Ação militar aconteceu em meio a decisão do STF que restringe incursões. Nas redes sociais, moradores relatam medo de sair às ruas
Por Edu Carvalho e Hélio Euclides, em 17/07/2021 às 12h57.
Atualizado às 19h35
Desde a tarde de ontem, 16, por volta de 15h30 da tarde, uma operação policial ocorreu no Conjunto de Favelas de Maré, com término às 17h30 deste sábado, 17. Ao todo, o território ficou sob incursão policial por 26 horas. De acordo com um comunicado da Polícia Militar do Rio, a ação foi realizada para coibir uma ocupação indevida do CIEP César Perneta, na favela do Parque União, que tem mais de 20 mil moradores. Tiroteios também foram registrados na Nova Holanda, outra favela do conjunto.
Uma morte foi confirmada. É de Ricardo da Silva, 47 anos. Ele foi alvejado na Rua Principal, altura da Favela Rubens Vaz. A vítima foi socorrida por moradores. No local, não foi identificada a presença de ambulância e equipe de saúde como determina a ADPF 635, mais conhecida como ADPF das Favelas. O corpo foi encaminhado ao Hospital Geral de Bonsucesso, mas chegou na unidade sem vida.
Segundo depoimentos coletados pela ONG Redes da Maré, a operação ultrapassou os muros da escola e violou diversos direitos da comunidade. Moradores relataram que várias casas foram invadidas sem mandado judicial e carros estacionados na rua foram arrombados e destruídos pelos agentes.
Funcionários do Instituto Luta Pela Paz e alunos ficaram presos na sua sede. A instituição emitiu uma nota de que 300 crianças, adolescentes e jovens foram impactados pela interrupção dos serviços. As clínicas da família Diniz Batista dos Santos e Jeremias Moraes da Silva também suspenderam atendimento. Nas redes sociais, muitos relataram o medo de serem atingidos.
Com a ação, motoristas e articuladores territoriais da Redes da Maré que estavam realizando uma distribuição de cestas de alimentação ficaram encurralados por um caveirão na favela Nova Holanda. Com isso, ao menos 100 cestas não puderam ser entregues.
Em publicação, organização Redes da Maré cobrou do Estado e da população uma resposta sobre a continuidade do ato. “É inaceitável que a sociedade normalize, não se choque e não se mobilize contra as violências, violações e excessos das ações policiais nas favelas do Rio. Cobramos do Estado um posicionamento sobre a ação que negligencia as determinações do Supremo Tribunal Federal, por meio da ADPF das Favelas, e naturaliza o desrespeito a diversos direitos constitucionais dos cidadãos da Maré”, diz a publicação.
Durante todo o dia, equipes da instituição fizeram atendimento com psicológos, assistentes sociais e advogados para receber denúncias de violências durante a operação, nas sedes da Redes da Maré, no prédio central da Nova Holanda, na Rua Sargento Silva Nunes, 1012, e no Parque União, na Casa das Mulheres da Maré, na Rua da Paz, 42, e também on-line pelo WhatsApp (21) 99924-6462.
Desde junho de 2020, uma decisão do Supremo Tribunal Federal proferida pelo ministro Edson Fachin limita incursões policiais nas favelas e periferias do Rio de Janeiro, por conta da pandemia da COVID-19.
Até o momento a Polícia Militar não divulgou o balanço da operação oficialmente, nem justificou a extensão da operação por mais de 24 horas.
Também neste fim de semana, houve registro de operação no Complexo do Salgueiro.