Fechadas durante pandemia, unidades de ensino sofrem com depredação
Dani Moura e Hélio Euclides
Como é triste um pescador retornar para casa sem nenhum peixe e para piorar com a rede rasgada. O sentimento é de frustração, de que o mar levou o seu alimento. Se tivesse vivo, o morador e pioneiro no trabalho da pesca na Maré, Albano Rosa, que desde de 2004, dá nome a uma creche na Vila dos Pinheiros, estaria com o mesmo sentimento ao ver essa unidade de ensino sofrer degradação. Noemi Mariz Kazan é a diretora e reclama que a creche sofre com arrombamentos e furtos. Até a grade que cercava a creche já foi levada. Essa unidade é uma das muitas que foram depredadas durante a pandemia do novo coronavírus.
Diretora há quatro anos, Noemi também se sente frustrada com a situação. A creche perde muita receita ao ter que fazer reparos sempre e diversas vezes se gastou verba com serralheiro para consertar a grade. “De todas as verbas que recebo, tenho que tirar uma parte para reposição de algo que levaram ou quebraram. Não consigo comprar material pedagógico, pois não sobra recursos”, diz. A creche ainda é ocupada por cavalos que ficam pastando no terreno nos finais de semana.
Outro problema está na brincadeira das crianças da vizinhança, que sobem no telhado para soltar pipa e acabam destruindo o telhado. Nesse ato, acontece o rompimento de fiação da internet, o que deixa a escola sem comunicação. Além disso, as crianças acabam deixando a creche sem água ao desligarem o cabo automático da caixa. “Apesar da unidade ser precária, lutamos para ser um local acolhedor e que deixe os alunos felizes. Realizamos um trabalho pedagógico eficaz para as crianças e pais”, explica a diretora. Até a estrutura de ferro que permite o acesso à cisterna já foi retirada. Por precaução, a bomba d’água não pode ficar no local e foi preciso guardar em local seguro.
Antes da pandemia, a creche já sofria com esse problema, mas agora a situação piorou. A creche ficou fechada e nem o material da obra do muro frontal escapou de ser furtado. A obra tem três etapas e assim que a empresa terminou a primeira fase para começar a segunda, a diretora percebeu que foram levadas madeiras e até tubos de ferro e grades do antigo muro, que seriam repostos do lado direito da creche. “Me sinto feliz por fazer o muro frontal da creche, mas ao mesmo tempo triste com esse vandalismo na nossa unidade e em outras da Maré. Penso que a creche não é só minha, nem da Gilda Maria, minha adjunta, e nem tão pouco dos professores. É um bem público que precisa ser cuidado por todos. Os pais precisam se apropriar da creche e não deixar ninguém depredar o espaço”, conclui.
Uma história de luta
A Creche Pescador Albano Rosa tem uma trajetória de luta. Nasceu como comunitária, administrada pela Associação de Moradores do Morro do Timbau, onde antes era uma unidade de saúde dirigida por uma empresa privada, no pé do Morro. Com o prédio deteriorado, eles tiveram que ser removidos. O local escolhido para a nova unidade foi na Vila dos Pinheiros, em contêineres que foram instalados provisoriamente para abrigar a Escola Professor Paulo Freire, antes da construção.
A creche nunca voltou para o local de origem, pois hoje abriga o primeiro Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI) da Maré, Pescador Isidoro Duarte – Doro. As salas feitas de metal foram reformadas e o que era provisório, algo bastante comum na história da Maré, virou permanente. A creche tem 40 metros lineares e os muros de ferros tinham 2m de altura, que boa parte da grade foi furtada. Hoje, a creche atende 140 crianças com idade entre 2 a 5 anos e 11 meses de idade.
A escola é de todos
Uma história de degradação que mudou a vida de um território aconteceu em uma das maiores favelas da capital paulista, na Estrada das Lágrimas, Heliópolis. A Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente Campos Salles se tornou uma escola-modelo tanto na modo que se relaciona com a favela quanto como redesenhou o papel do professor em sala de aula. O diretor Braz Nogueira conseguiu integrar o colégio público de periferia à comunidade local.
Tudo começou em 2002, quando foram roubados 21 computadores da escola. Uma liderança comunitária andou com o diretor pelas ruas do local para falar com as pessoas que os filhos haviam sido roubados. Esse ato de sair pela favela e mostrar que o furto era contra os alunos fez com que os computadores fossem devolvidos. A resposta do diretor foi derrubar o muro e mostrar que ali era um local seguro e integrado a Heliópolis. Todos entenderam que a escola tem que ser centro de referência e liderança na favela onde está inserida.