A importância da disputa de narrativas e presença em espaços políticos também foram pautas das conversas no Congresso sobre Segurança na Maré na última semana
A programação do Congresso Falando Sobre Segurança Pública na Maré que aconteceu na última semana deu destaque a importância das mídias comunitárias e da representatividade LGBTQIA+ e de pessoas negras na construção de novas narrativas sobre segurança pública e o combate a violência.
As mesas “Mídia, favela e legitimação da violência policial” e “Tecendo Redes: Segurança Cidadã e os Caminhos para prevenção das violências” evidenciaram a importância de olhar a subjetividade, tanto dentro das redações nos perfis dos profissionais de imprensa quanto nos entornos, pelas ruas e nas vivências de pessoas LGBTs.
Um agravante mencionado para a construção de políticas públicas que promovam a segurança e equidade para a comunidade LGBTQIA+, é a ausência de dados por parte construídos pelo Estado. Para Michele Seixas, da Articulação Brasileira de Lésbicas, são outros agentes que elaboram esses indicadores: “Se não fosse o movimento social e a sociedade civil colocando a mão na massa, a gente não teria nenhum dado”. afirma.
Michele chamou atenção para o percentual de mortes de mulheres lésbicas, destacado no 1º Dossiê do lesbocídio (assassinato de mulheres lésbicas por causa da sexualidade) no Brasil, que mostra que em 83% dos casos, em 2017, elas foram mortas por homens. Um caso lembrado pela palestrante é o assassinato de Luana Barbosa, em São Paulo. Luana era uma mulher lésbica que trabalhava de garçonete e foi espancada por policiais na frente do seu filho, na época, de 16 anos, por pedir para ser revistada por uma policial. O caso aconteceu em abril de 2016 em São Paulo. “Nossos corpos estão sempre em risco e a gente não aparece em dados de lugar nenhum.” crítica.
Violência velada
O artista e diretor Wallace Lino, conta que pensar em vivências de pessoas da comunidade LGBTQIA+ favelada é também refletir em segurança pública, além de violência armada. Tratando também da violência velada, o que ele chama de “espectro cotidiano em que nossas existências são reguladas”.
Uma forma de controle dos corpos exemplificada pelo artista é a negação. Não conseguir acesso à mobilidade urbana e usar serviços cotidianos na favela, como andar de moto táxi por ser um homem gay afeminado. Ele: “quando eu to de cropped eles não querem me levar […] eu não posso botar uma roupa que me interessa porque existe uma construção na cabeça das pessoas que é sobre ódio, que quer me dizer com isso que eu tenho que aceitar que eu tô’ morta”
Ele acrescenta que por escolha própria, prefere não focar seu trabalho na violência, na dor, e por isso sua pesquisa é sobre o amor, surgindo então movimentos como o Entidade Maré, que promove a Noite das Estrelas.
Falar além da comunidade
A vereadora de Niterói, Beny Briolly, conta que luta pela humanização dos corpos LGBTQIA+ “mas o Estado ainda não nos naturaliza […] o Estado brasileiro e o mecanismo da branquitude faz com que o afastamento e o distanciamento seja uma ferramenta de manutenção da velha política, isso é histórico na nossa vida” Beny acrescenta que é preciso que haja uma cobrança e “disputar a agenda do poder, que é econômico e faz as agendas educacionais de segurança pública, de formação”. finaliza.
Na mesa com a participação das jornalistas Daiene Mendes, Jéssica Pires, Vera Araújo e mediação de Lola Ferreira o debate sobre a legitimação da violência por parte da mídia em ações policiais dentro dos territórios de favela chegou à conclusão de que é preciso criar narrativas de dentro dos espaços marginalizados e violados e com atenção para quem está contando as histórias. As palestrantes concordam que é importante saber a bagagem que o jornalista traz para definir a visão que será dada pela notícia. Sobre isso, Daiene defende que “a subjetividade importa, principalmente enquanto a violência na favela ocorre”.