Com cheiro ruim e cor de barro, cariocas precisam comprar água

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Problema na água persiste desde o ínicio do ano 

Por Thaís Cavalcante em 05/02/2021 à 18h

Editado por Edu Carvalho

Garantir o acesso universal e seguro a água limpa e saneamento básico é um dos objetivos de desenvolvimento sustentável do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), mas isso parece cada vez mais distante da população mareense e de todos os cariocas. A “Crise da geosmina” vivida em 2020 está sendo relembrada agora: quando não falta, a água consumida tem gosto e cheiro. O problema impacta a população durante a pandemia e isso se agrava, pois o Rio de Janeiro já perdeu mais de 17 mil e 500 vidas para covid-19 e segue como líder em número de mortes do Brasil. E o Conjunto de Favelas da Maré, no topo como o território popular com mais casos da doença: 2.449.

Na última quinta-feira (4), um pedido do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro através do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente e a Defensoria Pública do Estado chegou à justiça. O documento solicita com urgência que a Justiça indique que a Cedae forneça um desconto de 25% na conta de água da população – tanto pela falta de abastecimento quanto pela baixa qualidade. “Tendo em vista o estado de calamidade pública em razão da pandemia de Covid-19, os demandados providenciasse a regularização do fornecimento de água em todas áreas da capital fluminense, vedada a exclusão das comunidades carentes”.

De acordo com a CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro), o motivo do problema ainda é o mesmo do ano passado: isso acontece pela presença da alga geosmina. A companhia afirma que aumentou a dosagem de carvão ativado na entrada de água na estação e vem aplicando a argila ionicamente modificada para reduzir proliferação das algas na lagoa. Enquanto isso, as reclamações da população continuam e não só pela falta da qualidade, mas também pelo gasto com a compra de água mineral.

Camilla Nascimento, moradora da favela Marcílio Dias, na Maré, não confia na água que sai da torneira nos últimos meses. “Aqui em casa a água está vindo com gosto parecido com o terra e de ferrugem. Está bem difícil, porque tenho dois filhos pequenos e não posso dar essa água para eles. Estou comprando com toda a dificuldade e apoio dos meus avós, pois não estou trabalhando. Eu acabo tomando essa água suja, mas não dou pra eles”, conta.

Moradores na luta pelo direito à água

A falta de abastecimento de água nas casas em janeiro também impactou a vida dos moradores, devido ao fechamento da estação do Rio Guandu. Nos últimos meses de 2020 foi iniciado um mapeamento local online realizado pelos coletivos de favelas Maré Vive, Maré 0800, Palafita 174, Papo Reto e Coletivo Marginal para saber em quais espaços populares estava faltando água. Foram mais de 400 notificações por meio de formulário em 24 horas que seriam levadas às autoridades. 

Jota Marques, conselheiro tutelar e morador da Cidade de Deus, representou os coletivos de favelas na audiência pública “O direito humano à água”, realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) em dezembro de 2020, junto a moradores de favelas e representantes de organizações.

“Neste momento de pandemia é onde nos falta a água, uma questão de direito humano e de dignidade. (…) Isso não é uma coisinha que vai passar. A gente precisa muito de água para se proteger, além de precisar beber para não morrer de sede. Os coletivos estavam na linha de frente para evitar a expansão da pandemia e a água é fundamental”, destaca Jota.

Ele completa que não é a população mais pobre que faz o uso exagerado da água, mas sim as grandes indústrias. E que o capitalismo transforma a água em produto para ser privatizado. “A gente precisa proteger a nossa água e o nosso meio ambiente. Precisamos de ter um olhar mais atento para o nosso povo”.

Assista a audiência pública “O Direito Humano à água” na íntegra:

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