajudou a visibilizar a voz dos próprios moradores, rompendo com o olhar de fotógrafos de fora das favelas e periferias.
Novas formas de expressão visual
“Essas novas formas, como as pipas do Arthur Vianna, as bandeiras do Affonso Dalua e o Museu MIIM, se encaixam perfeitamente na arte contemporânea e oferecem abordagens frescas e relevantes para exibir e falar sobre as imagens da Maré. Então eu acho que é por aí”, ressaltou Valdean. Arthur Vianna, conhecido por suas criações visuais em pipas, expandiu o horizonte das formas de expressão visual nas favelas. Suas pipas, elevadas nos céus da Maré, são verdadeiras instalações imagéticas, compartilhando histórias e experiências de maneira inovadora.
Mulheres faveladas na fotografia
A voz feminina também encontra seu espaço nesse movimento. Kamila Camillo, uma jovem talentosa, emergiu como uma força influente, capturando a essência das mulheres faveladas em suas fotos, já ganhou diversos prêmios e moções do estado do Rio de Janeiro. Ela exemplifica a crescente produção de dentro para fora da favela, como defendido por Valdean em seu livro sobre essa temática.
Kamila Camillo assim como outras fotógrafas faveladas e periféricas, vem construindo caminhos para uma narrativa feminina que rompe as barreiras do machismo e da misoginia que estão encruadas na estrutura da nossa sociedade.
Preservação da Memória
Ratão Diniz, fotógrafo que testemunhou a evolução da fotografia nas favelas, enfatizou o papel do Imagens do Povo na preservação da memória: “O Imagens do Povo, além de um espaço de formação, é um lugar também de acervo, de preservação dessas memórias, do que a gente tem produzido.” Ratão destacou como a fotografia tem sido uma ferramenta para preservar a história dos territórios, especialmente quando se trata de eventos como “A Noite das Estrelas”, onde as imagens desempenharam um papel crucial em documentar a memória coletiva.
Encontros e Trocas
Além de ser um espaço de formação, o Imagens do Povo se destaca como um local de encontro e troca de ideias entre os fotógrafos e moradores das favelas e periferias do Rio de Janeiro. Ratão observou que esse espaço comum é essencial para fortalecer o movimento fotográfico nas favelas e garantir que as histórias sejam compartilhadas e preservadas de maneira colaborativa. Hoje além do Imagens do Povo há outros espaços de formação fotográfica na Maré, como a escola Transformando Olhares da Maré do Instituto Vida Real, e também o Laboratório de Imagem e Narrativa do Maré de Notícias.
Em um mundo onde as imagens têm o poder de moldar percepções e histórias, a fotografia popular desafia estereótipos, rompe barreiras e capacita os próprios favelados a contar suas próprias histórias.