Pela primeira vez, a Maré teria prédios habitacionais, em 1982, com a construção do Conjunto Esperança. Os 35 edifícios de cinco andares cada, foram erguidos entre o campus Maré da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Canal do Cunha, com um total de 1.400 apartamentos.
O Projeto Rio previa a remoção dos moradores das palafitas para a Zona Oeste, mas com a união de lideranças da Maré, os moradores acabaram sendo alocados para a região, que inicialmente tinha a estimativa de abrigar 7.000 pessoas. A Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro (CEHAB) foi a responsável pela seleção e instalação dos moradores no conjunto.
Serviços ausentes
Os moradores mais antigos contam que no início, a vida no novo conjunto não foi fácil, principalmente pela ausência de serviços públicos e comércios, o que retratava a falha de planejamento pelo governo da época.
Um desses moradores é Fátima Aparecida, de 68 anos, que vive há quatro décadas no Conjunto Esperança, 15 destes trabalhando na associação de moradores.
“No início era tudo prédio e mais nada, era tudo mato. A população sentia falta de um comércio, eu fazia compras e trazia de ônibus. O primeiro comércio foi de um senhor que vendia leite e pão de bicicleta. Ele berrava e os moradores desciam dos apartamentos, era o nosso iFood da época”, brinca.
Fátima lembra também dos pescadores que trabalhavam no entorno do conjunto, quando as águas da baía ainda tinham peixes, dos boatos sobre a favela ter sido planejada para ser um condomínio fechado, mas que o projeto não foi para frente, e como a Vila do João na época era a favela de referência, até mesmo para comprar pão.
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“Minha mãe dava aula de culinária na Ação Comunitária, na Vila do João. Usava até flores de abóbora nas receitas, algo que tinha muito por aqui.”.
Amor pela favela
Nas conversas com os moradores, é inegável o amor e carinho que se revela pelo território. Apesar de ser uma favela originalmente criada com prédios, às margens da Baía de Guanabara foram construídas pelos próprios moradores um conjunto de casas, conhecidas como Vila Esperança ou “Pata Choca”.
Segundo o Censo Maré, hoje a favela é composta por 1.870 habitações, entre apartamentos e casas, e mais de 5 mil pessoas. Um dos moradores ilustres foi a vereadora Marielle Franco, que fazia questão de se dizer “cria da Maré” e passou parte da vida no Conjunto Esperança.
Pedro Francisco, presidente da Associação de Moradores do Conjunto Esperança há 12 anos, deixa claro o motivo da escolha da favela para morar. “Aprendi a amar e cuidar com todo carinho e respeito daqui. O Conjunto Esperança não é melhor e nem pior, apenas diferente”, opina.
Já Fátima afirma como gosta de ver no que a favela se transformou, com jardins e árvores que limpam o ar. “Hoje aqui é estilo Zona Sul: tudo organizado com praças, dois campos sintéticos e escola com muro multicolorido. As paisagens que vejo das minhas janelas são lindas, como o Pão de Açúcar, a Igreja da Penha e o Castelo do Instituto Oswaldo Cruz’, afirma orgulhosa.
E conclui: “Tenho muito carinho pelo conjunto, pois minha vida foi aqui, vim com minha mãe, me casei, tive três filhos e agora são dois netos. Hoje o conjunto é um adulto ainda em fase de evolução”.