Moradores e sociedade se posicionam contra violações e violências na Maré

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Operação na Maré, seis dias antes das eleições, causa indignação de moradores e de representantes da sociedade civil

Por Jéssica Pires, em 28/09/2022 às 12h43

A operação de segunda-feira (26) nas favelas Vila do Pinheiro, Vila do João, Morro do Timbau e Baixa do Sapateiro, com a presença de aproximadamente 200 homens do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), do Batalhão de Ações com Cães (BAC) e civis da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), deixa mais uma vez, impactos irreparáveis para moradores do Conjunto de Favelas da Maré. Além das mortes, danos patrimoniais e psicológicos que podem ser percebidos nas imagens e vídeos compartilhados nas redes sociais, a negação ao direito à segurança e ao ir e vir de milhares de pessoas ficam sem respostas após a ação.  

Vidas interrompidas 

Uma das sete pessoas que perdeu a vida na operação trabalhava em uma barraca em um dos eventos que aconteciam no início da ação. “Meu avô não era bandido, era trabalhador, tinha a barraca dele no baile, mas era trabalhador e morador, ali era o ganha pão dele…”, publicou na conta pessoal do Twitter a neta de José Henrique da Silva, também conhecido como “Zé careca”, que foi uma das primeiras mortes confirmadas no início da ação.

Política de insegurança 

“Os relatos de moradores do Complexo da Maré são lancinantes. Impossível, se você tem alguma sensibilidade, não se comover, não se horrorizar com a incursão bélica policial, caveirões na terra, caveirões aéreos” comentou Luiz Eduardo Soares, antropólogo, cientista político e escritor brasileiro, considerado como um dos mais importantes especialistas em segurança pública do Brasil.

“Só quem mora em favela sabe como a operação é uma ameaça para TODOS que moram aqui. Somos violados todas as vezes. Tratados como lixo. Temos nossas casas invadidas. E nossa paz tirada”, lamentou Raphael Vicente, influencer e produtor de conteúdo, morador da Nova Holanda.

“Operação na Maré!!! Mais um dia sem aulas e sem poder circular a cidade”, chamou a atenção Kamila Camillo, artista visual e moradora da Maré, também através do perfil no Twitter. Pelo menos 35 unidades escolares ficaram sem funcionamento na Maré nesta segunda.

Sangue escorre por becos e vielas: moradores e especialistas defendem que vulnerabilização da população favelada em dias de operação é falha grave de segurança pública e não ‘dano colateral’ | Foto: Pedro Prado

Alguns coletivos de comunicação também chamavam atenção para os impactos da operação no cotidiano dos moradores da Maré: “Estão desligando a energia e a Internet na Baixa do Sapateiro. Pra não termos mais acesso às informações. Mas a operação continua #OPERAÇÃONAMARÉ”, publicou o jornal coletivo Garotas da Maré.

“Operação na Maré a menos de uma semana das eleições. O palanque de Claudio Castro é às custas de vidas negras e pobres. E seu programa de governo é a morte”, criticou Monica Benício, cria da Maré e vereadora do Rio (PSOL). 

Também cria da Maré e candidata à deputada estadual do RJ, Renata Sousa, publicou: “Já são horas de operação na Maré! Ninguém aguenta mais sangue derramado e essas cenas de horror! Os moradores querem PAZ, e seus direitos respeitados. Governador, vou ter que mais uma vez relembrar ao sr. que não existe pena de morte no Brasil?”

“Fico constantemente me perguntando que Estado Democrático de Direito é esse em que vivemos. Enquanto um jovem nascido e criado em uma favela no Rio de Janeiro, me sinto cansado de tantas violências e violações de direitos que cotidianamente preciso passar por simplesmente morar dentro de um território favelado”, escreveu Luiz Menezes, aluno do Laboratório de Jornalismo do Maré de Notícias nascido e criado na Maré e estudante de ciências sociais e economia.

O que justifica o injustificável? 

O pavor e a sensação de insegurança que uma ação como essa gera para moradores é imensurável. Os diversos relatos de invasões de domicílios, subtração e danos a pertences em residências, torturas e violência psicológica evidenciam uma lógica de atuação das polícias em espaços de favelas que não se repete em nenhum outro espaço da cidade. 

Vale destacar que entre as determinações da ADPF das Favelas está a obrigatoriedade da presença de ambulâncias para prestação de socorro à possíveis vítimas e o início das operações ser pelo menos às 6h da manhã – ambas foram desconsideradas na ação desta segunda-feira.

Acompanhamento das violações 

Nesta quarta, a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro junto com a OAB-RJ e a Comissão de Direitos Humanos da Alerj realizou uma visita aos moradores da Maré que sofreram situações de violências e violações de direitos. A ideia foi passar nas principais regiões que foram atingidas pela operação policial desta segunda-feira. A equipe da Defensoria disponibiliza o acolhimento psicológico para moradores impactados pela operação através da Rede de Atenção a Pessoas Afetadas pela Violência de Estado (Raave). 

Moradores que desejam judicializar as violações ou os danos da operação podem comparecer ao atendimento sociojurídico do projeto Maré de Direitos, realizado pela Redes da Maré ou podem entrar em contato pelo WhatsApp (21) 99924-6462 para realizar seu agendamento.

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