Enem 2021: o impacto da crise da saúde na educação

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Desafios de estudantes, educadores e gestores de cursos comunitários para obter boa nota no Enem em meio à pandemia

Por Kelly San, em 09 de abril de 2021, às 20h15
Editado por: Andressa Cabral Botelho

Meses após a realização do Enem em formato presencial e virtual, uma novidade que precisou acontecer diante os avanços da pandemia, os alunos inscritos no exame têm até o final do dia 09 de abril para se inscrever no Sistema de Seleção Unificada, o Sisu. Entretanto, para muitos estudantes, em especial os moradores de favelas e periferias, o ano escolar de 2020 foi um desafio diante das mudanças da dinâmica escolar, alterada do modo presencial para o virtual. Não apenas na escola, mas a pandemia também impactou na preparação para o Enem desses jovens.

Em meio à pandemia não são poucos os problemas para professores e alunos que tiveram suas rotinas modificadas com esse formato de ensino remoto, como lidar com baixa qualidade da rede, falta de equipamentos para estudar e até mesmo cuidar da saúde mental. Somente 36,7% dos domicílios da Maré têm internet e 42,4% possui equipamentos necessários para estudar, de acordo com o Censo Maré (2019). Um número muito abaixo da média, se comparado a bairros, onde 62,2% dos moradores possuem computador e 56,1% das pessoas conseguem acessar a internet em casa, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, de 2013. 

“Além do problema dos estudantes que não têm acesso à internet, nós temos os alunos que têm acesso, mas não conseguiram se adaptar a esse formato remoto, não consegue se concentrar e criar esse cronograma de estudos em casa mas que querem muito estar dentro do pré- vestibular” comenta Luana Silveira coordenadora executiva do Curso Pré-Vestibular (CPV) da Redes da Maré. O curso existe há pouco mais de 20 anos e precisou criar estratégias para conseguir envolver os alunos nas atividades remotas propostas. Aluna do pré-vestibular, Ana Paula Oliveira, de 27 anos, foi uma das que sentiu dificuldade nesse período: “O CPV me deu a oportunidade de voltar a estudar, só que no começo do ano passado veio a pandemia e aí começaram as grandes dificuldades com o ensino remoto.”

Os pré-vestibulares comunitários, em sua grande maioria gratuitos ou com mensalidade bem abaixo do valor cobrado, cumprem um papel importante ajudando a ampliar o acesso de moradores de favelas e periferias na universidade. Na Maré, 44,3% das pessoas frequentaram um curso para ingressar no ensino superior, segundo o Censo Maré.

Toda ajuda é válida

No Jacarezinho os problemas foram os mesmos. Lá eles têm o NICA, iniciativa que oferece aulas preparatórias que atendem, majoritariamente, moradores dessa favela e de outros espaços populares da cidade. O projeto conta com professores e coordenadores voluntários, que precisaram pensar em alternativas para continuar oferecendo esse serviço para os moradores durante a pandemia. Uma delas foi a campanha #4GParaEstudar, criada pelo Nossas, que deu suporte a alunos de 33 pré-vestibulares de 10 estados do país, entre eles o NICA, oferecendo a eles chip e internet para que pudessem estudar virtualmente.

“Eu tento incentivá-los pois sei o quanto é difícil nesse momento para eles estudarem. Um dos maiores problemas em dar aula a distância é que o sinal de internet em espaços de favelas é de péssima qualidade. Além disso, o acesso a equipamentos digitais [computadores e celulares] não é o mesmo em relação aos estudantes de outros espaços da cidade”, aponta Flávia Cândido, professora voluntária de gramática, redação e literaturas no NICA. 

Graças aos esforços do coletivo, os estudantes do NICA alcançaram excelentes resultados na prova do ENEM. Jean Maurieli foi um dos alunos do NICA que conseguiu pontuação alta na redação do Enem. “Eu tenho vontade de fazer Direito e acompanhar as aulas do NICA foi muito difícil devido ao sinal da internet. Para auxiliar nas aulas eu assistia vídeos de reforço no YouTube para melhorar a minha compreensão sobre o conteúdo que estava sendo dado”, lembra.

Para Bianca Peçanha, de 22 anos, coordenadora executiva do NICA, os dois pré-vestibulares, assim como iniciativas realizadas pelo Nossas, são de extrema importância para mudar a realidade que vivemos e permite que mais pessoas de espaços populares possam acessar as universidades. “Somos um coletivo de ensino antirracista, comprometido com o ensino democrático, e nesse sentido, articulamos várias parcerias para conseguir que nossos alunos possam continuar os estudos. Entendemos as demandas do grupo de alunos e acompanhamos de perto os casos mais específicos e conseguimos ajudar nossos alunos para além dos conteúdos das provas e com esse trabalho articulado os alunos do NICA tiveram um ótimo desempenho na redação do Enem e agora seguimos nos preparando para prova da UERJ”, conclui.

Leia mais: Longo e penoso caminho da educação à distância na Maré

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