Por Sara Alves
Ê Vila da minha vida
Dos meus pesadelos e realidade
Realidade e sonhos
De Cidade Fantasma eu te chamava
Tudo desconhecido. Ninguém me encantava
Sofri com a dor, mas não perdi as raízes da minha infância
Amigos que não vejo mais
Amigos que ficaram pra trás
Amigos que não esqueço jamais
Ê Favela Querida!
Nova Holanda é seu nome
Alegrias ao entardecer
Bola, peteca e muita correria
Isso sim é que é infância!
Medo do homem do saco
Pavor da mulher loura
Nunca vi o porco com cabeça de gente
Só sente quem viveu
Belas lembranças…
Cupins nas paredes
Êta tardes ensolaradas
Haja bacia com água pra sossegar tantos bichinhos
Quem bom! Faltou a luz ê, faltou a luz ê…
Agora papai contará contos e causos
Êta criançada danada!
Cada história de arrepiá
Oh! Meu Deus! E os filmes nos Galpões?!
A Leão XIII é famosa
Até hoje sinto o cheiro de vampiro
E a mulher com meia cara de esqueleto?!
Não me lembro da Páscoa
Não me lembro de ovos de chocolate
É, mas de Festa Junina, hum…
Êta coisa boa: canjica, bolo e doces
Não esqueço da cadeia
Quem não paga pra sair, fica até o amanhecer!
Que pena, tenho que dormir
Criança não fica acordada à noite toda, mamãe dizia
Eu não sei quem inventou que a noite é pra dormir
Ah! Meu Deus, por que não posso brincar à noite?
Seria tão bom!!
Vi estrelas pelas frestas do telhado
Vi chuva molhar o assoalho
Imagina! Tem rato e ratazana
Tinha tristeza com a morte
Ê coisa esquisita defunto na sala de casa
E os piques?
Pique-tá, pique-esconde,
pique-alto, pique-baixo…
Haja pique
Ê Vila Querida, não sinta ciúmes, não!
Hoje, você é bela também
Meio louca, mas bela
Aprendi gostar de você
Agora, o Castelo Encantado até luz lilás tem!
Que lindoooo!!
Você nunca reparou?
Pare e repare
Novos amigos eu fiz
Novos amigos perdi
O Amor aí conheci
Muitos não te conhecem e te consideram o inferno
Você hoje é enorme. Não é mais Inferno Colorido
Tardes lindas, céu com lua quebrada
Estrelas nunca faltam
Trabalhadores saem cedinho
Haja ônibus, kombis, vans, bicicletas e tudo mais para tantos lutadores
Ê Vida… Ê Vila…
Quem não te conhece, te julga
Têm “os meninos…”, você sabe…“os meninos”…
Mas onde não existem mais esses “meninos”?
Aqueles…, aqueles… os “excluídos” ?!
Não posso falar. É perigoso! É melhor me calar
Quem mora na favela não sabe de nada, não vê nada
e nada fala. Essa é a lei
Ê favela! Hoje você é Co-mu-ni-da-de?
Êta orgulho besta!
Dona Omissão você só vive na favela?
Fala Omissão!
Pode falar que eu não conto pra ninguém
Em que canto você vive?
Pode deixar, eu não conto pra ninguém
Fale baixinho
Eu sabia, eu sabia!!
Você está em todos os cantos!
Mas deixa pra lá, porque eu só quero declarar as belezas que a Vila tem
e que muitos desconhecem também
Vila, você cresceu!
Êta coisa doida: é gente no meio dos carros,
é carro no meio de gente!
Forró, pagode, festas, futebol e muito churrasco
Êta povo trabalhador, que inventa o que fazer pra sobreviver
E ainda tem gente que comenta que essa Gente não é valente
E ainda tem gente que diz que essa gente é vagabunda
Essa gente nada sabe sobre gente
Violência?! Lógico que tem. Mas onde, agora, não tem?
Vila, você cresceu!
E eu aprendi gostar de você com todos os seus defeitos
E sei que não sou a única
Muita Gente te admira, mesmo contrária à mídia você tem o seu valor
Vila, você é mais que do João
Hoje é dos Josés e das Marias e acorda todos os dias com o cantar dos pássaros, com o andar dos trabalhadores e também dos “vagabundos”
Quando ainda há estrelas que guiam a minha vida
A vida na Vila
A Vila da gente.