Home Blog Page 443

Pela primeira vez na história uma mulher é nomeada reitora da UFRJ

0

Denise Pires recebe o cargo em clima de festa e esperança

Hélio Euclides

O Ano de 2020 marca o centenário da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas também um ano de mandato da primeira mulher a ocupar a Reitoria, a professora e médica Denise Pires de Carvalho. A posse de Denise foi no dia 2 de julho, na representação do Ministério da Educação no Rio de Janeiro. Ela recebeu o cargo do agora antecessor, Roberto Leher, no fiml da manhã de ontem (8). A cerimônia de transmissão foi no Centro de Tecnologia (CT), na Cidade Universitária.

O evento reuniu diversos políticos do munícipio, do estado e do país, além de vários representantes de instituições. Entre eles, Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências, que falou da necessidade do sentimento de esperança e dos desafios deste mandato. “A universidade precisa olhar para dentro. Necessita se modernizar e mostrar a importância que ela tem para o país. Para isso tudo, o desafio é superar a falta de recurso”, enfatiza.

Alunos mencionaram os cortes realizados e lembraram pensamento de Paulo Freire: “Se a educação sozinha, não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”. Representantes do movimento sindical (Sindufrj e Adufrj) questionaram o presidente Jair Bolsonaro, por ser um governo que não passa confiança, que pode prejudicar a autonomia da UFRJ e que os cortes foram um ato de destruição de projetos e da universidade.

No discurso, Leher disse que estava celebrando o fortalecimento da autonomia da universidade. Ele argumentou que foi uma decisão desastrosa a Emenda Constitucional 95, que limita o teto de gastos público, o que definiu como um retrocesso. Sua vice, Denise Nascimento, lembrou que a gestão não foi fácil, com perda de 35% de verba, o que ocasionou a demissão de 2.500 trabalhadores terceirizados e a não conclusão do alojamento. A gestão foi marcada pelo trágico incêndio do Museu Nacional.

Desafio da falta de verba não desanima reitora

Em sua primeira fala como reitora, Denise dedicou o momento à família e a todos os professores do ensino básico do país, que ainda não são valorizados. A 29ª reitora da UFRJ lembrou que ingressou na universidade como estudante em 1982, e se formou em 1987, sendo a primeira pessoa da família a conseguir um diploma de Ensino Superior. A nova reitora declarou que sua gestão será de transparência, e mencionou trechos do poema Verdade, de Carlos Drummond de Andrade.

Em seu discurso, ela falou do machismo. “Fico feliz em ter a presença aqui de Nísia Trindade Lima, primeira mulher a comandar a Fundação Oswaldo Cruz. Contudo, das 63 universidades federais, 24 ainda não tiveram uma mulher no cargo máximo”, desabafa. Em outro momento, comentou sobre a igualdade, como exemplo usou sua samarra (túnica branca, usada nas cerimônias). “Entre o branco e o preto têm várias cores e todas merecem atenção igual”, disse. Denise também mencionou a crise. “A universidade precisa ser igual a detergente, para furar a bolha. Não podemos recuar por questões econômicas. A educação é transformadora, dela vem a verdade, o respeito e a diversidade. Vamos esperançar”.

O Maré de Notícias, na edição 102, de junho de 2019, traz uma entrevista com Denise, no qual a reitora disse ter o desejo de ir à Maré, mas que aguardava um convite. Ao final do evento, o Maré de Notícias fez o convite. Denise agradeceu e disse que fará a visita.

Maré de Notícias participa de um dos mais importantes congressos de jornalismo do País

0

A convite, Dani Moura, coordenadora de comunicação da Redes da Maré, palestrou sobre os desafios de falar sobre segurança pública no jornalismo comunitário

Thaynara Santos

 “Segurança pública sob o olhar local: lições e desafios” foi o tema da mesa integrada pelos jornalistas Anabela Paiva (Observatório da Intervenção do Centro de Estudos de Segurança Pública), Thiago Paiva (autônomo) e Dani Moura (Redes da Maré), realizada no 14° Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo.

O evento, um dos mais importantes na área de jornalismo no País, é promovido Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e foi realizado entre os dias 27 e 29 de junho, em São Paulo. Dani Moura, coordenadora de Comunicação da Redes da Maré, foi convidada a palestrar no evento e, assim, compartilhar sua experiência à frente de um dos maiores jornais comunitários do Brasil.

Mudando a narrativa das grandes mídias

No primeiro dia de atividades do congresso, numa sala cheia de estudantes, comunicadores e pesquisadores, Dani Moura falou sobre o trabalho desenvolvido no jornal Maré de Notícias e no portal Maré de Notícias Online – veículos que têm servido de fonte para a grande mídia quando o assunto é segurança pública e questões relacionadas à Maré e a territórios favelados. “Tudo o que queremos é que a mídia olhe pela ótica do morador. Veja pelo outro lado. Nosso objetivo é que haja uma mudança na narrativa e na cobertura que os jornalistas fazem sobre a favela. É isso que a gente busca e tem conquistado”, explica.

Na ocasião, Dani Moura mostrou exemplos de reportagens onde a narrativa sobre segurança pública em operações policias mudou conforme incidência do Maré de Notícias. Ela falou ainda sobre a atuação dos projetos do Eixo Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, tais como: a coleta de dados do De Olho na Maré e os serviços sóciojurídicos oferecidos pelo Maré de Direitos que ajudam na apuração das reportagens do Maré de Notícias.


Vidas faveladas importam!

0

Uma reflexão sobre Segurança Pública nas favelas

Patrícia Vianna*

Trabalho em favelas há mais de trinta anos e, cada vez mais, me apaixono pela diferente rotina destes espaços. Nasci em Juiz de Fora, Minas Gerais, mas saí muito pequena de lá, e morei em outras cidades com a minha família, até que vim para o Rio, para Tijuca, quando tinha nove anos de idade. Quando me casei, aos 24 anos, morei por uns anos em Petrópolis e voltei para a Tijuca um ano após a minha separação. Vim para Maré no final de 2000 e, desde então, passo a maior parte do meu tempo neste território. Para mim, a Maré é um espaço de muito afeto; o lugar que eu escolhi para trabalhar, ampliar minhas relações profissionais e pessoais e, especialmente, é o meu lugar de luta.

Muitas pessoas que eu conheço me perguntam se eu não tenho medo de trabalhar na Maré porque leem ou escutam, com muita frequência, situações de violência que acontecem aqui. Infelizmente, isso é verdade, mas apenas parte da verdade. Aqui na Maré acontecem coisas maravilhosas também. Quem não está aqui no dia a dia, só fica sabendo da ausência, da carência, da violência e não tem ideia de como este é um espaço rico em muitas coisas, como: diferentes culturas, variedades gastronômicas, maravilhosas maneiras de se divertir, muita solidariedade e pessoas com muito potencial. Onde moro, pouco conheço meus vizinhos. Não sei das dificuldades que eles passam e muito menos se precisam de alguma ajuda. Nas favelas, em geral, muitos se conhecem e, quando acontece alguma situação complicada, vários correm para ajudar. Você sabe que possivelmente terá o apoio de alguém. Enfim, é um lugar muito gostoso de se viver, “apesar de”, como nos ensina o livro Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres, de Clarice Lispector.

Em relação à questão da violência, não deixo o medo me paralisar. Penso a todo instante que tenho um compromisso ético com essa população e não posso deixar esse sentimento me invadir e me impedir de atuar, mesmo nos momentos mais tensos. Vejo que, também, muitos moradores e moradoras entram em pânico quando há confrontos armados, sejam esses entre grupos civis armados ou em operações policiais. Ninguém se acostuma com a violência! E não é para se acostumar! NUNCA! Todos os dias, a população das favelas e periferias sofre, mas resiste. Historicamente, principalmente a partir do início da década de 1980, há um grande movimento dos moradores da Maré para pensar formas de mudança no território, impactando no aumento e melhoria dos serviços existentes na época – escolas, creches, postos de saúde, rede elétrica, água potável, redes de esgoto, entre outros. A questão da segurança pública também sempre esteve em pauta nas discussões das organizações comunitária – sejam elas instituições não governamentais, religiosas ou grupos organizados. A população sempre lutou com toda sua força para que a vida não tenha mais violência ou, pelo menos, para que ela diminua.  Porém, estas situações ainda são muito comuns e atravessam o cotidiano de quem vive e trabalha aqui. Lembro-me de um dia em que tive que presenciar a morte de mais um menino que estava na rua quando se iniciou uma operação policial:

O dia amanhece e a claridade vai tomando conta dos pequenos espaços de cada casa de uma das estreitas ruas da favela. A mulher, como em muitas dessas casas, é quem acorda primeiro e vai providenciando os primeiros movimentos daquela família. Ali moram a mulher, seus três filhos, uma amiga e um sobrinho, filho de seu irmão. É hora das duas crianças mais novas se levantarem para colocar o uniforme e ir para a escola. Não podem perder a hora, senão ficam sem o café da manhã oferecido pela escola e só vão poder comer na hora do almoço, também oferecido pela escola. O mais velho parou de estudar no ano anterior, porque repetiu duas vezes o quarto e o quinto ano do Ensino Fundamental, e se desinteressou completamente em continuar seus estudos. O sobrinho trabalha no comércio como vendedor de uma loja que fica bem próximo da sua casa. Mas como só trabalha à tarde, pode dormir um pouco mais e, como todos dormem num mesmo cômodo, as crianças procuram não fazer muito barulho para não acordar os outros. A mãe trabalha em uma instituição social dentro da Maré e também precisa se apressar para não se atrasar. A amiga se levanta para ajudar as crianças a se arrumarem e sai à procura de um trabalho. Ficam em casa o filho mais velho e o sobrinho. As ruas e vielas vão ficando mais movimentadas e as vozes das pessoas vão sendo cada vez mais audíveis.  O menino de oito anos leva a irmã de seis para a escola e segue o caminho de sua escola. A dois quarteirões da escola escuta barulho de fogos, aparentemente vindos de um lugar bem próximo. O menino não sabe para onde correr e lembra-se da casa de um amigo naquele quarteirão. Corre, abre o portão e… tiros… muitos tiros. Quando a mãe do amigo abre a porta de casa, vê o amigo do filho caído no chão. Seu corpo, ainda quente, já estava sem vida. A mulher grita enlouquecidamente e chora sem parar. Os vizinhos não sabem o que fazer. Os tiros param. Mas não tem nada mais que se possa fazer. A favela inteira chora. Mais uma criança morta por causa de uma guerra insana. Mais uma família estraçalhada. Como dizer para a mãe, para os irmãos, para os amigos que essa criança partiu e não voltará nunca mais? Ele foi brutalmente arrancado de suas vidas!

A cada dia, morremos um pouquinho, vamos perdendo a alegria de viver e tentando recuperá-la a todo instante. No(s) dia(s) seguinte(s) de uma tragédia, como relatei anteriormente, vejo moradores e moradoras tentando continuar sua vida, torcendo para que seja um dia mais tranquilo, sem confrontos, sem violência, sem desrespeito,  sem barbáries, sem… Que seja apenas um dia NORMAL!

Na instituição em que eu trabalho, temos projetos que certamente contribuem para que a população das favelas possa conhecer melhor seus direitos e exigir do Estado o mesmo atendimento e cuidado que em qualquer outra parte da cidade, seja em relação à saúde, à educação, à moradia e também à segurança pública. Nossas crianças deixam de ter aula pelo menos 15% dos dias letivos todos os anos, por conta da violência. Isto sem considerar que o ensino nas escolas da Maré ainda não tem a mesma qualidade que nas escolas localizadas em outros bairros da cidade. Acontece com muita frequência o desestímulo de crianças em continuar nas escolas, especialmente quando elas se deparam com dificuldades de aprendizagem que, infelizmente, não são resolvidas e só aumentam com o passar dos anos. Inúmeros são os casos de crianças que repetem de ano uma, duas, três vezes, até que desistem de estudar. Como podemos garantir que essas crianças terão, no futuro, as mesmas oportunidades e condições que qualquer outra? Tentamos mostrar à sociedade, especialmente às pessoas que não circulam nesses espaços, que é responsabilidade de todos não permitir que essa desigualdade absurda permaneça.

Há possibilidades de mudança? Essa é a pergunta que me faço todos os dias. Sim, acredito que algum dia, em algum momento, o Estado vai entender que essas operações “enxuga gelo” não irão melhorar e muito menos resolver a situação em que nos encontramos. As fábricas de armas estão na Maré? Plantações e laboratórios de drogas estão na Maré? Na minha opinião, o combate à criminalidade não pode ocorrer desta maneira. Foi aqui na Maré que aprendi muito sobre segurança pública, andando por esses becos e vielas. Foi aqui que aprendi que essas operações “enxuga gelo” não garantem segurança, pelo contrário, aumentam os riscos e violam direitos de quem vive aqui. Pensar em uma política de segurança que aja com inteligência, é fundamental. Ações de fiscalização nas fronteiras terrestres, marítimas ou aéreas seriam, por exemplo, muito mais eficientes e eficazes no combate à criminalidade. Acredito que se nossos governantes quiserem mudar esta situação, eles têm condição. Sei que não deve ser simples, que deve ser bastante complexo, pois há várias questões envolvidas, especialmente questões políticas e de interesses pessoais.  

Mas sim, ainda assim, acredito que seja possível!

*Patrícia Vianna é professora, deu aula e coordenou o segundo segmento do Ensino Fundamental por mais de 30 anos no Centro Educacional Anísio Teixeira (Ceat). Trabalha na Maré desde 2001. Atualmente, coordena projetos nas áreas de Educação e Segurança Pública na Redes de Desenvolvimento da Maré.   



CAM realiza mais uma edição da Jornada Saberes e Fazeres

0

Evento promove encontro entre a Universidade e o Centro de Artes da Maré

Hélio Euclides

“Uma reunião de indivíduos para alcançar um objetivo comum”. Essa é a definição de parceria, algo que o Centro de Artes da Maré (CAM) vem realizando ao longo de seus dez anos de atividades. O equipamento cultural vem estabelecendo parcerias estratégicas com universidades nacionais e estrangeiras nos campos de ensino, extensão e pesquisa. Para refletir e discutir sobre a produção de conhecimento e os desafios da parceria, hoje (5), ao longo do dia no CAM, acontece a Jornada Saberes e Fazeres.

A jornada é a ocasião na qual se aprofundam as relações entre o CAM e a universidade, a produção de conhecimento resultante, os desafios, tensões e transformações que a articulação de saberes e práticas têm produzido ao longo da década. Nesse sentido, a jornada também vem atender a uma das diretrizes de trabalho da Redes da Maré na partilha de construção de diagnósticos e produção de conhecimento.

Uma dessas parcerias é o programa de extensão Teatro em Comunidades, que em oito anos de atividades, realiza uma ação consolidada, que produz conhecimento em Educação e Artes a partir de um encontro bastante feliz entre a Maré e a universidade. “Uma parceria firme, comprometida e afetiva que, a meu ver, traz benefícios para todas as partes envolvidas. Costumo dizer brincando que o melhor da Unirio é a Maré. Sinto que aqui a universidade cumpre um dos seus papeis, como diria Paulo Freire: o da invenção democrática de nossa sociedade”, destaca a professora Marina Henriques.

“Esta jornada é um evento muito importante para celebrar as realizações não apenas desta ação, mas de outras que respiram no CAM e que contribuem para que este espaço seja um importante centro de formação no Rio de Janeiro”, afirma Marina.

Parcerias que dão frutos

Propostas desenvolvidas no CAM têm despertado interesse, igualmente, de estudantes de graduação e de pós-graduação, se transformando em objeto de estudo de trabalhos de conclusão de curso, dissertações e teses. Além disso, muitos jovens frequentadores das atividades ingressaram na universidade, estimulados por essas experiências.

Um desses jovens é Gustavo Glauber, dançarino, que concluiu sua graduação de três anos, em dança, na Bélgica. “Esse foi o primeiro passo de uma grande conquista, o sentimento que eu tenho de ter esse diploma em minhas mãos é muito valioso. Esse era um dos sonhos da minha mãe, de ver o filho único graduado em ensino superior. Dedico a todos os jovens da Maré, que assim como eu lutam todos os dias para garantir seus direitos, apesar das barreiras. Por isso, na minha concepção as coisas ganham mais valor quando se tem que lutar para obtê-las”, conclui.



Novas gerações na Universidade

0

Mareense passa para um dos cursos mais disputados do estado e afirma: lugar de favelado é onde ele quiser

Thaynara Santos

Tamires Silva Nogueira, de 18 anos, faz parte da primeira geração da família a ingressar na faculdade. Após sua passagem pelo CPV (pré-vestibular da Redes), a moradora da Nova Holanda conquistou sua vaga em odontologia, na UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), um dos cursos mais disputados do estado.

A mareense afirma que ela e a família conheciam o trabalho desenvolvido pela Redes da Maré e o empurrãozinho para começar no preparatório comunitário veio de sua mãe. “Eu passava pela rua, via os anúncios dos projetos da Redes. Aí minha mãe me colocou no preparatório [para os concursos para entrada nas escolas públicas] quando estava no 6° ano. Eu fiz inglês aqui também”, explica Tamires.

Apoiar é preciso

O apoio dos docentes também fez a diferença na hora dos estudos. “Todos os professores me ajudaram muito, sempre que eu tinha alguma dúvida, a qualquer hora, eles me apoiaram. Eles não jogam a matéria em cima da gente, tem um apoio psicológico. Os professores conversam com a gente”.

Tamires conta que ela e dois de seus primos estão na faculdade, e sua irmã está no preparatório. A estudante diz que a mudança na rotina deixou sua família feliz, mas se preocupa com as finanças nos próximos períodos. “Acho (o curso) elitista, porque precisamos comprar material para a prática, e, nesse primeiro período, gastei R$ 900 reais”.

Descoberta da vocação

O primeiro amor da jovem estudante não foi pela área da saúde. Antes, Tamires se encantava pelo teatro e pela dança e até pensava em seguir carreira. Seu interesse surgiu por meio de sua tia, que trabalhava num posto de saúde e a levava para conhecer seu trabalho. Outro fator, este não muito agradável, também contribuiu para que a jovem descobrisse sua vocação. Num período, no qual passou por muitas crises de asma, Tamires foi encaminhada a hospitais diversas vezes. Com isso, a vontade de entender sobre a medicina aumentou. “Todos os médicos eram gentis comigo, me apaixonei pela profissão. Nunca tinha tido contato com nada, nem curso técnico de enfermagem, nada”, explica.

Lugar do favelado é onde ele quiser

Cursando o primeiro período na universidade pública, Tamires acredita que, além dela e de uma colega de classe, não tenham outras pessoas da favela em sua turma e que estudar na Redes foi essencial para o seu empoderamento. “Inicialmente, eu fiz biologia na UFF. Quando fui conversar com uma menina que fazia meu curso e disse que queria fazer medicina, ela estranhou que eu tivesse planos tão altos estudando numa ONG”, lembra.

Mesmo após ter passado por situações de preconceito na faculdade, Tamires acredita que o lugar do favelado é onde ele quiser. “Acho que a gente tem que ter mais inclusão. A quantidade de pessoa da favela que eu vejo na faculdade é muito pouca. Mostrar para as pessoas que a gente não é limitado e pode estar onde a gente quiser. Mesmo sendo pobre, negro e favelado”.

Tamires deixa um recado para quem ainda passa por dificuldades do vestibular. “Todo mundo passa por esse momento. Isso é normal. A gente não pode achar que não é capaz só porque teve momento ruim ou uma prova ruim. Quem vê um dentista acha que já vem de berço. E isso é uma mentira, a gente pode chegar lá”.


Jovem é executado em operação do COE na Maré

0

Um jovem foi morto e um policial, ferido;  população está amedrontada e sem poder seguir sua rotina

Jéssica Pires

Na última terça-feira (2), o Comando de Operações Especiais da PM (COE) realizou a quarta operação nos últimos 30 dias na Maré. A ação durou mais de 12 horas, deixou um jovem morto e muitos impactos negativos para o território. A ação começou na Vila dos Pinheiros e Vila do João por volta das 6h da manhã, avançando para a região do Morro do Timbau e Baixa do Sapateiro ainda no período da manhã.

Policiais do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), Batalhão de Polícia de Choque (BPChq), Grupamento Aeromóvel (GAM) e Batalhão de Ações com Cães (BAC) circularam nas cinco favelas durante todo o dia e início da noite com o apoio de blindados. O Maré de Direitos (projeto da Redes de Maré que oferece atendimento sóciojurídico gratuito) recebeu muitos relatos de casas invadidas e carros arrombados sem mandado judicial. Segundo relatos de moradores, as unidades de saúde e as escolas da região permaneceram fechadas. Quando questionadas sobre o funcionamento, as assessorias municipais de educação e de saúde não responderam.

Durante os confrontos um policial foi ferido e o jovem Antônio Vitor Silva Bandeira, (21 anos) morto. De acordo com informações da Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar, Antônio Vitor foi ferido durante um confronto no Morro do Timbau, socorrido e levado ao Hospital Federal de Bonsucesso (HFB). A assessoria de comunicação do HFB informou que o jovem já estava morto quando deu entrada no hospital por volta de meio dia. Segundo relatos de moradores, o jovem foi executado na região do confronto mesmo após se render.

A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informou também que durante a ação foi localizado um laboratório com tonéis, prensas, produtos químicos próprios para manipulação de drogas; seis armas (entre revólveres, pistolas e uma réplica de fuzil); um cofre e drogas (um saco contendo produto químico em pó, dois sacos de maconha, três sacos de pó branco, seis tonéis de loló, três bolas de cocaína e quatro sacos de maconha) e um rádio-comunicador. A motivação da operação não foi informada.

É importante lembrar que no último dia 19 de junho uma decisão da juíza Regina Lucia Chuquer de Almeida Costa Castro, da 6ª Vara de Fazenda Pública da Capital, suspendeu determinações da Ação Civil Pública (ACP) que protegiam moradores da Maré durante as operações policiais.  Uma semana antes da decisão, ocorreram quatro dias seguidos de operações truculentas na Maré.

O Eixo de Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré segue registrando as denúncias das violações de direitos fundamentais com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.

Você morador, pode escrever uma carta à Justiça manifestando sua insatisfação com a decisão de suspender a ACP da Maré.

Clique aqui e confira o modelo!

Use o modelo acima e deixe sua carta na sede da Redes da Maré (Rua Sargento Silva Nunes, 1012 – Nova Holanda; e no CIEP Ministro Gustavo Capanema – Vila dos Pinheiros); no Observatório de Favelas (Rua Teixeira Ribeiro, 535 – Nova Holanda) ou na Luta pela Paz (Rua Teixeira Ribeiro, 900 – Nova Holanda).