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Os perigos da obesidade

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Maré de Notícias #90 – 03 de julho de 2018

Obesidade e subnutrição caminham juntas 

Maria Morganti

Estamos cada vez mais gordos e com menos saúde. É o que revelam os dados da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS),  indicando que o sobrepeso afeta 54% da população brasileira. Ainda segundo o “Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe”, cerca de 20% dos homens e 24% das mulheres estão obesos. A situação não é melhor para as crianças com menos de 5 anos de idade: 7,3% estão com sobrepeso.

 

Epidemia global

O Relatório afirma que o sobrepeso em adultos passou de 51,1% em 2010, para 54,1% em 2014. Os números também aumentaram na avaliação nacional da obesidade:em 2010, 17,8% da população eram obesa; em 2014, o índice chegou aos 20%. No Mapa da Obesidade” produzido pela “Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica”, a Região Sudeste, que inclui os Estados de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais e do Rio de Janeiro, o número de adultos com excesso de peso é de 50.45%, perdendo apenas para a Região Sul, com 56.08%.

Para a Organização Mundial da Saúde, a obesidade é uma doença crônica. Em 1997, foi reconhecida, formalmente, como epidemia em escala global. O diagnóstico é dado quando o paciente tem acúmulo excessivo de gordura, medido pelo Índice de Massa Corporal, o IMC, que é o resultado do cálculo da fórmula matemática do peso mais a altura dividido pela altura (veja tabela).

 

Preconceito

A nutricionista Carolina Coutinho explica que a obesidade é uma doença causada por diversos fatores que podem interagir , em determinado indivíduo, para gerar o quadro de obesidade e também perpetuá-lo. “É uma doença extremamente complexa, não é à toa que a prevalência de obesidade aumenta, não só no Brasil, mas em diversos lugares no mundo. Não é uma coisa fácil de se resolver. E um dos motivos é  ter uma causa multifatorial. Dentre os que podem estar envolvidos na geração da obesidade, tem desde fatores genéticos até fisiológicos, como, por exemplo, alterações endócrinas, metabólicas e fatores psicológicos – que também é uma causa importante – e ambientais. Aí entram também a questão da dieta e da alimentação inadequada, a inatividade física que sofre influência de fatores sociais e socioculturais. Então são diversos fatores que colaboram para a geração do quadro de obesidade”, explica a nutricionista.

Para a especialista, existe uma tendência de se estigmatizar os indivíduos com excesso de peso e tratar a obesidade simplesmente como falta de força de vontade, ou falta de disciplina. “A gente vê muito isso nos discursos que têm sido propagados atualmente. Mas quando pensamos que é uma doença extremamente complexa, causada por diversos fatores, acho que fica mais fácil de entender que não é possível reduzir isso a uma falta de força de vontade ou de disciplina”.

 

Tratamento difícil

Apesar de ter sido aprovado, em maio do ano passado, o Projeto de Lei 4328/2016, que cria o “Estatuto da Pessoa com Obesidade” para garantir à pessoa obesa proteção à saúde, com a efetivação de políticas públicas que permitam o tratamento adequado, a alimentação saudável e a vida em condições de dignidade, no município do Rio de Janeiro só existem dois Centros de Referência a Obesidade (CRO) em funcionamento. Para conseguir atendimento, o paciente precisa ter o IMC entre 40 e 50, com diabetes, e maior que 50, com  qualquer ou nenhuma comorbidade, doenças associadas à obsesidade, e ser encaminhado pela Clínica da Família e do Sistema de Regulação (Sisreg). O atendimento é feito por uma equipe multidisciplinar, que inclui enfermeiro, professor de Educação Física, endocrinologista, psicólogo e nutricionista. Na Unidade da Rua Barreiros, em Ramos, mais próxima à Maré, o time de profissionais está desfalcado de nutricionista e psicólogo desde o ano passado.

Na esfera estadual, o Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione (Iede), que fica no Centro, oferece gratuitamente atendimento para obesos e para pacientes com transtornos alimentares, como anorexia e bulimia. Segundo dados oficiais da Secretaria de Saúde, o ambulatório atende 1.300 pacientes por mês de todo o Estado, que são encaminhados pela Rede de Atenção Básica de Saúde pela Central Estadual de Regulação. Também com equipe multidisciplinar, a primeira consulta sempre é com o endocrinologista, que faz uma avaliação geral e encaminha para as outras especialidades.

As consultas acontecem, em média, uma vez por mês. São oferecidos exames complementares, acompanhamento nutricional, orientação para exercícios físicos, terapia familiar e individual e, em alguns casos, pode ser indicada a cirurgia bariátrica, que é realizada em outras unidades da Rede pública.

O consumo de produtos ultraprocessados continua sendo o grande vilão dos obesos | Foto: Douglas Lopes

Alimentos perigosos

Em estágios menos avançados, jovens como Carolina Antoniolli, 28 anos, com sobrepeso e deficiência de vitamina D, são cada vez mais comuns. “A primeira vez eu procurei uma  nutricionista, porque a minha imunidade estava muito baixa”. Na segunda, um ano depois, o motivo era outro: “minha vitamina D estava muito baixa e eu queria emagrecer mesmo”. Com Vanessa Andrade, 33 anos, a situação foi parecida. “Por conta do sobrepeso, procurei um endocrinologista e uma nutricionista, que me prescreveram exames de sangue e deu que a minha vitamina D estava muito baixa”.

Larissa Valença, nutricionista que atendeu Carolina, esclarece que estar acima do peso não significa que o paciente está bem-nutrido. “Estar acima do peso ou com obesidade não é sinônimo de estar bem-nutrido. Embora nos últimos anos tenha se falado muito em alimentação saudável, o consumo de produtos alimentícios ultraprocessados continua sendo muito grande e isso pode estar  ligado a fatores como: baixo custo, praticidade e fácil acesso. Muitos destes alimentos são ‘ricos em calorias vazias’, ou seja, são alimentos que, apesar de terem calorias, quase não apresentam nutrientes. Sendo assim, o consumo excessivo destes produtos pode levar ao ganho de peso, mas este indivíduo pode, ao mesmo tempo,  apresentar diferentes tipos de carências nutricionais de vitaminas, minerais e, até mesmo, de macronutrientes, como proteínas, já que a grande maioria destes produtos alimentícios são ricos em carboidratos e têm baixo teor de proteína.

Esse paciente pode ser diagnosticado por  exame físico e  exames bioquímicos. Tem sido cada vez mais frequente, no consultório, atender pacientes que chegam buscando auxílio no emagrecimento, mas que se encontram com sinais e sintomas de desnutrição. “Os alimentos mais danosos são os industrializados, ultraprocessados, que em sua maioria são alimentos ricos em sódio, gordura vegetal, açúcar e corantes. Todos os ultraprocessados, de forma geral, podem ser considerados alimentos muitos ruins para a saúde; dentre eles podemos destacar alguns como: refrigerantes, embutidos, margarina, pratos prontos congelados, sucos artificiais em pó, molhos industrializados, biscoitos, salgadinhos tipo chips e doces industrializados”, ressalta a nutricionista.

“Agora consigo planejar meu dia direitinho, o que vou comer, separo tudo bonitinho. Tenho até acordado mais cedo para fazer as coisas, tranquilamente”, conta Carolina sobre a dieta que está fazendo, “por saúde”. Para ela, o mais difícil foi parar de comer doces. “Eu amo chocolate, mas eu vi que estava beirando o exagero, parei de comer todo dia”. Ela está participando de um desafio de 15 dias, organizado pela nutricionista, para estimular práticas saudáveis e pretende manter o estilo de vida após o fim do programa. “Depois do desafio, eu posso incluir essas coisas (chocolate) de novo. Mas não no meu dia a dia. Uma vez ou outra não é proibido. É saber dosar. Como diz meu avô, ‘veneno não mata, o que mata é a quantidade’”.

 

Maré de Notícias #90

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Seremos muitas Marielle’s

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Kamilla Valentim em 01/07/2018 para o Maré de Notícias

Era noite de 14 de março de 2018.

Quando recebi a infeliz notícia, através do celular

“Vereadora Marielle Franco morta a tiros”

Eu lia e relia, mas não queria acreditar

 

Abri a geladeira e a cerveja. Parei, sentei e ali permaneci

Tentando pensar: Alguém vai desmentir

Me obriguei a ir dormir pra tentar absorver, esquecer, procurar outra faceta

Sonhei com Djamila Ribeiro, outra mina preta

Acordei confusa, afinal, quem morreu? Foi Djamila, Marielle ou fui eu?

 

Já era quinta-feira de manhã. A notícia se confirmou

Que tiro foi esse? Não foi um arraso! Mas sim, me arrasou.

Me arrasaria mesmo se fosse apenas um. Mas foram nove

Tamanho o ódio que uma mulher preta vereadora promove

Nove tiros no carro, em Marielle, no meu espelho

Não consigo me ver por inteira. Só vejo pedaços. Só sinto receio.

 

Fui pro velório na Cinelândia, abraços apertados, dor, desesperança…

Chovemos sem parar naquela quinta de sol

E depois de um dia intenso, estou a me perguntar: Existe algo que possa nos blindar?

A sensação é de que não. Nada nos blinda e nem nos protege

Nem mesmo graduação, dissertação ou tese

 

É Marielle, sejamos Francos: Quantos de nós já te executamos?

Como explicar a ausência de mulheres como você no Legislativo, no Judiciário e no Executivo?

É execução que se fala? Invisibilidade que se fala?

Racismo, machismo ou lesbofobia que se fala?

Talvez sejam todos esses fenômenos juntos. Porque nossa existência é holística

 

É, Marielle, você sequer foi ameaçada.

Mas um corpo preto nunca precisa de ameaça pra ser morto.

A gente tá sempre na linha de frente

 

Marielle, você sabe… Sabia…

Nossos heróis e heroínas não morrem de overdose

Morrem executados

Enforcados

Ensanguentados

Desfigurados

Você virou símbolo porque sabia disso! Porque lutou contra isso!

Símbolo de um luto coletivo. De uma luta coletiva.

Você ocupou! Denunciou! Transformou! Nos representou!

Você tentou mover estruturas

E foi essa estrutura que se incomodou!

 

Seu assassinato nos apavora, mas nos deixa um recado:

Além da dor, a certeza de seu enorme e potente legado

A certeza de que não podemos ser UMA Marielle, senão viramos alvo

Temos que ser muitas, cada uma em sua esfera

Porque somos mulheres pretas, ninguém aqui é Cinderela

Não perdemos sapatos. Perdemos nossos filhos, irmãos, primos…

Perdemos nossa própria vida numa rua da Estácio…

São sempre nossas vidas. Não importa se na favela ou no asfalto.

 

E sim Marielle, nós não seremos interrompidas!

Seremos protagonistas

Nossos corpos vão ocupar diferentes espaços

Por falar em corpo, Marielle, levaram o seu…

Num assassinato brutal um silenciamento material

Era só isso que esses covardes podiam tentar

 

As águas de março fecharam o verão

Não sei dizer se há promessa de vida em meu coração…

Mas a sua existência, Marielle, com certeza não foi em vão.

Porque assim como Martin Luther King, Marielle

I still have a dream!

Eu ainda tenho um sonho! E não, não serei interrompida!

Reunião entre Redes da Maré e Associações de Moradores da Maré com o Chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro

Em 25/06/2018

A Redes da Maré participou hoje de uma reunião com o chefe da Polícia Civil com as Lideranças comunitárias da Maré, moradores, DPE – Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Entidades de Direitos Humanos e o Fórum Basta de Violência, Outra Maré É Possível. As propostas firmadas pelas instituições na reunião foram: acompanhamento dos homicídios na Maré; uma agenda de reuniões permanentes entre a Defensoria e moradores da Maré para a construção do plano de redução de danos da Policia Civil; criação de um protocolo para o uso de Helicópteros em operações policiais nas favelas. A #RedesdaMaré está acompanhando junto à Defensoria Pública, e Delegacia de Homicídios o caso da chacina que deixou 5 mortos: Kelvin Duarte Santana, Francisco Felipe Pereira, Paulo Henrique Silva de Oliveira, Igor Barbosa dos Santos, Marcos Vinícius, na última semana no Conjunto de Favelas da Maré. Os estudantes
Marcos Vinicius, de 14 anos, e Levi, de 18, também foram mortos nesta operação.

Clique aqui e confira a carta que os membros do “Fórum das Associações de Moradores da Maré – A Maré que Queremos
e Fórum Basta de Violência! Outra Maré é Possível!” entregou ao Chefe da Polícia Civil.

Uma manhã de saúde na Baixa do Sapateiro

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Em 25/06/2018

Hélio Euclides

Moradores da Baixa do Sapateiro participaram da 2ª Ação Social de saúde promovida pela Associação de Moradores e CECAMP (Centro Educacional Cassandra e Marcelo Paes), na manhã de 02 de junho. O evento reuniu 25 alunos do curso técnico de enfermagem, que promoveram serviços gratuitos, como teste de glicemia, verificação de pressão arterial, acompanhamento de índice de massa corporal e vacinação contra a gripe influenza em gestantes e idosos.

“A ação visa o acesso da população aos serviços. O objetivo é sensibilizar e promover saúde preventiva”, analisa Letícia Correa, enfermeira responsável pelo evento. No stand do NUSOMAR (Núcleo de Socorristas da Maré), palestras sobre de primeiros socorros foram oferecidas. “Cuidar da saúde sem precisar ir distante de casa é muito bom”, comenta a moradora Sônia Maria. A ação realizou 210 imunizações e cerca de 500 atendimentos.

30 mortes por uma operação

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Por Ane Alves , estudante, 17 anos e moradora da Maré

Em 22/06/2018

Os fogos pareciam uma versão violenta daquela kombi que passa anunciando “30 ovos por 10 reais!”. Já os fogos diziam “30 mortes por 1 operação!”.
Fechei os olhos e me escondi embaixo da cama.
O helicóptero da polícia voava tão baixo que parecia que estava dentro da minha casa… Embaixo da minha cama, comigo. Me apertei ainda mais contra a boneca que eu segurava. Fechei os olhos e pensei na minha irmã, que estuda bem ali na divisa (entre a Baixa do Sapateiro e a Nova Holanda) e na minha mãe, que estava trabalhando ali no Fundão.
Fechei os olhos pensando nas crianças que estavam na escola ou em casa. Pensei nas tias que vão pra Vila Olímpica nesse horário.
– Tra, tra, tra, tra, tra! –
Ouvi mais uma rajada. O helicóptero atira sem parar contra o asfalto. Fechei os olhos mais uma vez.
Ouvi um grito. Um grito desesperado. Ouvi alguém gritar:
– “Meu filho!”
Mais um que se foi. Mais uma mãe que grita de dor. Mais uma mãe que teria que confrontar a mídia ao afirmar que o filho não era bandido.
E se ele fosse? O que o sistema tinha feito pra impedir? O sistema matou mais um. Mais um pra conta do governo que está no vermelho há tantos anos que, talvez, seja impossível pagar.
O sistema tira um pouquinho da gente todos os dias. Só entram na favela durante a época de eleição, a fim de reacender aquela chama de esperança de que as coisas vão melhorar, para depois atirarem sangue nela pra apagar.
“Mais um…”
Pensei que eu poderia ser a próxima “Mais um…” na estatística de mortes dentro da favela.
O sistema é foda! Ele é falho, fraco e opressor. Não assegura uma oportunidade de não ser bandido mas, já de primeira, sempre nos chama de bandido. Marginaliza ao invés de desenvolver.
Minha Maré sofre repressão há tantos anos, que é  impossível um cálculo exato de tamanho sofrimento e resistência.
A gente sangra todos os dias. A cada operação é um anúncio:
– “30 mortes por 1 operação!”
São 30 não só aqui mas também na Rocinha, Alemão, CDD, entre outras. Pro sistema, bandido só tem na favela. Mas quando eles vão perceber que os bandidos…são eles?
– Tra, tra, tra, tra! –
Mais uma rajada. Mais um grito. Mais um aperto no coração e mais uma mãe chorando.
Respirei fundo e fechei os olhos, me preparando para o próximo grito.

A tal guerra não é contra o tráfico é contra a gente, é contra quem ta vivendo na base do sistema e tem que lutar todo dia pra existir e resistir. Afinal… viver na base é resistir, ou melhor lutar para sobreviver.

“Aqui estou, mais um dia.

Sob o olhar sanguinário do vigia.”

-Diário de Um Detento,Racionais MC’s