Demolição pega de surpresa moradores da favela Rubens Vaz, na Maré

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Prefeitura do Rio derruba casas de ocupação irregular na favela de forma arbitrária, nesta quarta-feira (05). Não houve notificação e nem tempo dos moradores retirarem seus pertences. Policiais militares acompanharam a ação.

Por Hélio Euclides em 05/05/2021, às 19h30
Editado por Andressa Cabral Botelho

Na manhã desta quarta-feira (05), a favela do Rubens Vaz, na Maré, foi cercada por quatro carros blindados do Grupamento de Choque da Polícia Militar, conhecidos como caveirão, para uma operação. A Secretaria Municipal de Ordem Pública (Seop) realizou uma operação para remover moradores de suas casas e derrubar as habitações, construídas irregularmente. 

A ocupação fica ao lado do Centro Integrado de Educação Pública (Ciep) Hélio Smidt, às margens da Linha Vermelha. Durante a manhã não ocorreu apresentação de nenhum documento por parte da Prefeitura, que utilizou a via expressa para estacionar os tratores usados na demolição.

Nas redes sociais, o prefeito Eduardo Paes justificou que as casas estavam desocupadas e a ação era uma resposta à atuação de milícia e tráfico no local. “Casas muito ‘humildes’ como podem notar. Aliás, ninguém morando dentro. Não vamos mais permitir a indústria imobiliária da milícia e do tráfico de drogas no Rio. Essa turma precisa decidir de que lado está”, comentou o prefeito em postagem. 

Segundo os moradores, os funcionários da Prefeitura responsáveis não apresentaram nenhum papel que esclarecesse a ação e a única informação que mencionaram foi que a Associação de Moradores do Rubens Vaz tinha recebido uma notificação há 30 dias. Ellen Ferreira (26) é secretária da associação e negou a justificativa. Ela também relatou que funcionários da Prefeitura argumentaram que as casas tinham sido erguidas há apenas dois dias e que não morava ninguém no local. Entretanto, ela morava há um ano com o esposo e os três filhos na favela. “Tudo o que eu tinha, investi no imóvel, e de uma hora para outra vou perder tudo. Eu tenho as notas fiscais que comprovam que o material de construção foi comprado no ano passado”, conta a secretária que, diante da situação, voltará a morar na casa da mãe.

Policiais militares, que deram suporte a operação, não deixaram ninguém ver ou se aproximar do local onde estava acontecendo a demolição, com a alegação de que poderia ocorrer um acidente. Mas moradores disseram que os domicílios ameaçados podem passar de 20 casas. Letícia dos Santos, de 22 anos, está grávida de quatro meses e mora no local há um ano. Na casa residiam seis pessoas, sendo duas crianças. “Bateram na minha porta e pediram que eu saísse, sem explicação. É um abuso. As moradias podem ser ilegais, mas não podem fazer isso sem um documento. Interditaram minha casa, não deu tempo de tirar nada. Todos os moradores estão esperando para saber sobre o futuro. Estou sem chão”, reclama.

Policiais durante a demolição. Foto: Matheus Affonso

Na parte da tarde, funcionários da Prefeitura começaram a distribuir notificações que determinavam a desocupação por um prazo de cinco dias. O documento tinha a identificação da Secretaria Municipal de Conservação. Edinaldo dos Santos, conhecido como Deraldo, presidente da Associação de Moradores do Parque União, afirmou estar no local em solidariedade aos moradores “Eles vieram sem autorização por escrito. Nem a 30ª Região Administrativa sabia do ocorrido. É uma covardia. Sou contra isso que está ocorrendo”, afirma.

Apesar da notificação dar 5 dias para que os moradores saíssem, as casas foram demolidas

O caso foi acompanhado pela deputada Renata Souza, hoje presidente da Comissão Especial de Combate à Miséria e à Extrema Pobreza da Assembleia Legislativa do Rio. Nas redes sociais, ela ratificou que houve infração da Lei nº 9020, de setembro de 2020, que “determina a suspensão do cumprimento de mandados de reintegração de posse e imissão na posse, despejos e remoções judiciais ou extrajudiciais enquanto medida temporária de prevenção ao contágio e de enfrentamento da propagação da Covid-19”. Desta forma, ações como estas estariam proibidas de acontecer neste momento.

Escavadeira em ação de demolição à pedido a pedido da Prefeitura do Rio

Guilherme Pimentel, membro da Ouvidoria da Defensoria Pública do Rio, não conseguiu chegar a tempo da demolição, apesar de ter entrado em contato com o secretário da Seop, Breno Carnevale. “Convidamos o Secretário Municipal de Ordem Pública para nos acompanhar nessa missão, mas ao chegar na Linha Vermelha ele foi embora. Quando entrei em contato com ele, pedi que segurasse a demolição até eu chegar ao local, algo que não ocorreu. Percebi que não houve notificação e a justificativa foi que ninguém morava no local, mas percebemos móveis e depoimentos de moradores que contradiz essa informação. Não houve diálogo e o pior é colocar pessoas na rua, sem lugar para abrigar os pertences. Isso tudo em tempo de pandemia. Vamos fazer sempre a defesa da moradia”, comentou Pimentel. 

Os moradores desalojados foram para casas de parentes. A Redes da Maré, organização que atua há mais de 20 anos no território na garantia de direitos fundamentais, vai se reunir com esses moradores na próxima sexta feira, 07/05 para orientação sobre os possíveis benefícios sociais.

A ação também teve a participação da Secretaria Municipal de Conservação, mas não foi acompanhada pela Secretaria de Assistência Social. A alegação da Prefeitura é que as casas foram construídas encima de uma galeria de águas pluviais.

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